homenagem ao cardim 2011 (Clicar no item ao lado)
Slides da minha apresentação em homenagem ao Fernando Cardim durante o IV Encontro Internacional da AKB
16 quarta-feira maio 2018
16 quarta-feira maio 2018
homenagem ao cardim 2011 (Clicar no item ao lado)
20 sexta-feira mar 2015
Local: Auditório da Faculdade de Administração, Contabilidade e Economia (FACE) – Universidade de Brasília (UnB)
Campus Darcy Ribeiro – Prédio da FACE – Asa Norte
1º dia: 08/04/2015
9:00 – 9:30 ABERTURA
Cofecon – Corecon/DF – Associação Keynesiana Brasileira – UnB.
9:45 – 11:15 MESA Nº 1
A Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento.
Estruturalismo e o Novo-desenvolvimentismo
Autores: José Luis Oreiro (UFRJ) e Nelson Marconi (FGV-SP)
Coordenador: Luiz Fernando de Paula (UERJ)
11:15 – 11:45 COFFEE BREAK
11:45 – 12:45 MESA Nº 2
Revisão do Novo Consenso Macroeconômico
Autor: Luiz Fernando de Paula (UERJ)
Coordenador: Indicação UPIS
12:45 – 13:15 ALMOÇO
13:30 – 14:30 MESA Nº 3
A Macroeconomia Novo-Keynesiana e os Modelos de Equilíbrio Geral Estocástico Dinâmico
Autor: Joaquim Andrade (UnB)
Coordenador: Prof. Adriana Amado
14:45 – 15:45 MESA Nº 4
Os Modelos de Ciclos Reais de Negócios
Autor: Roberto Ellery (UnB)
Coordenador: Indicação UCB
15:45 – 16:15 COFFEE BREAK
16:15 – 17:15 MESA Nº 5
A Macroeconomia Keynesiano-Estruturalista
Autor: Gabriel Porcile (CEPAL)
Coordenador: Carlos Mussi (CEPAL)
2º dia: 09/04/2015
9:30 – 12:00 MESA DE DEBATE
Desafios da Política Econômica Brasileira
Debatedores: José Luiz Oreiro, Luiz Fernando de Paula, Joaquim Andrade, Roberto Ellery e Gabriel Porcile
Coordenadores: Carlos Eduardo de Freitas e José Luiz Pagnussat.
13:00 – 15:00 ALMOÇO PALESTRA
Local: Restaurante Coco Bambu – Lago Sul
(Setor de Clubes Esportivos Sul (SCES), Trecho 2, Conjunto 36)
Palestrante: Prof. Luiz Fernando de Paula (UERJ)
05 segunda-feira ago 2013
a) Por que você resolveu estudar economia?
Vim da Engenharia: me formei em Comunicações em 1970 (IME) e já me interessava por Economia antes disso. Depois de 3 anos de trabalho entrei para a primeira turma de Mestrado em Economia da UNICAMP para viver de bolsa. Como dizia na época, “não me interessa abrir a caixa-preta, e sim saber onde ela está ligada”.
b) Em que momento você teve contato com as ideias de Keynes? Qual foi sua reação a elas?
Durante o Mestrado. Também tive contato em simultâneo com Kalecki, a quem preferia por ser mais direto e menos confuso (ele também tinha currículo de engenharia, não sei se chegou a se graduar). Aprendi no Doutorado a entender e valorizar mais Keynes, não só sendo aluno da Conceição e do Belluzzo, mas lendo Minsky (principalmente o JMK de 1975).
c) Que pessoas você considera seus mentores no estudo de economia?
Mencionei dois na pergunta anterior. Acrescentaria Antonio B. de Castro, apesar de (ao menos na época) anti-Keynesiano e ainda mais radicalmente anti-Kaleckiano.
d) Você se considera um economista Keynesiano ou Pós Keynesiano?
Rótulos nunca me interessaram, porque acho que tendem a ser enganosos. Nesse caso, me sinto mais próximo dos pós-keynesianos, porque são mais autênticos em relação ao legado de Keynes e são claramente não-neoclássicos, o que Keynes nunca conseguiu (ou sequer tentou).
e) Como sua opção teórica se relaciona com sua visão política do mundo? Por que? Você se considera um social-democrata?
Acho que as duas coisas se relacionam no meu caso, embora tentar generalizar esse tipo de correlação seja muito perigoso. A definição social-democrata corresponde bem à minha posição política: reformista na economia e na sociedade, mas não anti-mercado ou anti-capitalista.
f) Qual a sua maior contribuição para o desenvolvimento do pensamento keynesiano ou heterodoxo?
Isso seria muito pretensioso: não é pergunta que se faça, porque não pode ser respondida. Mas chamando de tentativa, diria que é fundir de forma não-eclética, portanto minimamente consistente, três gigantes da economia não-ortodoxa do século XX: Keynes, Kalecki e Schumpeter, especificamente com foco na dinâmica da economia capitalista.
g) No seu livro “A Dinâmica da Economia Capitalista” você afirma que o “princípio da demanda efetiva” é “um princípio básico, universal, a ser respeitado por qualquer teoria a respeito do capitalismo, mas que em si mesmo não constitui uma teoria” (p.50). Essa afirmação contrasta com as formulações convencionais do PDE nas quais o mesmo é visto como a teoria segundo a qual o nível de renda e de emprego se constitui na variável de ajuste entre poupança e investimento. Na abordagem tradicional, a validade do princípio da demanda efetiva seria condicional a existência de capacidade ociosa e/ou desemprego involuntário da força de trabalho. Aparentemente a sua formulação do PDE prescindiria dessas hipóteses por se basear tão somente no caráter bilateral de toda transação mercantil. Mas, nesse caso, a sua formulação não seria uma mera tautologia contábil? Quais as vantagens da sua formulação sobre a formulação tradicional do PDE?
