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~ Economia, Opinião e Atualidades

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O Brasil caminha para um abismo fiscal? Uma análise numérica para o período 2023-2032

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A crise da economia brasileira, Ajuste fiscal, Debate Macroeconômico, José Luis Oreiro, novo-desenvolvimentismo

José Luis Oreiro

Nas últimas semanas o “mercado” parece estar mais calmo com a equipe econômica montada pelo presidente Lula. Um cenário bastante diferente do que se desenhava em meados de novembro do ano passado quando Armínio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan escrevam uma carta aberta ao Presidente Lula alertando-o de que o Brasil se achava a beira de um precipício fiscal e que a PEC da transição, ao propor inicialmente a realização de um gasto extra teto de R$ 195 bilhões por dois anos iria fazer com que o mercado se recusasse a continuar a refinanciar a dívida pública, criando assim uma crise fiscal com consequências catastróficas sobre a taxa de câmbio nominal (maxidesvalorização da moeda nacional) e o retorno da hiperinflação. Essa análise foi contestada por mim e por outros colegas do grupo de pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento (www.sdmrg.com.br) publicada neste blog no dia 18 de novembro de 2022 (https://jlcoreiro.wordpress.com/2022/11/18/carta-aberta-ao-presidente-lula/) e posteriormente repercutida pela grande imprensa. A PEC da transição foi aprovada no dia 21 de dezembro de 2022 e imediatamente promulgada. Na versão aprovada o gasto extra teto foi reduzido para R$ 145 bilhões por um período menor, de apenas um ano; mas ficou definido que o Ministério da Fazenda deverá enviar até o dia 31 de agosto de 2023 um projeto com um novo arcabouço fiscal para o Brasil. Dessa forma, o teto de gastos foi declarado oficialmente morto, embora o sepultamento definitivo ainda não tenha ocorrido pois ainda estamos celebrando a missa de corpo presente pelo teto de gastos.

Passado um mês da aprovação da PEC da transição nada do que os profetas do apocalipse previram se concretizou. A prévia da inflação em janeiro de 2023 medida pelo IPCA-15 ficou em 0,55% acumulando uma alta de 5,87% em 12 meses, valor ligeiramente inferior ao observado em dezembro do ano passado (5,9%) [a esse respeito verhttps://noticias.r7.com/economia/previa-da-inflacao-ganha-ritmo-e-avanca-055-em-janeiro-24012023]. A taxa de câmbio continua flutuando entre R$5,20 e R$5,50, dependendo do humor do mercado financeiro no Brasil e no exterior, mas nada de sistematicamente diferente do observado no período anterior ao segundo turno das eleições presidenciais. Pelo menos por enquanto o Brasil parece estar livre de entrar num buraco negro.

Não obstante a isso, alguns analistas continuam afirmando que o Brasil continua a passos largos para um abismo fiscal pois as projeções para a relação dívida pública/PIB apontam para um valor superior a 90% do PIB até o final desta década. Não é a primeira vez que esse tipo de previsão é feito. Em abril de 2020 a Instituição Fiscal Independente previu que a DBGG (Dívida bruta do governo) geral poderia chegar a 100,2% do PIB em 2030, no cenário intermediário ou 138,5% do PIB no cenário pessimista (https://www.cbncaruaru.com/artigo/divida-bruta-deve-chegar-a-100-do-pib-em-dez-anos-preve-ifi)

A dívida bruta do governo geral fechou o ano de 2022 em 76,9% do PIB numa trajetória de queda a partir do pico observado em 2020. Trata-se de um valor ligeiramente maior do que o observado no final de 2019 quando a DBGG atingiu a marca de 75,8% do PIB apesar dos gastos extra teto de quase 700 bilhões de reais realizados em 2020 e das PECs dos precatórios e Kamikaze que permitiram a realização de mais algumas centenas de bilhões de reais fora do teto de gastos.

Qualquer economista que entenda o mínimo de Teoria Keynesiana sabe que “o futuro é incerto e o passado é irrecuperável”, nas palavras da economista Britânica Joan Robinson. Prever o comportamento futuro das variáveis econômicas é uma tarefa muito difícil, quando não impossível, principalmente para períodos de tempo muito longos. Isso ocorre devido ao “princípio da não-ergodicidade” dos processos econômicos segundo o qual é impossível a convergência entre a média amostral e a média da população de forma que a observação do comportamento passado de qualquer série de tempo não nos permite inferir nada sobre o comportamento dessa série no futuro. Nas palavras de Keynes “nós simplesmente não sabemos”.

Nem sempre os economistas tem a humildade para reconhecer, ainda mais em debates públicos, as limitações de suas projeções sobre o comportamento futuro da economia. Tudo o que o conhecimento econômico nos permite fazer é construir projeções baseadas em algumas hipóteses sobre o comportamento de certas variáveis chave, hipóteses essas que são apenas conjecturas que o economista faz com base na sua experiência e na sua “visão de mundo”. Dessa forma, as previsões econômicas são necessariamente viesadas no sentido de que se baseiam nas “crenças” dos economistas a respeito do funcionamento do sistema econômico.

A partir do que foi dito acima a honestidade científica no campo da economia exige que o economista explicite suas hipóteses e o “modelo” (entendido como um sistema de equações que descrevem as relações supostas entre as variáveis econômicas) a partir do qual irá basear sua análise.

Neste post eu me proponho a fazer uma simulação numérica da trajetória da DBGG como proporção do PIB para o Brasil no período entre 2023 a 2032. Trata-se de uma projeção que eu considero plausível a partir dos pressupostos e do arcabouço teórico que irei utilizar no exercício de simulação. O modelo a ser utilizado é bastante parcimonioso, pois estou deliberadamente excluindo diversas complicações observadas no mundo real que eu acredito que não são essenciais para a análise a ser feita. Por exemplo, o modelo desconsidera que a DBGG é composta por diversos tipos de títulos (pré-fixados, indexados a índice de preços, indexados a taxa de juros, indexados a taxa de câmbio), seus diferentes prazos de maturidade e etc. O modelo também supõe que a produção das firmas é restrita apenas pelo estoque de capital físico que elas possuem e que o grau de utilização da capacidade produtiva se ajusta de maneira gradual ao nível normal ou desejado pelas empresas no longo prazo. O estoque de capital também é tido como homogêneo e se deprecia a uma taxa constante por período (o qual iremos supor igual ao ano calendário). A taxa de juros de curto prazo (a selic) é determinada com base numa regra de Taylor simples, na qual a autoridade monetária aumenta a taxa de juros com respeito ao seu valor de equilíbrio de longo prazo quando a inflação esperada fica acima da meta de inflação. Por fim, iremos supor que os agentes, na falta de uma melhor alternativa dada a limitação na sua capacidade cognitiva (a racionalidade limitada de Herbert Simon), formulam suas expectativa de maneira adaptativa, considerando que a inflação atual será igual a inflação do período anterior.

Onde:

Os valores usados para os parâmetros do modelo são os seguintes:

No exercício de simulação iremos supor que (i) o Conselho Monetário Nacional irá alterar a meta de inflação para 4% a.a em 2023 e essa meta irá vigorar até 2032; (ii) o governo geral irá incorrer num déficit primário de 1% do PIB em 2023, premissa em conformidade com o resultado primário esperado para o ano de 2023 pelo próprio ministro da fazenda; (ii) o novo arcabouço fiscal a ser aprovado em 2023 em conjunto com a aprovação da reforma tributária ainda no primeiro semestre de 2023 permitirá um ajuste fiscal gradual com o resultado primário alcançando 1% do PIB em 2024, aumentando 0,5% por ano até alcançar 2,5% do PIB em 2027 ficando estável nesse patamar até o final do período; (iii) a taxa de inflação irá ficar em 5% no ano de 2023, se reduzindo para 4% a.a a partir de 2024 e (iv) a taxa de investimento (FBKF/PIB) irá aumentar 0,5 p.p ao ano a partir de 2023, atingindo 24,5% do PIB em 2032. Esse aumento da taxa de investimento é esperado como resultado do aumento do investimento público em infraestrutura (permitido devido ao novo arcabouço fiscal) e da reindustrialização gradual da economia brasileira iniciada no biênio 2023/2024.

