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A reforma tributária precisa simplificar o processo fiscal e não aumentar impostos. É o que afirmam especialistas em economia e interlocutores de vários segmentos do setor produtivo de comércio, bens serviços e turismo que se reúnem em Natal nesta semana para a 38ª edição do Congresso Nacional de Sindicatos Empresariais (CNSE). O evento é promovido pelo do Sindicato do Comércio Varejista do RN (Sindilojas/RN) e  Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do RN (Fecomercio/RN) e acontece no Centro de Convenções da capital potiguar, reunindo quase 1.200 representantes sindicais e empresariais de todo o Brasil. Nesta quinta-feira (10), o CNSE contou com palestras e debates sobre temas como cenário econômico, reforma sindical e fontes de custeio de atividades, negociações coletivas e perspectivas para o RN e o País. Essa é a segunda vez que Natal é o palco do congresso, realizado uma vez por ano, nas principais capitais do comércio no País.

Nesta quinta-feira, uma das palestras teve o tema “Cenário Econômico: Perspectivas e Ameaças” com análise das perspectivas de reforma tributária, cenários de inflação e programas de estímulo ao comércio, com os economistas Guilherme Mercês, Marcelo Portugal e José Luiz Oreiro. 

Para o palestrante Guilherme Mercês, ex-secretário de Fazenda do Rio de Janeiro e atual diretor de Economia e Inovação da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o Brasil se recupera de duas situações que mexeram estruturalmente na economia: a pandemia de covid-19, com desemprego e queda de renda, e conflitos geopolíticos, que acabam afetando o País. 

“No Brasil temos perspectivas melhores por dois motivos principais: a redução da taxa de juros que começou e deve continuar. Tem o programa Desenrola para aliviar a dívida das famílias. Essa combinação dos dois vai abrir espaço para consumo e o varejo e o comércio devem sentir isso ao longo do tempo, principalmente em 2024. Temos discussões importantes como o arcabouço fiscal e a reforma tributária, apesar de estar no início”, aponta. “Houve um passo importante na Câmara mas tem muito caminho pela frente. Vale lembrar que só estamos discutindo uma Emenda Constitucional, é a moldura de um quadro. Depois é que vamos discutir a pintura que são as alíquotas, formas de cobrança. Essa discussão será fundamental. Duas coisas são unânimes: precisamos de uma reforma tributária que simplifique o sistema e acabe com esse manicômio tributário que vivemos há décadas, mas todos estão de acordo que ninguém mais aguenta a carga tributária”, cita.

Na avaliação do presidente do Sindilojas/RN, Gilberto Costa os empresários no Rio Grande do Norte têm encontrado dificuldades em virtude da situação fiscal e econômica do Estado. Costa relembrou o aumento de 18% para 20% de ICMS promovido pelo Governo do Estado em 2022, alertando que o RN foi na contramão de estados vizinhos. Ele cita que uma perspectiva positiva é a reforma tributária, em discussão no Congresso, com possibilidade do comércio ser impactado positivamente.

“Viajamos e percebemos que o pior cenário é o do RN. Outros estados estão em ritmo diferente. Os nossos vizinhos estão num ritmo distinto. Nós precisamos de uma linha para desenvolvimento do Estado. Estamos parados. Entre as dificuldades estão a carga tributária: é o único Estado que aumentou 2 pontos no ICMS e os vizinhos não. Isso já é um peso”, disse. Ele afirma que a reforma tributária é algo a longo prazo. “Ainda não temos uma posição exata, mas a perspectiva é melhorar. O problema do Brasil é a quantidade de impostos e a burocracia. E essa reforma não pode aumentar imposto”, defende.

O presidente da Fecomercio/RN, Marcelo Queiroz, corrobora: “a reforma tributária, que é urgente e importante, não pode aumentar impostos. Ela precisa simplificar e, no máximo, manter o que já existe, não pode ter aumento. Nos preocupa essa incerteza de não sabermos os percentuais do IVA”. 

Inflação menor deve aliviar varejo 

Enquanto potências internacionais vivem momento marcado por alta dos juros e desaceleração econômica, o Brasil tem uma das menores inflações do mundo. De acordo com  Guilherme Mercês, esse é um sinal de que as medidas adotadas pelo Banco Central tiveram um impacto positivo e devem provocar a queda de juros nos próximos meses. Para o economista, a perspectiva é positiva principalmente para famílias e empresas que se endividaram durante a crise sanitária iniciada em 2020.

“A pandemia causou uma queda acentuada de receita e de empregos. O resultado? Famílias e empresas se endividaram muito. O endividamento das famílias saiu de 60% para quase 80%. Tivemos um aperto no orçamento familiar, que explica essa baixa no consumo, principalmente no varejo. Com a queda da taxa de juros, a gente deve ver um alívio não só para as famílias, mas também para as empresas, que ficaram devendo bilhões em dívidas tributárias federais” explicou o economista.

O saldo positivo na geração de empregos também colabora para um momento de otimismo no comércio, mas o convidado José Luis Oreiro aproveitou o espaço do debate para alertar sobre a qualidade dessa mão de obra. “De fato, a taxa de desocupação vem caindo. No primeiro trimestre o mercado de trabalho brasileiro tinha 107 milhões de postos de trabalho. A questão é que, destes, só 35 milhões eram empregos formais. Ou seja, a maior parte está sem carteira de trabalho assinada, sem direitos e garantias”, comentou o especialista.

Para Marcelo Portugal, essa perspectiva positiva também depende da manutenção dos pilares macroeconômicos por parte do governo e deve ser encarado com cautela. “Temos que tomar cuidado para não reduzir a taxa de juros rápido demais e ter problemas no futuro. Essa descompressão monetária, o remédio, tem de ser usado de forma que a doença não volte. Em julho, a inflação deve ser baixa mais uma vez; mas muito pela manipulação dos preços, como a Petrobras vem fazendo com os combustíveis”, disse. 

Além disso, o economista também acredita que o impacto da agenda econômica adotada pelo governo brasileiro vai além das questões financeiras. “Os preços têm uma lógica e devem ser determinados pelo mercado, então acho que existe uma tendência razoável de perdermos esses pilares econômicos. A economia brasileira depende de renda e crédito, mas também de boas expectativas e vontade de comprar. Não adianta a pessoa ter dinheiro e crédito, mas achar que vai perder o emprego”, afirmou.

Novo arcabouço fiscal 

No caso do Regime Fiscal Sustentável, também conhecido como  arcabouço fiscal, que estabelece novas regras para a gestão do orçamento público, Marcelo Portugal considera a medida um retrocesso. “A carga tributária vai subir, e alguém aqui vai ter que pagar mais imposto. Com o teto, os gastos públicos não podiam crescer mais que a inflação; agora, a tendência é que eles aumentem cada vez mais”, explicou.

Para José Luis Oreiro, o teto de gastos é um dos responsáveis pela estagnação da economia a partir do segundo semestre de 2014. “A gente observa que, até aquele momento, o Brasil vinha crescendo uma média de 3% por ano. De lá para cá, sofremos uma perda permanente de PIB, que não vamos conseguir recuperar nunca mais”, afirmou Oreiro.