Uma resposta adequada seria extensa demais, portanto vão só alguns tópicos telegráficos, pela ordem da pergunta: (i) não há ajuste nenhum entre poupança e investimento (nem em Keynes! não é minha invenção), e sim uma relação de determinação unilateral do segundo para a primeira, porque a poupança é um resíduo da renda em relação ao consumo – ninguém decide poupar! (ii) a validade do PDE não depende de capacidade ociosa (a qual, aliás, quase sempre existe em algum grau, mas isso não vem ao caso), podendo valer perfeitamente em termos nominais, mesmo se gerando inflação; (iii) “minha hipótese” (é uma interpretação de Keynes e Kalecki, ao mesmo tempo) não se baseia no caráter bilateral de qualquer transação, que é uma trivialidade – e se fosse só isso seria mesmo uma tautologia!-, e sim no caráter unilateral da determinação causal que, pelo PDE, se estabelece entre o gasto monetário (única decisão autônoma de um agente na troca) e a receita (que não é uma decisão autônoma – ninguém decide receber, apenas gastar, porque só o detentor de moeda pode escolher livremente como dispor do poder de compra, e por isso só ele é autônomo numa transação em uma economia mercantil-monetária!); (iv) a “vantagem” da minha formulação, se me permite a aparente pretensão, é que ela é mais geral e tem o conteúdo essencial mais nítido por ser menos exposta a particularidades e idiossincrasias. É como se apresentasse as estritas condições necessárias e suficientes para a validade do PDE, sem grandes rodeios e particularidades. Note-se que só requer uma economia mercantil-monetária, sequer especificamente capitalista.
h) Outro ponto que você aborda no seu livro é que a maneira pela qual Kalecki trata as expectativas na sua função investimento, ao invés de ser antagônica a análise de Keynes, é compatível com o conceito de comportamento convencional apresentado no capítulo 12 da Teoria Geral, segundo o qual “o presente é um bom guia para o futuro”. Contudo, nesse capítulo Keynes aparentemente restringe a validade do comportamento convencional aos mercados financeiros, enquanto você estende o mesmo para as decisões de investimento em capital fixo tomadas por empresas do setor produtivo da economia. Qual a base teórica para essa extensão? Por que é tão importante para a dinâmica das economias capitalistas que o estado de expectativas de longo-período seja, ao menos em parte, endogeneizado? Essa não é uma fonte importante de divergência com respeito aos pós-keynesianos como Paul Davidson e Jan Kregel?
No seu livro mais importante, Teoria da Dinâmica Econômica (1954), Kalecki teve o objetivo de analisar a trajetória dinâmica de uma economia capitalista sob a premissa de estrutura estável, com a qual busca explicar os ciclos endogenamente e a tendência de crescimento a longo prazo de forma analiticamente exógena, associada justamente à mudança estrutural. Quase não diz nada sobre expectativas relativas ao investimento, mas o importante é que implicitamente estas são adaptativas, e portanto compatíveis com a ideia keynesiana de comportamento convencional e, mais especificamente, sua “teoria prática do futuro”. Essa compatibilidade a meu ver é objetiva, não dependendo em nada da intenção explícita dos autores envolvidos. Essa endogeneização é importante para explicar teoricamente a ocorrência de flutuações à luz do PDE apenas, sem recorrer (como em Schumpeter) às mudanças estruturais, por essenciais que estas sejam para explicar o crescimento a longo prazo e eventuais “ondas longas” na economia capitalista. Não vejo nenhuma divergência relevante, real ou potencial, com autores pós-keynesianos de referência, só pelo fato de não gostarem de Kalecki, ou não o interpretarem dessa forma, ou simplesmente não terem tratado desse assunto.
i) Um problema fundamental dos modelos neo-keynesianos de crescimento e ciclo com base na interação entre multiplicador e acelerador é que os mesmos são incapazes de apresentar uma explicação teórica unificada para os ciclos e a tendência de longo-prazo. Dessa forma, se os parâmetros desses modelos forem calibrados para produzir flutuações cíclicas – como em Kalecki (1954) – então a tendência tem que ser “exogenamente” determinada, ou seja, tem que ser explicada por outras variáveis que não a dinâmica da demanda efetiva. Kalecki tentou explicar a tendência com os “fatores de desenvolvimento” (ao meu ver, sem sucesso) mas você preferiu utilizar as ideias de Schumpeter para explicar a tendência de longo-prazo. Conte um pouco como a síntese Kalecki-Schumpeter pode ser usada para tratar do problema da integração entre ciclo e tendência.
Kalecki de fato pode ser agregado a essa tradição de teorias do ciclo (ou crescimento, dependendo dos parâmetros) baseadas na interação do multiplicador com uma função investimento do tipo acelerador ou mais sofisticada (como em Kalecki). Discordo de que a tentativa de integração entre ciclo e tendência proposta por Kalecki no livro de 1954 seja um fracasso, muito pelo contrário. A ideia de que seria preciso uma “explicação teórica unificada”. como discuti em meu livro citado, é uma quimera sem qualquer significado teórico ou epistemológico, apesar de compartilhada por numerosos economistas desde os anos 1940. Como sugeri acima (e aprofundei no meu livro citado), os processos dinâmicos que geram flutuações e tendência são teoricamente completamente distintos, respectivamente a dinâmica de uma estrutura estável (centrada no PDE, por interação multiplicador do com uma função investimento de tipo acelerador) e a dinâmica da mudança estrutural (os tais “fatores de desenvolvimento”, na verdade explicados com mais profundidade por Schumpeter). Assim, a tal “integração teórica” é simplesmente desnecessária, porque essas duas dinâmicas são distintas. Certamente não são somáveis, como supôs Kalecki para simplificar seu modelo (assumindo implicitamente uma equação a diferenças linear com termo constante), mas é claro que são – como devem ser – integráveis analítica e modelisticamente, senão por solução analítica, que se torna horrivelmente complicada, mas por simulação computacional, como eu prefiro. Por tabela, Kalecki e Schumpeter poder se tornar essencialmente complementares, e não antagônicos, talvez para desgosto de ambos. Mas devemos lembrar que os trabalhos científicos, por maiores e mais respeitáveis que sejam seus autores, são fatalmente matéria-prima reciclável e remoldável pela indústria de transformação do trabalho científico posterior.
j) Para aqueles que conhecem os seus escritos do final dos anos 1980 – os quais derivaram, em larga medida, de sua Tese de Doutorado, a sua linha de pesquisa mais recente com modelos evolucionários de simulação parece ser o coroamento do processo de síntese das ideias de Keynes, Kalecki e Schumpeter que você fez na sua Tese de Doutorado. Essa interpretação é correta? Como você avalia a importância dos seus modelos de simulação para o desenvolvimento do pensamento heterodoxo como uma alternativa viável ao mainstream acadêmico?