Nessas condições, a dinâmica da DBGG/PIB, taxa real de crescimento do PIB, taxa real de juros e resultado primário como proporção do PIB pode ser visualizado na figura abaixo.

Fonte: Elaboração do autor.

Neste exercício a DBGG/PIB aumenta até 2024, quando alcança o patamar de 80,89%, iniciando a partir de 2025 uma trajetória consistente de queda até alcançar 68,83% do PIB em 2032, 10 p.p abaixo do valor registrado no final de 2019.

Esse cenário é bastante diferente do que habitualmente é divulgado pela grande imprensa. Por que? A razão fundamental, na minha visão, é que os profetas do apocalipse trabalham com cenários extremamente pessimistas para a taxa real de juros e a taxa de crescimento do PIB real. Atualmente a taxa real de juros está acima de 6% a.a. Para 2023 a maioria dos analistas prevê um crescimento do PIB em torno de 1%. Dada essa combinação de juros e crescimento a estabilização da dívida pública no patamar vigente no final de 2022 exigiria um superávit primário provavelmente em torno de 3,5% do PIB. A questão que não se coloca, contudo, é que não há nenhuma razão objetiva para estabilizar a dívida pública como proporção do PIB no primeiro ano de mandato do presidente Lula. O que importa é desenhar não apenas um novo arcabouço fiscal, mas um regime de política macroeconômica e um modelo de desenvolvimento que permita o aumento da taxa de investimento, a redução da taxa real de juros e um aumento gradual do superávit primário como proporção do PIB. Se a equipe econômica do governo conseguir desenhar esse arcabouço (e aqui existe um grande SE), então a estabilização/redução da DBGG/PIB será o resultado da retomada do desenvolvimento econômico.

Mercado financeiro aguarda novo arcabouço fiscal a partir de 2024 (Correio Braziliense, 23/01/2023)

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A crise da economia brasileira, Ajuste fiscal, Debate Macroeconômico, Fernando Haddad, José Luis Oreiro, Nova Regra Fiscal

Com o fim do teto de gastos programado para o próximo ano, mercado aguarda sinais claros da equipe econômica sobre o desenho da nova âncora focado no controle de despesas para equilibrar o Orçamento

Com o fim do teto de gastos decretado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em vários discursos desde que assumiu, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem sinalizado que pretende apresentar um novo arcabouço fiscal na primeira metade deste ano. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que ampliou o limite de despesas no Orçamento deste ano em R$ 168 bilhões, e, com isso, elevou o rombo fiscal do Orçamento de 2023 para R$ 231,6 bilhões, prevê a definição da nova âncora até agosto.

O mercado financeiro, que vem dando sinais de não estar em lua de mel com Lula desde a posse, aguarda ansiosamente alguma sinalização da equipe econômica sobre qual será o desenho do arcabouço fiscal que precisará ser respeitado a partir de 2024. O plano de medidas de até R$ 242,7 bilhões para reduzir o rombo fiscal anunciado por Haddad é pouco efetivo. Pelas estimativas da Instituição Fiscal Independente (IFI), por exemplo, quatro medidas são factíveis neste ano, e, juntas, poderiam ajudar a reduzir o rombo fiscal deste ano em R$ 81,3 bilhões. Isso é menos do que os R$ 131,6 bilhões a R$ 141,6 bilhões de impacto previsto pelo ministro para reduzir o rombo fiscal deste ano para algo entre R$ 90 bilhões e R$ 100 bilhões.

Não à toa, a reação do mercado financeiro é negativa toda vez que Lula vocifera em relação à independência do Banco Central e ao teto de gastos — última âncora fiscal vigente, embora tenha sofrido várias alterações pelo governo anterior, foi a medida que ajudou o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) conter o aumento da despesa e da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), na avaliação do economista e ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria. “Eu diria que essa melhora que houve no campo fiscal tem pouco a ver com o governo. Ela ocorreu sobretudo em 2022, por fatores alheios à ação do governo”, disse ele, citando como exemplos a alta dos preços das commodities por causa da guerra na Ucrânia, que aumentou a arrecadação. “O teto de gastos ajudou na redução da manutenção da relação entre despesa federal em relação ao PIB. Então, não há nenhum mérito do governo nisso aí, a rigor. Pelo contrário”, frisou.

Em entrevista ao Correio na semana passada, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, contou que defende um arcabouço que tenha como foco o controle das despesas e que o ministro Hadad tem duas ou três propostas sobre a mesa e deverá se reunir com a equipe econômica sobre o assunto a partir desta semana. “Eu acho que tem que olhar para o gasto. Nós vamos olhar para o gasto público e, no momento que tiver maduro, vamos apresentar algumas pequenas ou grandes propostas para a Casa Civil, para o Ministério da Fazenda, que tem essa visão também de que tem que olhar. A Fazenda está pensando em algumas alternativas em relação ao novo arcabouço fiscal.”

O modelo será definido em conjunto com os integrantes da Junta Orçamentária, composta por Tebet, Haddad, e os ministros Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos) e Rui Costa (Casa Civil), de acordo com a chefe do Planejamento. A ministra vem reforçando que será uma voz divergente na equipe econômica, porque o país gasta muito e mal e, portanto, precisará cortar, inclusive subsídios. “Eu acho que não tem como. Esse é o meu papel. E vou ser a chata da história”, frisou.

Apesar dos discursos de posse dos ministros de Lula de que haverá responsabilidade fiscal junto com responsabilidade social, como a equipe econômica tem mais expansionistas, como Haddad e Esther, do que fiscalistas, como Tebet, muitos se preocupam com uma tentativa de “inventar a roda”, buscando um arcabouço que não seja crível. Um aperfeiçoamento do teto de gastos em vez de uma nova regra tem sido uma das principais alternativas defendidas pelos especialistas.

Além de Mailson e Tebet, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles é outro defensor de que o novo arcabouço fiscal seja focado na despesa, em vez de dívida ou PIB, porque eles fogem do controle. Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, também vê com desconfiança o uso da dívida pública como substituto do teto de gastos. “Nesse caso, vai ser o início do desmonte do governo”, disse. Para ele, “a melhor sinalização de Haddad” foi colocar o economista Bernard Appy como secretário especial da Reforma Tributária, o que vai ajudar o governo na tarefa de fazer um ajuste fiscal, que será inevitável, por meio de ampla reforma no sistema tributário. Lula e integrantes do governo, inclusive, defendem aumento de impostos para os mais ricos.

Simão Davi Silber, professor da Universidade de São Paulo (USP), engrossou o coro nas críticas a um arcabouço sem controle no aumento dos gastos, pois, neste ano não haverá excesso de arrecadação como em 2022. O colchão de liquidez do Tesouro Nacional, com R$ 1,1 trilhão no fim de 2022, pode não ser suficiente para fazer a gestão da dívida pública se não houver credibilidade fiscal do governo junto ao mercado. Apenas o novo Bolsa Família vai custar R$ 600 bilhões em todo o mandato, logo, essa reserva poderá ser queimada rapidamente se o Tesouro tiver dificuldade para rolar essa dívida. “Não podemos nos esquecer que a dívida pública bruta chegou a quase 90% do PIB e só caiu com a ajuda da inflação, que aumentou o denominador do indicador, o PIB nominal. E, se o governo não respeitar as regras fiscais, na melhor das hipóteses, as despesas ficam incontroláveis e a dívida volta para 90% do PIB e, na pior, para 100% do PIB. O mercado não vai aceitar uma dívida nesse patamar. Vamos ter dólar mais alto, juros mais elevados e mais inflação”, alertou.

Silber lembrou que o Brasil não tem a mesma credibilidade de Estados Unidos e Japão para ter uma dívida acima de 100% do PIB, mesmo com a dívida sendo majoritariamente interna. “O novo governo não combinou isso com o mercado e ele não vai aceitar. Portanto, não haverá gol, e a dívida pode explodir”, afirmou ele, fazendo analogia com a famosa de Garrincha ao técnico antes do jogo não combinado com a Rússia. Pelas estimativas da Tendências, a dívida pública bruta pode ultrapassar 100% do PIB, em 2026, considerando o cenário pessimista.

Além de defender um arcabouço fiscal focado no controle das despesas, Evandro Buccini, diretor da gestora de investimentos Rio Bravo, reforçou que o combate à pobreza, uma das prioridades de Lula, estará em risco se não houver uma boa âncora fiscal. “Esse é o grande desafio do novo governo, porque, sem um equilíbrio fiscal, o crescimento econômico vai para baixo e isso bate no mercado de trabalho e na renda, que são condições para as famílias mais pobres melhorarem de vida”, orientou o economista.

Consenso por regra factível

O consenso entre analistas é de que será preciso um arcabouço com metas críveis para o país recuperar a credibilidade da âncora fiscal e, assim, permitir ao governo conseguir fazer um ajuste fiscal mais gradual.

Evandro Buccini, diretor da Rio Bravo, ressaltou que o mercado não está achando ruim que o governo gaste mais a curto prazo para socorrer os mais necessitados e adotar medidas mais urgentes. Contudo, é preciso que “a perspectiva futura seja de melhor responsabilidade fiscal”. “Se a nova regra fiscal for ruim, será preciso cortar gastos ou aumentar imposto a curto prazo, o que terá consequências políticas ao novo governo”, pontuou.

Na avaliação do economista e professor da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro, que integrou o grupo de transição do novo governo, é possível fazer um novo arcabouço por meio do da regra de superavit estrutural — cálculo que exclui fatores transitórios do resultado fiscal, e, segundo ele, pode garantir a redução da relação dívida-Produto Interno Bruto (PIB), a médio e longo prazos. “No superavit primário estrutural, o excesso de superavit primário vai ser usado, em parte, para abater dívida e outra parte para um fundo de estabilização, que pode ser usado em momentos de recessão para investimentos em infraestrutura”, destacou ele, que é um grande crítico do teto de gastos e da regra de superavit primário.

Foto: José Luis Oreiro

A proposta defendida por Oreiro, segundo ele, seria calibrada para que a dívida pública caísse em uma trajetória descendente de médio e longo prazos. “É a melhor política fiscal possível, usada em países da União Europeia e no Chile. Não é preciso inventar a roda. E, toda vez que o Brasil tenta ser criativo, cria uma regra que não para em pé”, pontuou.

No apagar das luzes do governo anterior, técnicos do Ministério da Economia divulgaram duas propostas de arcabouço fiscal que podem ser analisadas. A primeira, do Tesouro Nacional, sugere a vinculação do crescimento das despesas ao tamanho da dívida pública no lugar do teto de gastos e propõe uma reformulação da regra de meta de resultado primário. A segunda, da Secretaria de Política Econômica (SPE), prevê o aprimoramento do teto de gastos, por meio de uma regra que inclui a evolução do PIB, condicionada ao tamanho da dívida pública. A conferir o que virá nos próximos meses.

Revista online | O debate ausente: o desequilíbrio externo persistente da economia brasileira (Revista Política Democrática N.50, Dezembro de 2022)

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, Desequilíbrio externo, José Luis Oreiro, Rigidez estrutural do balanço de pagamentos

Está claro que a situação fiscal no Brasil está longe de ser confortável, mas a dívida pública brasileira é similar à de países como Índia e China

Link: https://www.fundacaoastrojildo.org.br/revista-online-o-debate-ausente-o-desequilibrio-externo-persistente-da-economia-brasileira/

José Luis Oreiro*

O período que sucedeu a vitória de Luis Inácio Lula da Silva no segundo turno das eleições presidenciais foi marcado pelas controvérsias sobre o “estouro do teto de gastos” previsto pela “PEC da Transição”. Na versão aprovada pelo Senado Federal no dia 07 de dezembro de 2022, ficou estabelecido que o governo federal poderá gastar até R$ 145 bilhões “fora do Teto” para executar políticas como a manutenção do Bolsa Família em R$ 600,00 com acréscimo de R$ 150,00 por filho, recompor o orçamento do programa farmácia popular, entre outras políticas sociais e assistenciais. Muitos economistas, a maioria deles ligada direta ou indiretamente ao mercado financeiro, se opuseram publicamente a essa medida alegando que a (sic) “farra fiscal” iria produzir uma fuga de capitais do país, a interrupção do financiamento da dívida pública por parte do mercado, uma maxidesvalorização cambial e o recrudescimento da inflação ao longo do ano de 2023, o que levaria a uma queda do salário real e a um agravamento da situação de fome e pobreza no país.

Não é a primeira vez que esse tipo de cenário apocalíptico é desenhado. Em 2020, durante a pandemia do covid-19, não foram poucos os que disseram que o Brasil caminhava para um “abismo fiscal” devido aos gastos excessivos com o auxílio emergencial, os quais levariam a relação dívida pública/PIB pra perto de 100% em 2022 e que, devido a algum mecanismo mágico, a economia brasileira entraria numa espécie de “buraco negro” com consequências catastróficas para a economia do país. Como sabemos nada disso ocorreu. Graças em larga medida ao auxílio emergencial, a economia brasileira teve uma contração modesta em 2020 (de apenas 3,3%) na comparação com os Estados Unidos e os países da União Europeia. Além disso, a relação dívida pública/PIB no Brasil deve fechar em torno de 78% em 2022, muito abaixo do cenário desenhado pelos profetas do apocalipse.

Está claro que a situação fiscal no Brasil está longe de ser confortável, mas a dívida pública brasileira (% do PIB) é similar a de países como Índia e China. Se o próximo governo for capaz de desenhar uma nova regra fiscal para por no lugar do teto de gastos, que seja capaz de conciliar o espaço fiscal necessário para o aumento do investimento público em infraestrutura e dos gastos assistenciais com a redução da dívida pública como proporção do PIB no médio prazo, para um patamar em torno de 65% do PIB, não há razão para acreditar que o crescimento econômico possa ser restrito pelo lado fiscal.

Uma ausência gritante, para não dizer escandalosa, no debate econômico brasileiro é o desequilíbrio externo. Conforme verificamos na figura 1 abaixo, a partir de maio de 2008, no acumulado em 12 meses, o Brasil começou a apresentar déficit crescente na conta de transações correntes do balanço de pagamentos, o qual atingiu a marca de 4,25% do PIB em outubro de 2015. Esse desequilíbrio externo resultou numa desvalorização da taxa real efetiva de câmbio de 17,12% entre janeiro e dezembro de 2015, contribuindo de forma decisiva para a aceleração da inflação nesse ano e para a elevação da taxa básica de juros por parte do Banco Central, amplificando a recessão que havia começado no segundo semestre de 2014.

Fonte: Ipeadata. Elaboração do autor.

Graças a forte desvalorização cambial e a queda de mais de 8% do PIB entre o segundo semestre de 2014 e o ultimo trimestre de 2016, o déficit em conta corrente se reduziu para 0,894% do PIB em março de 2018. Embora déficits em conta corrente inferiores a 1% do PIB não sejam preocupantes do ponto de vista do financiamento externo, chama atenção que, após a maior recessão dos últimos 40 anos e de uma forte desvalorização da taxa de câmbio, a economia brasileira se mostrou incapaz de voltar a gerar superávits em conta corrente como no período entre junho de 2003 e dezembro de 2007. Mais grave ainda é o fato de que uma vez passados os efeitos da grande recessão brasileira (2014-2016), o déficit em conta corrente como proporção do PIB no acumulado em 12 meses volta a se elevar atingindo 3,52% do PIB em junho de 2020, já no período da pandemia do covid-19.