Correto. A economia capitalista pode e deve ser caracterizada como um sistema complexo evolutivo; logo a ciência econômica precisa adotar como método, por congruência com seu objeto, uma análise de sistemas complexos com enfoque evolucionário, o que implica o abandono de premissas de equilíbrio e o foco sobre trajetórias sem tendências a priori, derivadas de interações complexas sob incerteza, que geram processos não-ergódicos e não-estacionários, como quer corretamente Davidson e os pós-keynesianos. O método de simulação é o caminho principal, embora não exclusivo, nessa direção, dado que a busca de soluções analíticas nesse contexto se torna na maioria dos casos importantes inviável. Mas, do ponto de vista das relações de determinação causal e das grandes opções teóricas e analíticas, as referências e autores certamente não precisam se limitar a esse tipo de modelagem. Além de Marx, com a matriz teórica mais geral, seguido de Keynes, com sua teoria geral das aplicações de capital e das decisões capitalistas, Schumpeter e Kalecki contribuem complementarmente para essa análise, mediante uma integração n]ao eclética, malgrado as seitas e igrejinhas. Sua contribuições são grandes demais para nos darmos ao luxo de largá-los pelo caminho, só porque sua compatibilidade recíproca não é óbvia e nem mesmo fácil. O sectarismo é a maldição dos que lutam contra a corrente, em qualquer atividade humana que envolva o intelecto, e que inexoravelmente também não escapa de envolver a paixão e os interesses.
k) Como você avalia a Associação Keynesiana Brasileira?
Uma iniciativa altamente meritória, muito importante para nuclear um esforço heterodoxo na Economia e na política econômica. É uma honra fazer parte do conselho de patronos. Meus melhores votos de sucesso crescente, nessa fase de crise e descrença generalizada na capacidade de fazer e usar Economia de forma comprometida com o realismo e a objetividade, sem ceder à mistificação e à doutrinação que continuam a ser feitas em nome da pseudociência simplória do mainstream.
11 terça-feira set 2012
Caros leitores,
Na assembleia geral da associação keynesiana brasileira, realizada durante o ultimo encontro da associação na FGV-SP fui eleito, por unanimidade, para a vice-presidência da AKB em substituição ao meu colega Marco Flavio Resende, que sai para fazer seu pós-doutorado em Cambridge/Reino Unido.
O novo site da Associação Keynesiana Brasileira está pronto e pode ser acessado no link: www.akb.org.br. Estão disponíveis as fotos do ultimo encontro da AKB bem como os artigos científicos e na grande mídia de associados da AKB.
Por fim, o livro da AKB “Política Econômica e Sistema Financeira numa Era de Instabilidade” foi publicado em agosto último pela editora Campus e encontra-se disponível para a venda nas principais livrarias do país.
Abs,
José Luis Oreiro
02 domingo set 2012
Posted Opinião
inA Associação Keynesiana Brasileira orgulhosamente apresenta seu mais novo lançamento bibliográfico, o livro “Sistema Financeiro e Política Econômica em uma Era de Instabilidade”, publicado em agosto de 2012 pela editora Campus.
O livro é composto por 23 ensaios escritos por eminentes economistas keynesianos brasileiros e estrangeiros. Entre os autores estrangeiros encontram-se Thomas Palley, Roberto Frenkel, Phillip Arestis e Jan Kregel.
O livro foi organizado por André Modenesi (UFRJ), Daniela Prattes (UNICAMP), José Luis Oreiro (UnB), Luiz Fernando de Paula (UERJ) e Marco Flavio Resende (UFMG). O prefácio é de autoria de Luiz Gonzaga Beluzzo.
25 sábado ago 2012
O cenário global deverá continuar hostil à economia brasileira nos próximos trimestres, por causa das perspectivas pouco animadoras para Europa, China e EUA, adverte o americano Jan Kregel, do Levy Economics Institute (uma organização de pesquisa em políticas públicas) e ex-consultor-sênior da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad). Segundo ele, a zona do euro seguirá mal das pernas por um longo período, prejudicando a China, que tem hoje na Europa o seu principal mercado exportador. Uma economia chinesa com menor fôlego afeta o Brasil – um grande vendedor de commodities para a China – economias asiáticas como o Japão e a própria Europa, pois a Alemanha tem nos chineses um grande cliente, nota Kregel.
“É uma cadeia cumulativa de eventos. A crise europeia se espalha pelo mundo e depois volta para a Europa”, afirma ele, observando que, para completar o quadro, há um risco considerável de os EUA não conseguirem evitar no ano que vem o chamado abismo fiscal – a combinação de elevados cortes de gastos e fim da redução de impostos, que pode ter um impacto de 3% a 4% do PIB em 2013.
Esse cenário um tanto sombrio é obviamente desfavorável para os preços de commodities, que têm grande peso na pauta de exportações do Brasil, diz Kregel, um dos principais convidados do 5º Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), que começou na quarta-feira e se encerra hoje, na Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo. Os termos de troca (relação entre preços de exportação e de importação), que tanto melhoraram nos últimos anos, têm uma perspectiva bem menos positiva.