Entre fevereiro de 2020 e maio de 2021 a taxa real efetiva de câmbio se desvaloriza em 30,75% e a economia se encontra em recessão. Apesar da enorme mudança de preços relativos e da queda do nível de atividade econômica, o déficit em conta corrente no acumulado em 12 meses se reduz para apenas 1,90% em agosto de 2021, apresentando desde então nova tendência a elevação.

Os dados apresentados parecem apontar para o retorno da rigidez estrutural do balanço de pagamentos, situação na qual a desvalorização cambial se mostra incapaz de resolver o desequilíbrio externo devido ao perfil da pauta de exportações. A desindustrialização precoce da economia brasileira resultou numa reprimarização da pauta de exportações, reduzindo assim a sensibilidade das exportações ao câmbio. Nesse contexto, o crescimento do PIB a um ritmo mais robusto será inevitavelmente estrangulado pelo aumento explosivo do déficit em conta corrente, que termina sempre desencadeando uma crise cambial, com maxidesvalorização do câmbio, elevação da inflação e da taxa de juros, abortando assim a retomada do crescimento.


* Professor do Departamento de Economia da UnB. E-mail: joreiro@unb.br.

Produção e emprego industrial caem em outubro, aponta pesquisa da CNI (Hora do Povo, 22/03/2022)

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Foto: Itamar Aguiar/ Palácio Piratini

“Todas as expectativas do setor industrial no mês de novembro recuaram fortemente”, segundo a entidade

Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontam que a indústria obteve desempenho negativo em outubro em relação a setembro. A entidade afirma que  a produção, o emprego e a utilização da capacidade instalada da indústria recuaram no período.

“Reforçando esse cenário, os estoques do setor industrial aumentaram para bem acima do planejado, indicando estoques excessivos e frustração dos empresários com a demanda”, destacou a CNI

A CNI também exibiu que todas as expectativas do setor industrial no mês de novembro recuaram fortemente, sendo “a primeira vez em mais de dois anos, que há expectativa de queda no emprego industrial e nas exportações para os próximos seis meses”. A intenção de investimento do setor industrial também recuou e passou a se situar no menor patamar em mais de dois anos”, disse a entidade que consultou, entre 1º e 10 de novembro, 1.757 empresas, destas: 703 pequenas, 615 médias e 439 grandes.

Em outubro, o índice que mede a evolução da produção da indústria caiu para 48,5 pontos, ficando, assim, abaixo da linha divisória de 50 pontos, o que indica que não houve crescimento da produção. Essa foi a primeira queda na produção industrial para um mês de outubro desde 2016.

Já o indicador que mede evolução do emprego do setor também recuou, após ter crescido por cinco meses consecutivos. O índice caiu para 49,6 pontos, número abaixo da linha divisória de 50 pontos (que separa aumento de queda do emprego industrial). A queda do emprego industrial para um mês de outubro não era constatada desde 2019.

A Utilização da Capacidade Instalada (UCI) caiu um ponto percentual em outubro, para 71%. Nos últimos dois meses, a UCI acumula queda de dois pontos percentuais. Por sua vez, o índice de evolução do nível de estoques aumentou em relação a setembro, batendo a marca de 51,5 pontos em outubro. “O índice de estoque efetivo em relação ao planejado se afastou da linha divisória dos 50 pontos, subindo de 50,9 pontos para 52,4 pontos entre setembro e outubro. O resultado coloca os estoques do setor industrial no nível mais acima do planejado desde julho de 2019”, disse a CNI.

No acumulado do ano até setembro, a produção da indústria brasileira caiu -1,1% e, em 12 meses, -2,3%, segundo o IBGE. Do lado das exportações, o setor também amarga números negativos. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) calcula que a indústria brasileira terminará o ano com um déficit na balança comercial de US$ 125 bilhões, o maior da história. No ano passado, a conta da balança comercial de manufaturados fechou no negativo – déficit de US$ 111 bilhões.

Os números ruins do setor são reflexo dos juros altos, os mais altos do mundo, desestimulando a produção e o consumo no país e obstruindo as ações por novos investimentos, além de colocar por terra as mentiras propagadas pelo atual governo de que a economia estava bombando. Além disso, a escassez  de investimentos públicos – agravada no governo Bolsonaro – dificulta o setor de sair da crise.

O economista José Luís Oreiro lembra que “a produtividade da indústria está estagnada há anos por falta de investimento em equipamento de capital”. Segundo ele, a baixa ou nula acumulação de capital na indústria brasileira é decorrência de vinte anos de câmbio sobrevalorizado e da estagnação da produção física e das vendas da indústria de transformação. “As empresas industriais não investem porque o mercado interno não cresce”, afirma o professor da UNB.

Para o Brasil voltar a crescer, a equipe de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva apresentou a proposta de Emenda Constitucional (PEC) que não só garante o pagamento do Bolsa Família de R$ 600, com os acréscimos de R$ 150 por filho até seis anos, mas também recursos para investimentos públicos em obras paradas. E que esses recursos, para garantir investimentos e os programas sociais, fiquem fora do teto de gastos, que só exclui o pagamento de juros.

De 2017 (quando da implantação do teto de gastos) até setembro deste ano, foram consumidos R$ 2 trilhões, 343 bilhões e  679 milhões do Orçamento Geral da União – ou seja, dinheiro transferido de toda sociedade para o setor financeiro: bancos, rentistas, e outros especuladores – na sua maioria estrangeiros – que não produzem um parafuso no país.

Link: https://horadopovo.com.br/producao-e-emprego-industrial-caem-em-outubro-aponta-pesquisa-da-cni/

Economistas desenvolvimentistas rebatem carta de Armínio, Malan e Bacha (Correio Braziliense, 18/11/2022)

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Cinco economistas divulgaram nova carta ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), desta vez, fazendo críticas aos alertas feitos pelos representantes da ala ortodoxa

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Rosana Hessel

postado em 18/11/2022 19:28 / atualizado em 18/11/2022 20:00

 (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

(crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de Transição provocou uma briga entre economistas com linhas de pensamentos opostas. Um dia após a divulgação da carta aberta dos economistas Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central; Edmar Bacha, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); e do ex-ministro da Fazenda, Pedro Malan, ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cinco economistas desenvolvimentistas se uniram e divulgaram uma segunda carta aberta, nesta sexta-feira (18/11), rebatendo a missiva dos economistas que tiveram um importante papel na implementação do Plano Real e são reconhecidos como ortodoxos.

Na carta aberta, os economistas José Luis da Costa Oreiro, professor da Universidade de Brasília (UnB), líder do Grupo de Pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento; Luiz Fernando Rodrigues de Paula, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e vice-Líder do grupo de Pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento; Luiz Carlos Bresser-Pereira, ex-minstro da Fazneda e professor emérito da Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP), Kalinka Martins da Silva, professora do Instituto Federal de Goiás (IFG); e Luiz Carlos Garcia de Magalhães, técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) afirmam, logo no início, que discordam “do início ao fim “da missiva escrita Fraga, Bacha e Malan, na defesa de um teto para as despesas do governo a fim de evitar uma espiral inflacionária. 

De acordo com o documento, a ideia de que o teto de gastos como garantia para garantir a disciplina fiscal é uma “falácia” e, nesse sentido, destacam que a atual regra não foi suficiente para evitar um estouro de R$ 795 bilhões durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), em referência ao cálculo do economista Braulio Borges, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) para a BBC News. 

“A ideia de que o teto de gastos é fundamental para garantir a disciplina fiscal é uma falácia. Em primeiro lugar, o teto de gastos se mostrou incapaz de impedir que o governo Bolsonaro não apenas realizasse um volume de gastos de R$ 795 bilhões extra teto em quatro anos, como não impediu a criação de novos gastos públicos a menos de seis meses das eleições, algo que é explicitamente vedado pela legislação eleitoral. Deste modo, o teto de gastos não impediu o maior populismo eleitoral da história da República sob o governo de Jair Bolsonaro, com enorme complacência do mercado financeiro”, destacaram os economistas da segunda missiva. “O teto de gastos não foi capaz de reduzir o risco país, mesmo antes dos ‘estouros do teto’ patrocinados pelo governo Bolsonaro, aos valores verificados ao final do seu segundo mandato presidencial”, acrescentaram.

A primeira carta foi motivada, de acordo com Armínino Fraga, pela declaração de Lula criticando o mercado, que recebeu de forma negativa a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) de Transição propondo a exclusão de R$ 198 bilhões em despesas fora do teto de gastos. A proposta para um rombo muito acima do esperado pelo mercado gerou uma crise de credibilidade do novo governo junto ao mercado. 

Nesse valor estão os R$ 175 bilhões previstos com o Bolsa Família, que retomará o lugar do Auxílio Brasil, de R$ 600, mais os R$ 150 para cada criança abaixo de seis anos, e mais R$ 23 bilhões extras para investimentos. Só que R$ 105 bilhões dos recursos para o auxílio estão incluídos no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2023. Ao explicar a motivação da carta, Fraga destacou que os “indícios preocupantes” para o quadro fiscal. 

Oreiro, um dos autores da segunda carta aberta ao presidente eleito, reconheceu a necessidade de uma nova âncora fiscal, que deverá ser discutida a partir de 2023. Além disso, defendeu o corte de subsídios criados pelo atual governo, reduzindo tributos sobre combustíveis, por exemplo, como alternativa para financiar os cerca de R$ 200 bilhões propostos na PEC e que, pelos cálculos da Instituição Fiscal Independente (IFI), deverá abrir um espaço de R$ 203 bilhões de despesas não sujeitas ao teto.

“O que tem para cortar no Orçamento são os benefícios tributários, por exemplo, com a PEC Kamikaze, R$ 150 bilhões de impostos federais e estaduais deixaram de ser arrecadados, que deixaram de ser arrecadados, e aí retorna para o mesmo valor de antes. Praticamente já paga o rombo”, afirmou Oreiro, em entrevista ao Correio.”Mas, como dizemos na carta, é preciso ter uma nova regra fiscal a partir do ano que vem, a partir de quando o presidente assumir”, frisou o acadêmico, que defende a desindexação generalizada da economia para permitir a redução o custo do pagamento de juros da dívida pública. 

Veja a íntegra da segunda carta dos economistas


Ao Excelentíssimo Senhor Presidente Eleito da República Federativa do Brasil, Luis Inácio Lula da Silva.


Prezado Presidente Lula,

Nós os pesquisadores e economistas abaixo assinados gostaríamos inicialmente por parabenizá-lo pela sua eleição ao cargo de Presidente da República Federativa do Brasil no último dia 30 de outubro de 2022. Sua eleição representou o triunfo da civilização e da democracia contra a barbárie e a ameaça autoritária de Jair Bolsonaro. Todos nós ficamos muito felizes e aliviados pelo desfecho do processo eleitoral bem como pelo reconhecimento por parte dos governos das nações civilizadas da sua vitória incontestável no pleito.

Nossa intenção com esta carta, além de parabenizá-lo pela sua vitória, é fazer um contraponto a carta recentemente endereçada a Vossa Excelência pelos economistas Armínio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan. A parte da defesa da civilização e da democracia que os citados economistas fizeram em sua carta, discordamos do início ao fim da missiva escrita por eles.

Na carta enviada a Vossa Excelência, os economistas supracitados se opõem ao seu compromisso de campanha de revogar o Teto de Gastos, o qual na interpretação de Vossa Excelência, a qual é compartilhada por nós, estaria impedindo o aumento dos gastos com saúde, educação, assistência social e investimento em infraestrutura.

Para Fraga, Bacha e Malan o teto de gastos teria desempenhado no Brasil um papel fundamental no sentido de garantir a “responsabilidade fiscal”, a qual é fundamental para manter a inflação sob controle ao assegurar a confiança do “mercado” nas políticas econômicas do governo. Tais economistas afirmam também que a revogação do teto de gastos jogaria o país numa espiral inflacionária devido aos efeitos da desvalorização da taxa de câmbio, o que produziria um arrocho salarial, com efeito negativo para a classe trabalhadora.

A ideia de que o teto de gastos é fundamental para garantir a disciplina fiscal é uma falácia. Em primeiro lugar, o teto de gastos se mostrou incapaz de impedir que o Governo Bolsonaro não apenas realizasse um volume de gastos de R$ 795 bilhões extra teto em 4 anos, como não impediu a criação de novos gastos públicos a menos de seis meses das eleições, algo que é explicitamente vedado pela legislação eleitoral. Deste modo, o teto de gastos não impediu o maior populismo eleitoral da história da República sob o governo de Jair Bolsonaro, com enorme complacência do mercado financeiro.

Fraga, Bacha e Malan argumentam que o Brasil paga taxas de juros altíssimas porque o Estado não é percebido com um bom devedor. Essa afirmação está equivocada. A avaliação de mercado sobre o risco envolvido em emprestar dinheiro para governos soberanos pode ser medida, entre outras formas possíveis, pelo EMBI + calculado pelo Banco J.P. Morgan. No dia 02 de janeiro de 2002, primeiro dia útil do seu primeiro mandato como Presidente da República, Vossa Excelência herdou do governo anterior – no qual trabalharam Fraga, Bacha e Malan – um risco país medido pelo EMBI + de 1527 p.b, ou seja, um spread de 15,27 % sobre a taxa de juros dos títulos da dívida pública norte-americana de idêntico prazo de maturidade. No dia 31 de dezembro de 2010 o risco país havia se reduzido para 189 b.p; prova inconteste da confiança do “mercado” na responsabilidade fiscal do seu governo. O teto de gastos foi aprovado em segundo turno no Senado Federal no dia 13 de dezembro de 2016, data na qual o risco país medido pelo EMBI + do J.P. Morgan se encontrava em 324 b.p, valor 71,42% acima do registrado do último dia de governo do seu segundo mandato como Presidente da República. No primeiro dia útil do governo de Jair Bolsonaro o risco país se encontrava em 275 p.b, valor apenas 15% inferior ao observado no dia da aprovação da Emenda Constitucional do Teto de Gastos pelo Congresso Nacional, mas 45,5% superior ao verificado em 31/12/2010, último dia do seu segundo mandato como Presidente da República. A avaliação do mercado, tal como expressa nos preços dos títulos da dívida pública transacionados nos mercados internacionais, é claríssima: o teto de gastos não foi capaz de reduzir o risco país, mesmo antes dos “estouros do teto” patrocinados pelo governo Bolsonaro, aos valores verificados ao final do seu segundo mandato presidencial.

Na carta endereçada a Vossa Excelência, Fraga, Bacha e Malan também afirmam que a elevação da inflação ocorrida entre 2021 e 2022 foi o resultado do descontrole dos gastos públicos patrocinado pelo governo Bolsonaro, o qual “furou” o teto de gastos em R$ 117,2 bilhões em 2021 e R$ 116,2 Bilhões (previsto) para o ano de 2022. Esse é outro equívoco na carta dos economistas supracitados. A elevação da inflação não foi um fenômeno restrito ao Brasil e tampouco deve-se ao desequilíbrio fiscal. Com efeito, a pandemia de covid-19 e a invasão da Ucrânia pela Rússia foram eventos extraeconômicos que geraram um enorme choque de oferta a nível mundial, quer pela desorganização das cadeias globais de valor (caso da pandemia) quer pelas restrições impostas a exportação de petróleo, gás, soja, milho e trigo por conta dos desdobramentos do conflito da Ucrânia. Esse choque de oferta global produziu um aumento dos preços dos produtos intermediários, energia e alimentos que está alimentando a escalada inflacionária em todo o mundo. A inflação acumulada em 12 meses na União Europeia, calculada em outubro de 2022, se encontra em 11,25%, quase o dobro do valor observado no mesmo período para o Brasil. Na austera Alemanha a inflação se encontra em 11,6% no acumulado em 12 meses. Nos Estados Unidos a inflação acumulada em 12 meses está em 7,7% (dados de outubro de 2022). A política fiscal e monetária do Brasil tem capacidade muito restrita de intervir num processo inflacionário que é gerado fora do país.