Kregel não vê como provável uma ruptura na zona do euro, mas tampouco acredita que os líderes europeus encontrarão mecanismos para retomar um crescimento mais acelerado. Para isso, acredita ele, seria fundamental repensar a estratégia baseada na austeridade, que não tem dado certo. A ênfase excessiva em medidas de austeridade fiscal tem derrubado a atividade econômica, afetando as receitas e, com isso, não contribuindo para uma melhora das contas públicas – pelo contrário.
O mais provável, para Kregel, é que os líderes europeus continuem a empurrar a situação com a barriga, levando a zona do euro a um longo período de baixo crescimento. Seria importante, por exemplo, que o Banco Europeu de Investimento (BEI) investisse nos países em apuros, como a Grécia. Se a Europa não sair do buraco, a China pode seguir em desaceleração, adverte. A prévia de agosto do Índice Gerente de Compras (PMI, na sigla em inglês) da Markit Economics mostrou um cenário ruim para a indústria, ao ficar em 47,8 pontos, inferior aos 49,3 pontos de julho – abaixo de 50, o indicador aponta contração da atividade.
Kregel tampouco é otimista em relação à economia americana. Para ele, há uma possibilidade significativa de que os democratas e republicanos não cheguem a um acordo para evitar a concretização do abismo fiscal. Se a redução acentuada de gastos e o aumento abrupto de impostos se materializar, a economia americana pode encolher em 2013, diz Kregel. Segundo ele, a incerteza quanto ao que vai ocorrer no ano que vem tem afetado a confiança dos empresários, que seguram planos de investimento.
Com um quadro externo tão adverso, os países podem tentar desvalorizar suas moedas, para impulsionar a economia por meio de exportações, e adotar medidas protecionistas. Nesse ambiente, diz Kregel, o Brasil corre o risco de ver um aumento do fluxo de capitais, uma vez que os juros brasileiros continuam bem acima dos vigentes nos países desenvolvidos, mesmo com a forte queda da Selic ocorrida desde agosto de 2011.
Se a recuperação econômica esboçada em junho e julho de fato ganhar corpo, apesar do cenário externo difícil, será mais um motivo para o Brasil atrair capitais estrangeiros, num momento em que o real não está mais tão valorizado como há alguns meses, diz Kregel, também da Universidade do Missouri (EUA). Ele acredita que o Brasil deve reforçar antecipadamente os controles de capitais já existentes, para impedir uma nova onda de valorização do real.
A boa notícia em relação ao Brasil, segundo ele, é que o país tem espaço fiscal e monetário caso seja preciso estimular mais a economia. É possível e reduzir o superávit primário (a economia para pagar os juros da dívida) e cortar mais os juros se a situação ficar complicada, sem que isso provoque efeitos colaterais perigosos. Num mundo complicado como o atual, são motivos que permitem um pouco mais de otimismo em relação às perspectivas do país.
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23 quinta-feira ago 2012
Entrevista de Luiz Carlos Bresser-Pereira a José Luís Oreiro para a Associação Keynesiana Brasileira, na véspera da homenagem que esta associação lhe fez em seu IV Encontro Internacional, São Paulo, 21 de agosto de 2012.
Em 1955 eu estava começando o terceiro ano de Direito na USP, e, de repente, caiu-me nas mãos os textos dos intelectuais nacionalistas do ISEB sobre a industrialização Brasileira e o pacto desenvolvimentista que Getúlio Vargas estava liderando. Decidi então que não buscaria mais ser juiz de direito; eu seria um economista ou um sociólogo do desenvolvimento. A decisão pela economia aconteceu quando, em 1962, logrei que Antonio Delfim Netto me aceitasse no programa de doutorado da Faculdade de Economia e Administração da USP.
Eu primeiro me tornei um economista estruturalista e, em seguida, também um keynesiano. Comecei a estudar a história do pensamento econômico em 1959, quando fiz o concurso para a FGV. E continuei a estuda-lo nos Estados Unidos em 1960, quando fiz meu MBA. Ao mesmo tempo que lia meus mestres, Arthur Lewis, Myrdall, eu lia Marx, Keynes, Kalecki e Schumpeter. Primeiro, dei aulas de desenvolvimento econômico, a partir de 1968, e, a partir de 1970, macroeconomia, quando criei o Departamento de Economia na Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.
Meus mestres de economia brasileira foram Ignácio Rangel e Celso Furtado; meus mestres de teoria econômica geral, Marx e Keynes.
Eu sou um economista keynesiano-estruturalista. A teoria econômica está dividida em escolas, mas felizmente existe uma Teoria Econômica Básica onde estão os princípios da teoria do desenvolvimento capitalista e da teoria microeconômica clássicas e da macroeconomia keynesiana que estão de alguma forma presentes em um bom texto introdutório de Economia. Stiglitz e Krugman são antes neoclássicos; mas, como aprenderam essa Teoria Econômica Básica e são profundamente inteligentes e criativos, esquecem seus modelos hipotético-dedutivos quando analisam a realidade econômica, e podem ser considerados neokeynesianos. Um verdadeiro keynesiano deve pensar historicamente. Deve construir modelos históricos, não construir castelos matemáticos sem correspondência na realidade. Nos últimos 20 anos eu logrei elaborar uma crítica da teoria econômica neoclássica que me parece original e decisiva. Ao invés de simplesmente afirmar que os modelos neoclássicos não são realistas, eu expliquei por que eles não são nem podem ser realistas. Essas ideias estão no paper, “Os dois métodos e o núcleo duro da teoria econômica” que eu demorei 15 anos para escrever. Eu parto de uma classificação de ciências em metodológicas e substantivas, estas, por sua vez, dividindo-se em ciências naturais e ciências sociais ou históricas. As primeiras usam o método hipotético-dedutivo, porque não tem objeto empírico de estudo; elas ajudam a pensar. Já as ciências substantivas devem usar o método empírico-dedutivo ou histórico-dedutivo se forem ciências sociais como é a economia. A teoria econômica neoclássica ignorou essa distinção e, com os axiomas do homo economicus, das expectativas racionais e dos rendimentos decrescentes, tornou-se uma “ciência” hipotético-dedutiva, cujo critério de verdade não é a aderência à realidade mas uma certa coerência lógica. Ora, uma ciência substantiva que não adere à realidade é uma falsa ciência; é mero exercício lógico-matemática destituído de validade. De acordo com esta minha visão, a microeconomia marshalliana livrada da teoria subjetiva do valor juntamente com a teoria dos jogos não constituem o microfundamento da Economia mas são a base de uma ciência metodológica como é também a Econometria: a Teoria da Tomada de Decisão Econômica. Temos, assim, três ciências complementares, uma substantiva, que analisa os sistemas econômicos – a Economia ou Economia Política –, que usa o método histórico, e duas metodológicas que usam o método hipotético-dedutivo: a Teoria da Tomada de Decisão Econômica e a Econometria.