No final da carta encaminhada a Vossa Excelência, Fraga, Bacha e Malan afirmam que o problema da falta de recursos para saúde, educação, assistência social e investimento público não são decorrência do teto de gastos, mas da falta de prioridade dada pelo governo a essas áreas. Isso é uma meia verdade. Com efeito, é inegável que o governo de Jair Bolsonaro, tendo Paulo Guedes como Czar da Economia, só deu atenção a assistência social quando isso lhe era eleitoralmente conveniente. Quanto a saúde e educação os números de mortos durante a covid-19 e a falta de recursos para pagar a merenda escolar falam por si mesmos. Mas o teto de gastos é um elemento que impõe um esmagamento de médio e longo-prazo sobre o orçamento dedicado a essas áreas. Isso porque ao congelar em termos reais por um período de 20 anos, a contar de 2016, os gastos primários da União o crescimento puramente vegetativo dos gastos com previdência social, os quais mesmo após a reforma previdenciária continuam crescendo 3% a.a em termos reais, faz com que os demais itens do orçamento da União atuem com variável de ajuste para fechar o orçamento, comprimindo os mesmos. Durante o governo Bolsonaro, além da redução do investimento público e dos recursos destinados as áreas de saúde e educação, a folha de salários dos servidores (ativos e inativos) da União foi reduzida de uma média de 4,4% do PIB durante os governos Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma e Temer para menos de 3% do PIB em 2022. Isso porque o governo Bolsonaro, ao não conceder reajuste aos servidores públicos nos últimos 4 anos, fez com que a inflação corroesse o valor real dos salários dos servidores da União. O problema é que esse processo de ajuste das demais rubricas do orçamento público chegou ao limite. Não é mais social e politicamente possível reduzir o investimento público, ou os gastos com saúde e educação, ou manter congelados os salários dos servidores públicos. Em outras palavras, o teto de gastos é inviável. Essa é a razão pela qual deve ser substituído por uma nova regra fiscal, cuja definição deverá ser feita a partir do momento em que Vossa Excelência assuma efetivamente, pela terceira vez, o cargo de Presidente da República Federativa do Brasil.

Para finalizar esta carta, gostaríamos de fazer um alerta a Vossa Excelência. No debate sobre o ajuste fiscal no Brasil existe um elemento ausente, a saber: os gastos com o pagamento de juros da dívida pública. Em 2022 os gastos com juros serão de mais de R$ 500 bilhões, devendo ultrapassar os R$ 700 bilhões no próximo ano. Trata-se da segunda maior rubrica do orçamento público, ficando atrás apenas dos gastos com previdência social. Esse volume de pagamento de juros é o maior programa de transferência de renda do mundo, só que é uma transferência de renda de toda a sociedade para o 1% mais ricos de nossa população. Não existem soluções mágicas para o problema dos juros como tem sido sustentada, por exemplo, pela famosa “auditoria cidadã da dívida”. Por outro lado, o volume pago com juros não decorre de um elevado endividamento público como proporção do PIB (atualmente em 77,12% do PIB segundo dados do Banco Central do Brasil para setembro de 2022). A título de comparação a Espanha tinha, em março de 2022, uma dívida pública como proporção do PIB de 117,7%, mas paga apenas 2% do seu PIB como juros sobre a dívida pública. Não existe uma relação direta entre o tamanho da dívida pública como proporção do PIB e o custo de carregamento da dívida pública, o qual é, em larga medida, determinado pela política monetária conduzida pelo Banco Central.

Todo o complexo de taxas de juros no Brasil é uma anomalia na comparação com o resto do mundo. Nos últimos 30 anos o Brasil não apenas exibiu uma das mais altas, se não a mais alta, taxa básica de juros do mundo; como também as maiores taxas de juros sobre empréstimos bancários e cartões de crédito. Nosso sistema financeiro é gigante e disfuncional, pois não atua como criador de crédito e de financiamento do investimento e do consumo do setor privado; mas como corretor dos rentistas que vivem às custas do financiamento da dívida pública. No Brasil a verdadeira luta de classes não é entre capital e trabalho, mas entre o capital financeiro, de um lado, e os trabalhadores e o capital produtivo do outro. Esse é o conflito de classes que Vossa Excelência deverá arbitrar a partir do dia 01 de janeiro de 2023. Neste contexto, entendemos ser absolutamente legítimo e viável abrir espaço no orçamento para viabilizar gastos públicos imprescindíveis para o enfrentamento da enorme crise social e econômica que o país está passando. Isto deverá ser combinado, quando estiver empossado, com a adoção de uma nova regra fiscal que combine flexibilidade na execução do orçamento com sustentabilidade da dívida pública no médio e longo prazo.

Era isso o que queríamos comunicar a Vossa Excelência. Sem mais por hora nos despedimos cordialmente, com sinceros votos de sucesso em seu terceiro mandato como Presidente da República.

José Luis da Costa Oreiro (UnB, líder do Grupo de Pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento)

Luiz Fernando Rodrigues de Paula (UFRJ, vice-Líder do Grupo de Pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento)

Luiz Carlos Bresser-Pereira (FGV-SP, professor emérito)

Kalinka Martins da Silva (IFG, professora)

Luiz Carlos Garcia de Magalhães (Ipea, técnico)

Governo Bolsonaro: a pior média de crescimento anual do PIB desde 1999£

06 quinta-feira out 2022

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, desindustrialização, Helder Lara Ferreira Filho, Informativo NETCAT


£ Artigo produzido para o número de setembro do informativo NECAT (Núcleo de Estudos de Economia Catarinense) da Universidade Federal de Santa Catarina.

José Luis Oreiro[1]*

Helder Lara Ferreira-Filho**

Em 2012, quando o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2011 foi anunciado pelo IBGE em 2,7% (posteriormente, em 2015, revisado para 3,9%), muitos o chamaram de “pibinho”. Pois bem, o resultado do PIB no segundo trimestre de 2022 foi um crescimento de 1,2%, relativamente ao trimestre imediatamente anterior. Isso fez com que houvesse revisões nas expectativas de crescimento para a economia brasileira para o ano fechado de 2022, chegando a 2,65%, segundo as expectativas de mercado no Relatório Focus do Banco Central. Seria este um motivo para comemorar, como muitos têm feito, inclusive parte daqueles que chamavam exatamente esse crescimento de “pibinho”? Será que o país estaria “voando”?       

Em primeiro lugar, não é cabível pegar os dados de crescimento de um trimestre e extrapolar para o ano todo, sendo que fatores pontuais podem fazer com que a economia de qualquer país cresça mais num trimestre do que no outro, sem que isso signifique uma aceleração da tendência de crescimento da economia no médio ou no longo prazo. Além disso, há motivos importantes para que essa aceleração no crescimento não se mostre sustentável adiante. No segundo trimestre, indústria, serviços e agropecuária registraram alta, sendo que o setor de serviços, com maior peso no PIB, puxou o resultado geral. Os serviços têm respondido à normalização das atividades com o avanço contínuo da vacinação contra a Covid e aos incentivos dados pelo governo federal neste ano eleitoral. De fato, pudemos observar a antecipação do 13º salário, a liberação de saque antecipado do FGTS, a elevação da margem do crédito consignado, a manutenção do auxílio no valor de 600 reais até o final do ano, a desoneração de produtos industrializados e a intervenção nos preços combustíveis. No entanto, os efeitos dessas medidas e da reabertura da economia se diluem com o tempo, e outros problemas vão começar a se materializar nos próximos trimestres.

Por exemplo, a alta no consumo veio acompanhada de índice recorde de inadimplência das famílias brasileiras, atingindo 79% delas, com grande parte sem conseguir pagar nem as contas de água e luz. O desemprego ainda atinge cerca de 10 milhões de brasileiros, e mesmo dentre os empregados, 40 milhões estão na informalidade e no trabalho precário. Ainda, nos próximos trimestres e em 2023, veremos os efeitos defasados da política monetária restritiva no arrefecimento da demanda. Outra questão é o quadro externo, com elevações de juros também em outros países, o que tende a levar a uma desaceleração global, o que impacta o Brasil de diversas formas, inclusive pelo canal do aumento da percepção de incerteza e da redução do preço de commodities. A percepção de incerteza pode inclusive se elevar durante as eleições e nos momentos subsequentes. Logo, enquanto vemos uma aceleração do crescimento para 2022, as expectativas para 2023 seguem se deteriorando.

Em segundo lugar, não se pode ignorar o passado. O governo Bolsonaro não começou em 2022, mas no dia primeiro de janeiro de 2019. Dessa forma, para uma melhor avaliação, é preciso verificar o conjunto da obra e sua comparação com os dados observados em períodos anteriores. Na tabela abaixo, pode-se observar a taxa média anual de crescimento real do PIB (já descontada a inflação) desde o início do segundo mandato do Presidente Fernando Henrique (1999) até o último dado disponível, que corresponde ao ano de 2021, terceiro ano do mandato do presidente Bolsonaro.

Tabela 1 – Taxa de crescimento médio por governo (1999-2021)

[2]

Fonte: Ipeadata. Elaboração dos autores.

Conforme podemos observar claramente na Tabela 1, o crescimento médio da economia Brasileira se acelera na passagem do segundo mandato do governo Fernando Henrique para o primeiro mandato do Presidente Lula. Apesar da ocorrência da maior crise da história do capitalismo desde a grande depressão de 1929, a assim chamada crise financeira internacional (2008), a economia brasileira no segundo mandato do presidente Lula (2006-2010) ganha ainda mais tração e apresenta um crescimento médio de 4,21% a.a. no período.

A desaceleração do crescimento tem início no primeiro mandato da Presidenta Dilma Rousseff, em parte resultado da crise do Euro em 2012 e do fim do boom de commodities, mas também de diversos erros na condução da política macroeconômica como as desonerações fiscais sem contrapartida, a intervenção desastrosa no setor elétrico e nos preços dos combustíveis (esse filme parece conhecido) e a tentativa de acelerar o crescimento econômico por intermédio de uma política de expansão da demanda agregada, num contexto em que a economia estava sobreaquecida e perdendo dinamismo pelo lado da oferta devido à desindustrialização prematura.

A combinação de todos esses elementos, os impactos da Lava Jato (sobre a economia, o ambiente político e a incerteza) e a crise hídrica fazem com que a economia brasileira entre em recessão no segundo semestre de 2014, o que não impede a Presidenta Dilma de se reeleger em outubro desse mesmo ano. O início do segundo mandato da Presidenta Dilma Rousseff foi caracterizado pela reversão completa na condução da política macroeconômica. Se no primeiro mandato, tanto a política fiscal como a política monetária foram, na média, expansionistas, no ano de 2015 o governo puxa todas as travas da economia ao mesmo tempo: redução de 35% do investimento público em termos reais, aumento da taxa Selic para 14% a.a. e “tarifaço”, ou seja, aumento rápido das tarifas de eletricidade e nos preços dos combustíveis. O resultado obtido, incluindo ainda efeitos da Lava Jato e da crise hídrica, foi exatamente o previsto em qualquer manual de macroeconomia: uma queda vertiginosa do PIB (-3,15%) e uma forte aceleração da inflação, a qual chega quase a 11% no final do ano.

O desastre econômico abre caminho para o impeachment da Presidenta Dilma Rousseff e a posse de Michel Temer como Presidente da República (dando fim aos 13 anos e alguns meses do governo petista). No governo Temer, a economia sai da grande recessão de 2014 a 2016, mas apresenta um crescimento médio de 1,5%, inferior ao observado no segundo mandato do governo Fernando Henrique e muito menor do que o ocorrido nos dois mandatos do Presidente Lula.

Quando Bolsonaro assume em primeiro de janeiro de 2019, a economia brasileira não se encontrava mais em recessão, embora estivesse crescendo a um ritmo médio muito inferior ao observado no período 1999-2010. Mesmo assim, no ano de 2019 a economia brasileira apresenta um crescimento de apenas 0,97%, desacelerando frente ao período anterior. A tendência de desaceleração continuava no início de 2020, de acordo com os dados de atividade antecipados pelo Banco Central para os meses de janeiro e de fevereiro de 2020, anteriores à pandemia.

Em março de 2020, a Organização Mundial de Saúde decreta estado de Pandemia de Covid-19. Medidas de restrição à mobilidade social (embora malvistas pelo governo brasileiro) foram adotadas em todos os países civilizados, dada a incerteza quanto ao vírus e a ausência de tratamento efetivo e de vacinas naquele momento.  Graças à iniciativa do Congresso Nacional, foi aprovada uma Emenda Constitucional que viabilizou o pagamento de um Auxílio Emergencial de R$ 600,00 por três meses para 66 milhões de pessoas. Essa medida amorteceu o impacto das medidas de distanciamento social sobre o PIB, o qual apresentou uma queda de “apenas” 3,74% em 2020.

Em 31 de dezembro de 2020, expirou o “estado de calamidade pública”, o qual permitiu o pagamento do auxílio emergencial ao longo daquele ano. Mesmo com o contágio e as mortes por causa da Covid-19 ainda elevadas no Brasil e no mundo, o governo não solicitou prorrogação do estado de emergência. Nos 6 meses seguintes, o Brasil iria registrar mais de 400 mil mortes por conta do Covid-19, o dobro do que registrou no ano anterior, mesmo que em 2021 as vacinas estivessem amplamente disponíveis.

Retornemos à economia. Após um tombo de quase 4% em 2020, tendo sido aprovada em 2019 a Reforma da Previdência, muitos analistas apostavam não só numa recuperação em V da economia, como ainda na retomada do crescimento econômico. Não foi o que ocorreu. A economia recuperou o que havia perdido em 2020, mas nada mais além disso. Na média do período 2019-2021, o crescimento do PIB foi de somente 0,52% a.a., patamar inferior ao observado no primeiro ano do governo Bolsonaro, o qual já havia sido menor do que o observado na média do período de governo de Michel Temer.

Mesmo absorvendo os dados deste ano, apesar do crescimento de 1,2% no segundo trimestre de 2022, o PIB brasileiro ainda se encontra 0,3 p.p. abaixo do pico da série histórica, ocorrido no primeiro trimestre de 2014, durante a gestão da Presidenta Dilma Rouseff. Isso para não falar da queda no PIB per capita, sendo que a população cresceu nesse período entre 2014 e 2022. Apesar de todas as reformas feitas nos governos Temer (Teto de gastos, reforma trabalhista, reformulação do BNDES, etc.) e Bolsonaro (Previdência, marcos regulatórios, dentre outros), o fato é que a economia brasileira é menor do que era no início de 2014, o que deixa evidente o fracasso da política econômica desde então. Enfim, se for alegada apenas a Covid-19 como justificativa para o desempenho ruim do atual governo, devemos relembrar da maior crise mundial desde 1929 ocorrida durante o Governo Lula e as diversas crises durante o governo FHC. Finalmente, de acordo com levantamento do economistas Sérgio Gobetti, a partir de dados do Fundo Monetário Internacional (FMI), numa amostra de 50 países, o Brasil apresentou trigésima segunda posição dentre as taxas de crescimento no período 2019-2021. Respondendo à pergunta inicial do texto: não, nada temos a comemorar.


* É Professor associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), professor do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade do País Basco (Bilbao, Espanha), pesquisador Nível I do CNPq e líder do grupo de pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento (www.sdmrg.com). Contato: joreiro@unb.br. Página pessoal: www.joseluisoreiro.com.br.