Eu sempre me considerei um desenvolvimentista de centro-esquerda. Quero uma sociedade mais desenvolvida e mais justa que caminhe na direção do socialismo no longo prazo Sempre fui, portanto, um socialdemocrata. Mais do que compatíveis, a teoria estruturalista do desenvolvimento e a macroeconomia keynesiana são teorias históricas instrumentais para que alcancemos esses objetivos – para que administremos o capitalismo mais competentemente e com mais justiça que os liberais. Atualmente estou ajudando a construir uma macroeconomia estruturalista do desenvolvimento que une a visão keynesiana e estruturalista.
Enumero três: (1) o modelo histórico de desenvolvimento, distribuição e progresso técnico com a inversão do modelo clássico de distribuição, eu está em Lucro, Acumulação e Crise (1986); (2) a teoria da inflação inercial, com Yoshiaki Nakano, que está em Inflação e Recessão (1984); e (3) a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, que está em Globalização e Competição (2010).
Minha preocupação com o a eficiência do aparelho do Estado decorreu de haver sido nomeado Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado (1995-98). Quando, em 1999, voltei para a vida acadêmica, voltei a dedicar-me ao desenvolvimento econômico e à macroeconomia, e as juntei não na “macroeconomia da estagnação brasileira” (esse é apenas o título de um livro meu de 2007 sobre a economia brasileira), mas na macroeconomia estruturalista do desenvolvimento.
Depois que, com o uso da teoria da inflação inercial o Brasil logrou estabilizar sua alta inflação inercial eu pensei que se desenvolveria de forma extraordinária. Por isso, fiquei decepcionado com a política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso. Nos quatro anos e meio que permaneci em seu governo manifestei sempre ao presidente meu desacordo com a política ortodoxa que estava sendo praticada baseada em altas taxas de juros e taxa de câmbio sobreapreciada. Comecei a fazer minha crítica ainda em 1999, no trabalho, “Incompetência e confidence building por trás de 20 anos de quase-estagnação da América Latina”. Quando, em 2001, meu velho companheiro de estudos e trabalhos, Yoshiaki Nakano, também se desligou do governo, convidei-o para escrever, sucessivamente, dois papers, “Uma estratégia de desenvolvimento com estabilidade” e “Crescimento econômico com poupança externa”. Em seguida eu continuei a trabalhar na crítica da poupança externa e da tese da restrição externa ao mesmo tempo que orientava duas teses de doutorado sobre a taxa de câmbio (de Paulo Gala e de Lauro Gonzales). Em seguida, escrevi um outro modelo fundamental, o da doença holandesa, no qual apareceu o conceito de equilíbrio industrial. Esses desenvolvimentos teóricos foram essenciais para que eu publicasse em 2007 “Macroeconomia da Estagnação”. Terminado o livro, desenvolvi o terceiro modelo da macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, o modelo da tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da taxa de câmbio que, em seguida, me permitiu escrever o livro teórico para mim fundamental, “Globalização e Competição”.
Depois de termos escrito os dois papers acima referidos eu fiquei convencido que começávamos a definir uma nova abordagem para o desenvolvimento econômico e a macroeconomia. Disse isso ao Nakano e perguntei que nome poderíamos dar para as novas ideias. Ele sugeriu “novo desenvolvimentismo”. Eu imediatamente aceitei e na quinta edição de meu livro Desenvolvimento e Crise no Brasil (2003)discuti o novo desenvolvimentismo no último capítulo. Só, porém, em 2006 eu teria um artigo que me satisfez sobre o tema: “O novo desenvolvimentismo e a ortodoxia convencional”.
Sempre defini o novo desenvolvimentismo como uma estratégia nacional de desenvolvimento, como a instituição fundamental para o desenvolvimento econômico; a teoria que justifica esse conjunto de políticas econômicas é a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento. Esta macroeconomia não é uma criação apenas minha. Outros economistas têm dela participado. Agora estou escrevendo um livro que deverá se chamar Structuralist Development Macroeconomics and New Developmentalism com você, José Luiz Oreiro, e com Nelson Marconi. São ideias novas. Um conjunto de modelos novos que renovam o estruturalismo e o keynesianismo. Por isso entendo que estamos criando no Brasil uma nova escola de pensamento. Uma escola que já tem participação internacional, como pudemos ver com a aprovação das 10 Theses on New Developmentalism que foi subscrita originalmente, em 2010, por 80 economistas de todo o mundo.
Na macroeconomia estruturalista do desenvolvimento temos três modelos principais: a crítica à política de crescimento com poupança externa e à tese de que os países em desenvolvimento enfrentam uma restrição externa; o modelo da doença holandesa com duas taxas de câmbio de equilíbrio e o conceito de taxa de câmbio de equilíbrio industrial – aquela taxa que torna competitivas as empresas utilizando tecnologia no estado da arte mundial; e o modelo da tendência à sobreapreciação cíclica e crônica da taxa de câmbio. Esses modelos colocam a taxa de câmbio pela primeira vez no centro da teoria do desenvolvimento. Essa é uma teoria keynesiano-estruturalista que analisa países em desenvolvimento de renda média no quadro histórico da globalização. É uma teoria que ao enfrentar problemas novos, em certos casos crítica o pensamento keynesiano e o pensamento estruturalista antigos. Por exemplo, para a macroeconomia estruturalista do desenvolvimento a crônica falta de dólares ou a “restrição externa” deriva muito mais de uma taxa de câmbio cronicamente sobreapreciada e, em consequência, de déficits em conta corrente injustificáveis, do que das elasticidade renda das importações e das exportações.
Sinto-me honrado em ser um de seus patronos. Seus dirigentes são todos amigos próximos meus. Entendo que ela já está dando uma contribuição importante para o desenvolvimento do pensamento econômico brasilleiro
10 sexta-feira ago 2012
Caros leitores,
A programação completa do V Encontro da AKB pode ser visualizada em http://associacaokeynesiana.wordpress.com/2012/08/09/programacao-do-v-encontro-da-associacao-keynesiana-brasileira/
Aproveitem também para conferir a nova página da AKB em http://www.akb.org.br/
A AKB também está no Fecebook: https://www.facebook.com/#!/groups/246159342121251/
Abraços a todos
Oreiro
28 sábado jan 2012
Posted Opinião
inTags
Associação Keynesiana Brasileira, Economia Pós-Keynesiana, frank hahn, john maynard keynes, Oreiro
Entrevista concedida a Revista Multiface (a ser publicada no Vol. 5. N.2)
A Revista Multiface é uma publicação científica para alunos de graduação
produzida pelos alunos do Programa de Ensino Tutorial (PET) da Faculdade
de Ciências Econômicas da UFMG.
Multiface: O economista Robert Lucas, um dos precursores da escola das expectativas racionais, afirmou que não é mais necessário ler a Teoria Geral do Emprego, do Juros e da Moeda, de John Maynard Keynes. Como o senhor avalia a importância da obra de Keynes para o entendimento das condições econômicas atuais?
Oreiro: Não concordo com o Lucas. A Teoria Geral de Keynes é uma obra fundamental para aqueles que desejam entender o funcionamento de uma economia capitalista moderna. Os modelos usados por Lucas e pelos novos-clássicos são relativamente sofisticados do ponto de vista matemático, mas representam economias extremamente primitivas. Os modelos de equilíbrio geral dinâmico usados pelos novos-clássicos representam economias onde (i) nenhuma transação pode ocorrer a “falsos preços”, ou seja, preços para os quais a oferta e a demanda de cada mercadoria não são iguais, (ii) a decisão de contratação de insumos e a venda da produção acabada no mercado são simultâneas de maneira que as empresas não necessitam financiar a atividade de produção e (iii) os mercados são completos no sentido Arrow-Debreu. Nesse tipo de economia não existe nenhum espaço para a moeda e o sistema financeiro. Os novos-clássicos só conseguem incluir moeda nos seus modelos por intermédio de “short-cuts” como as hipóteses de “cash-in-advance” ou a inclusão, a força, da moeda na função utilidade dos agentes. Sem essas hipóteses, indivíduos racionais não demandariam moeda, nem como meio de pagamento, no mundo suposto pelos novos-clássicos. Isso porque nesse tipo de economia, parafraseando Frank Hahn, “existe um preço cotado hoje, para um guarda-chuva a ser entregue em Cambridge, no Natal de 2112, se chover”. Em outras palavras, os mercados são completos de maneira que todas as transações podem ser efetuadas e liquidadas em t=0. Como não existem transações a serem realizadas depois de t=0, apenas entrega de mercadorias, também não há espaço para a moeda como meio de pagamento, e menos ainda como reserva de valor. Também não há espaço para o sistema financeiro, particularmente para bancos. Daqui se segue que a economia suposta por Lucas e pelos Novos-Clássicos é, no fundo, uma barter economy. Se isso é verdade então com que autoridade Lucas afirma que a leitura da Teoria Geral é desnecessária? Acaso ele quer afirmar que a análise de uma economia não-monetária, onde o sistema financeiro é inexistente, é mais relevante para o entendimento sobre o funcionamento de uma economia capitalista moderna do que a Teoria Geral de Keynes, a qual foi escrita para dar conta da análise de uma Economia Monetária de Produção? O problema é que esse pessoal do mainstream americano confunde formalismo com relevância.
Multiface: Atualmente existe uma grupo de economistas considerados novos keynesianos. Qual a principal diferença entre esse grupo de economistas e aqueles que adotam o paradigma pós keynesiano? O senhor os consideraria como economistas realmente keynesianos?
Oreiro: Os Novos-Keynesianos podem ser classificados em primeira e segunda geração. Nos trabalhos da primeira geração de novos-keynesianos (Stiglitz, Romer e Mankiw) o objetivo eram simplesmente mostrar a compatibilidade entre o suposto tradicional neoclássico de comportamento racional e os resultados da “velha” macroeconomia Keynesiana. Mais especificamente tratava-se de responder o porque agentes econômicos racionais mantinham preços e salários nominais rígidos face a uma queda da demanda agregada, quando essa rigidez era a responsável pela queda da produção e do emprego, a qual afetava de maneira adversa aos agentes econômicos em seu conjunto. A resposta dessa primeira geração de novos-keynesianos foi mostrar que num contexto no qual existem custo de ajustamento de preços e onde as imperfeições no processo de seleção e monitoramento dos trabalhadores pode dar origem a rigidez de salário real, pode ser do interesse privado das empresas manter os preços dos seus produtos inalterados face a uma queda da demanda agregada.
Os novos-keynesianos de segunda geração (Woodford e Galí) foram muito além disso. Eles resolveram replicar a mesma metodologia de construção de modelos dos novos-clássicos e adotaram o assim chamado “modelo de equilíbrio geral estocástico dinâmico”, ou seja, a versão inter-temporal do modelo de equilíbrio geral Arrow-Debreu para uma economia sujeita a “incerteza”, ou seja, na qual o resultado das decisões dos agentes econômicos é condicional ao “estado da natureza”. Foi a rendição final dos novos-keynesianos a hipótese de expectativas racionais. A diferença dos modelos DSGE dos novos-keynesianos com respeito ao dos novos-clássicos é que nos primeiros se impõe, de forma puramente ad-hoc, a existência de rigidez de preços. A justificativa para esse procedimento é que os modelos DSGE são a forma “correta” para se analisar os efeitos dinâmicos das políticas econômicas. Dessa forma, deve-se sacrificar a relevância no altar do formalismo.
Eu tenho alguma simpatia pelos novos-keynesianos de primeira geração, mas acho um completo non-sense o trabalho feito pelos novos-keynesianos de segunda geração. Particularmente acho que o velho e antiquado modelo IS-LM-BP (ou sua versão remasterizada, o modelo IS-RM-BP) muito mais relevante para o entendimento a respeito do funcionamento de uma economia capitalista moderna do que o modelo DSGE.
Quanto a considerar os novos-keynesianos como “realmente keynesianos” está claro que não considero. Não se trata de ter uma visão “fundamentalista” da obra de Keynes. Longe disso. Mas qualquer pessoa que tenha minimamente lido a Teoria Geral sabe que a economia ali apresentada não guarda nenhuma relação com a economia representada pelos modelos DSGE. Trata-se de uma apropriação indébita do nome de Keynes.
Multiface: A zona do euro está passando por um período de crise em que alguns países têm enfrentado grande dificuldade para pagar as dívidas contraídas anteriormente. Em reposta a essa situação várias medidas de austeridade foram adotadas com apoio do Fundo Monetário Internacional e do Banco Central Europeu. Como o senhor avalia essas medidas?
Oreiro: Acho que essas medidas não vão funcionar. A crise atual da área do Euro não está relacionada com governos gastadores que se endividaram em excesso, mas com o fato de que os países que compõe a área do Euro perderam a capacidade de imprimir sua própria moeda, de tal forma que os mercados de títulos soberanos estão sujeitos ao que eu denomino de “corrida para liquidez”, algo que é muito próximo em essência a uma corrida bancária. Considere que os detentores de títulos de um país como a Itália, por exemplo, passem a desconfiar, a partir de um determinado momento, da capacidade desse país em honrar as suas obrigações financeiras. Nesse caso, cada investidor tomando individualmente pode até não acreditar num default soberano, mas pode ficar incerto a respeito do comportamento dos demais investidores. Nesse contexto, se houver uma corrida para a liquidez, ou seja, se todos os demais n-1 investidores (ou uma fração significativa dos mesmos) resolverem liquidar suas posições em títulos da Itália, o preço de mercado desses títulos irá despencar, gerando uma grande perda de capital para o investidor que mantiver sua posição em títulos do governo desse país. Daqui se segue que cada investidor individual terá um forte incentivo a se desfazer de suas posições antes que todos os demais o façam. Como todos tem o mesmo incentivo o resultado é uma corrida para a liquidez, onde o preço dos títulos soberanos despenca e, consequentemente, a taxa de juros aumenta muito. A depender da extensão da elevação da taxa de juros, a dívida pública pode se tornar insustentável, o que realiza as profecias pessimistas dos investidores. A única forma de se evitar esse “equilíbrio ruim” é por intermédio do compromisso (que pode ser implícito) da autoridade monetária com a monetização da dívida pública em casos de “corrida para a liquidez”. Se o compromisso for crível então a corrida para a liquidez não irá ocorrer e a autoridade monetária não será obrigada a comprar os títulos soberanos.
Austeridade não é substituto para a função de emprestador de última instância. Isso porque a austeridade num momento de recessão atua apenas no sentido de aprofundar a queda do nível de renda e de emprego, reduzindo assim a arrecadação de impostos e, portanto, a capacidade dos governos de fazer frente aos seus compromissos financeiros.
Multiface: A interpretação pós keynesiana trata como possível que uma economia mantenha sistematicamente uma taxa de juros maior do aquela considerada neutra – isto é, aquela que proporciona plena utilização da capacidade produtiva da economia. Podemos considerar que a economia brasileira tem uma taxa de juros muito acima da taxa neutra? Por quais razões isso ocorre?
Oreiro: O Brasil possui uma taxa de juros sistematicamente elevada para os padrões internacionais, mesmo quando comparamos com outros países em desenvolvimento. Os economistas brasileiros, das mais diversas tendências, tem apresentado diversas explicações para o fenômeno, mas não existe um consenso na literatura brasileira sobre qual seja a causa dos juros elevados no Brasil. Eu acredito que uma explicação possível para esse fenômeno seja o fato de que o passado de alta inflação experimentado no Brasil, ao expandir enormemente o sistema financeiro e a demanda por substitutos próximos da moeda correte, criou uma “cultura rentista” em nosso país, na qual os indivíduos, das mais diversas classes sociais, ficaram viciados em juros elevados sobre aplicações com liquidez diária e risco praticamente zero. Essa cultura rentista pode ter gerado uma taxa de juros convencional muito alta, o que cria um piso abaixo do qual o Banco Central não consegue colocar a taxa de juros sob risco de perder totalmente a credibilidade por parte do público. Nesse contexto, a redução da taxa de juros torna-se um processo extremamente lento, realizado ao longo de vários ciclos de taxa de juros, onde a cada ciclo a taxa de juros média é ligeiramente mais baixa do que no ciclo anterior. Dessa forma, o público lentamente revê suas convenções sobre o valor “normal” da taxa de juros, permitindo assim ao Banco Central prosseguir no processo de redução de juros sem por em risco a credibilidade da política monetária.
Multiface: A formação da taxa de juros e as causas da inflação são explicadas de maneira diferente pelo teoria pós keynesiana. Como seria a gestão da política monetária sob uma perspectiva pós keynesiana e no que ela difere da gestão ortodoxa? Quais seriam os objetivos e os mecanismos de ajuste adotados pela autoridade monetária?
Oreiro: Deve-se observar que não existe um consenso entre os economistas pós-keynesianos sobre qual a forma ideal de condução da política monetária. Podemos identificar pelo menos duas posições sobre o tema. A primeira posição atribui um papel fundamental para a política salarial no processo de controle da inflação (vejam o livro de Hansjorg Herr e Milka Kasandziska, Macroeconomic Policy Regimes in Western Industrial Countries, publicado em 2011 pela Routledge). A ideia aqui é que, no longo-prazo, existe uma forte correlação entre a inflação salarial e a evolução do deflator implícito do PIB, de tal maneira que o controle do primeiro implica no controle do segundo. Nesse contexto, a política salarial deve seguir uma regra segundo a qual a taxa de variação dos salários nominais deve ser igual ao crescimento da produtividade do trabalho acrescido da meta de inflação. Os salários não podem ser corrigidos pela inflação passada em nenhuma circunstância, mas apenas pela meta de inflação perseguida pela autoridade monetária. Essa regra de reajuste dos salários nominais facilita a convergência da taxa de inflação com respeito a meta, fazendo com que o Banco Central possa manter a estabilidade da taxa de inflação com uma dosagem menor de taxa de juros. Nesta abordagem, a taxa de juros é um instrumento meramente auxiliar, embora fundamental, no controle da taxa de inflação. Sua função é impedir que a inflação apresente grandes desvios, ainda que temporários, com respeito a meta de médio e longo-prazo, em decorrência de pressões de demanda que induzam ao aumento das margens de lucro por parte das empresas. Isso por sua vez atua no sentido de conferir aos sindicatos a segurança de que reajustes de salário nominal com base na meta de inflação, ao invés de baseados na inflação passada, não irão proporcionar perdas salariais para seus filiados. Em resumo, nessa abordagem, o controle da taxa de inflação é conseguido por intermédio da coordenação entre as políticas monetária e salarial.
A segunda posição, a qual poderíamos chamar de “Keynesianismo vulgar”, acredita que o grande problema das economias capitalistas é a tendência a um estado de semi-depressão devida a escassez crônica de demanda agregada (ou seja, uma situação na qual a poupança de pleno-emprego supera o investimento). Para manter a economia operando com pleno-emprego é necessário então que o governo incorra no déficit fiscal necessário para absorver o excesso de poupança de pleno-emprego. A sustentabilidade do déficit fiscal no longo-prazo exige que a política monetária seja então usada para manter a taxa real de juros ligeiramente abaixo da taxa de crescimento do produto real, de forma a impedir o aumento exponencial da relação dívida pública/PIB. O controle da taxa de inflação seria obtido, nesse contexto, pela adoção de um regime de taxa de câmbio fixo combinado com controles fortes, se não proibição total, dos fluxos de capitais internacionais de curto-prazo aos moldes do prevalecente durante o Acordo de Bretton Woods.
Pessoalmente tenho muito mais simpatia pela primeira posição do que pela segunda. É possível que economias como a Japonesa ou mesmo a Alemã tenham um problema crônico de “excesso de poupança” de tal forma que seja necessário um grande déficit fiscal (ou um grande saldo comercial) para manter o pleno-emprego. Mas certamente não é o caso de economias como a dos Estados Unidos ou do Brasil. Além disso, controlar a inflação por intermédio da adoção de um regime de câmbio fixo só seria viável no bojo de uma ampla reforma do sistema financeiro internacional, algo que parece inviável num mundo multi-polar.
Multiface: A crise de 2007-08 abalou a teoria econômica ortodoxa diante de sua incapacidade de lidar com os problemas que surgiram. Desde então foi possível perceber aumento no interesse pela perspectiva pós keynesiana dentro do meio acadêmico? Como o senhor avalia a situação dessa corrente teórica no Brasil?
Oreiro: A crise de 2007-08, a qual ainda não terminou, aumentou o interesse do público em geral tanto por Keynes como por Marx. No Brasil observamos um aumento do interesse, tanto dos estudantes de economia como do público em geral, pelas ideias de Keynes e de Pós-Keynesianos. Em nosso país a escola Pós-Keynesiana é bastante forte e atuante. O pensamento Pós-Keynesiano é largamente difundido entre os cursos de graduação e pós-graduação em economia no Brasil em função da presença de professores/pesquisadores dessa corrente teórica. Atualmente os centros mais representativos do pensamento pós-keynesiano no Brasil ainda são o Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e o Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas. Mas outros centros também tem se destacado na docência e pesquisa com base nessa corrente teórica. Aqui cabe destacar a UFRGS, a UFMG e a UnB. Não posso deixar de mencionar a importância para essa corrente de pensamento da criação, em 2008, da Associação Keynesiana Brasileira. Este ano faremos em São Paulo o V Encontro Internacional da AKB. Atualmente a AKB conta com mais de 100 filiados, número que aumenta a cada ano.
Multiface: O senhor e outros economistas pós keynesianos tem participação ativa em alguns veículos de mídia convencional. Você acredita que os meios de comunicação tem concedido mais espaço para essa interpretação distinta da economia?
Oreiro: Com certeza. Atualmente os economistas pós-keynesianos tem um espaço bastante considerável em jornais como o Valor Econômico. Outros veículos de mídia convencional nos contatam regularmente para saber nossa opinião sobre assuntos diversos. A ditadura do pensamento único prevalecente até 2005 terminou no Brasil.
Multiface: A Revista Multiface tem como um de seus objetivos principais despertar o interesse dos alunos de graduação para a pesquisa acadêmica. O senhor poderia recomendar algum livro ou artigo para aqueles que desejam iniciar seus estudos na área de economia pós keynesiana?
Oreiro: Recomendo dois livros. O primeiro, do Marc Lavoie, introduction to post-keynesian economics, publicado em 2009 pela Palgrave Macmillan. O segundo do Thomas Palley, post keynesian economics, publicado em 1996 também pela Palgrave Macmillan.
Graduado em Economia pela FEA-USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi pesquisador visitante nas Universidades de Cambridge UK e Columbia NY. Foi economista, gestor de fundos e CEO em instituições do mercado financeiro em São Paulo. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. Brasil, uma economia que não aprende é seu último livro. Conselheiro da FIESP e Economista-chefe do Banco Master
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