** É mestre em economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorando em economia pela Universidade de Brasília (UnB). Opiniões pessoais, não institucionais. Contato: helder.laferf@gmail.com.

[2] Na elaboração dessa tabela, o ano de 2016 foi excluído do cálculo das médias por ter sido um ano atípico em que o Brasil teve dois Presidentes: Dilma Rouseff (até abril de 2016) e Michel Temer (de maio a dezembro de 2016).

Projeto fazendão versus Plano de Metas à la JK. Eleições 2022 e a economia em disputa. Entrevista especial com José Luis Oreiro (Instituto Humanitas Unisinos, 05/10/2022)

05 quarta-feira out 2022

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, desindustrialização, José Luis Oreiro

Nem o “austericídio” nem a “porra-louquice”. O desafio é buscar um meio-termo para enfrentar os desafios econômicos e sociais do país, afirma o economista

Por: Patricia Fachin | 05 Outubro 2022

A expressiva votação que o ex-presidente Lula obteve no primeiro turno das eleições presidenciais deste ano, 48,4% contra 43,2% do atual presidente Bolsonaro, indica que “há uma parcela bastante significativa da população brasileira que sente saudades da época dos governos dele” e, portanto, “se expressou pela questão econômica”, avalia o economista José Luis Oreiro, ao comentar o resultado eleitoral do último domingo.

Na entrevista a seguir, concedida por telefone ao Instituto Humanitas Unisinos – IHU, Oreiro discorre sobre os desafios em torno de um possível novo mandato do ex-presidente. “A última coisa que o presidente Lula vai precisar no início do ano que vem é de turbulência nos mercados financeiros. Então, ele vai ter que fazer o seguinte malabarismo: tirar o teto de gastos porque com ele é impossível fazer qualquer política econômica, de assistência social e de industrialização no país hoje, mas o teto de gastos tem que ser retirado de uma maneira que se coloque alguma outra regra fiscal que dê credibilidade ao governo de que a relação dívida pública/PIB não vai explodir no médio e longo prazo. Então, vai ter que haver uma conversa muito bem feita com as instituições do mercado financeiro para que não se imploda o governo nos primeiros meses. Esse é o principal desafio. Repito: o teto de gastos tem que sair, mas alguma coisa tem que ser posta no lugar”, assegura.

Segundo ele, em termos econômicos, a reeleição do presidente Bolsonaro significa a continuidade do “projeto fazendão”, que consiste em “transformar o Brasil em uma grande fazenda de soja, de frango, uma mina a céu aberto”, a fim de “transferir a riqueza que existe no país para o estrangeiro”. Já um novo governo Lula, que anos anteriores também apostou no Brasil como grande celeiro do mundo, a perspectiva, acentua, é “a vitória da civilização contra a barbárie” e, em termos econômicos, “a chance de retomarmos a trajetória de desenvolvimento econômico”, não aos moldes de um PAC-2 sustentável, mas de um “Plano de Metas à la Juscelino Kubitschek”.

José Oreiro (Foto: FGV)

José Luis Oreiro é graduado em Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, possui mestrado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio e doutorado em Economia da Indústria e da Tecnologia pela UFRJ. É professor associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília – UnB e professor doutorado em Integração Econômica da Universidade do País Basco, Espanha. Entre suas obras, destacamos: Macroeconomia do desenvolvimento: uma perspectiva keynesiana (publicado pela LTC em 2016) e Macrodinâmica pós-keynesiana: crescimento e distribuição de renda (Alta Books, 2018).

Confira a entrevista.

IHU – Que Brasil se expressa no resultado das eleições deste domingo?

José Luis Oreiro – Um país dividido. O ex-presidente Lula conseguiu quase 50% dos votos válidos, ou seja, há uma parcela bastante significativa da população brasileira que sente saudades da época dos governos dele. Essa população, majoritariamente, está votando para retornar àquele nível de vida que tinha na época do governo do ex-presidente. Essa população se expressou pela questão econômica porque vê que a situação econômica, para ela, é muito pior hoje do que era na época do PT.

Outra parte da população optou por um voto – não sei se ideológico seria a palavra correta – que mistura valores, religião e antipetismo. Ou seja, não é um voto econômico. Bolsonaro obteve um voto fundamentalmente religioso, que expressa a força das igrejas neopentecostais. Temos relatos de como alguns pastores influenciaram os votos dos fiéis no primeiro turno. Tem também o antipetismo; ele ainda existe. A migração dos votos do Ciro para Bolsonaro também é um voto antipetista. É um conjunto mais difuso daquilo que o economista Paul Krugman chama de “arma de distração de massa”. Ou seja, coisas que não estão relacionadas à economia, mas que são colocadas na eleição para atrair eleitores que, em tese, deveriam estar votando mais à esquerda, ou seja, com Lula, mas acabam votando na direita porque não conseguem associar que a direita não favorece seus interesses econômicos.

Lula conseguiu quase 50% dos votos válidos… há uma parcela bastante significativa da população brasileira que sente saudades da época dos governos dele – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Quais são as luzes que se revelam a partir do resultado das urnas?

José Luis Oreiro – Faltou muito pouco para Lula vencer no primeiro turno. Na verdade, faltou menos de dois milhões de votos. Ele está com 48,4% dos votos e Bolsonaro, com 43,2%. Quer dizer, ao que tudo indica Bolsonaro só conseguiu adiar a derrota. É óbvio que ainda tem muita água para rolar, mas acredito que o apoio de Simone Tebet ao Lula vai ser importante para sacramentar a vitória do ex-presidente no segundo turno, a qual, a meu ver, é absolutamente necessária para preservar a democracia no Brasil. Se Bolsonaro ganhar, com esse Congresso eleito, temo pelo estado democrático e pelo estado laico.

IHU – Alguns analistas têm destacado a força da extrema-direita e do bolsonarismo, mas o percentual de votos conquistado pelo ex-presidente Lula é impressionante, considerando os últimos fatos políticos. Como avalia o resultado do primeiro turno em relação a esse ponto?

José Luis Oreiro – Pensemos da seguinte maneira: em 2018, Lula estava preso, saiu da cadeia, conseguiu rever seus direitos políticos e conseguiu, no primeiro turno de 2022, quase o mesmo percentual de votos que Bolsonaro obteve no segundo turno de 2018. Naquela época, Bolsonaro teve 57 milhões e 800 mil votos. Lula teve agora 57 milhões e 200 mil votos. Então, realmente é impressionante o nome do ex-presidente Lula.

Outra coisa que não deve ser desconsiderada é que o presidente Bolsonaro tem a máquina na mão e utilizou todos os artifícios possíveis para alavancar a sua popularidade nos últimos meses. Estou falando do Auxílio Brasil, que ele aumentou de 400 para 600 reais, do preço da gasolina, que foi reduzido e do orçamento secreto, que certamente está por trás de boa parte do sucesso dos candidatos bolsonaristas nas eleições para a Câmara dos Deputados e para o Senado. Apesar de todo o vento contrário, o presidente Lula praticamente liquidou no primeiro turno; considero realmente uma grande vitória.

Apesar de todo o vento contrário, o presidente Lula praticamente liquidou no primeiro turno; considero realmente uma grande vitória – José Luis Oreiro Tweet

IHU – De outro lado, quais são as sombras que aparecem a partir dessas eleições?

José Luis Oreiro – O ponto mais negativo da eleição foi a transferência de votos do Ciro para Bolsonaro. Ciro vinha desde 2016 se apresentando como uma alternativa ao PT pela esquerda, mas se colocou como linha auxiliar do bolsonarismo. Esse foi o ponto mais negativo. Ele acabou melancolicamente: conquistou 3% dos votos válidos, muito atrás do que ele teve em 2018. Ciro sai desta eleição muito menor do que entrou.

Agora, ele prestou um desserviço à democracia brasileira porque a lógica eleitoral diz que ele deveria ter concentrado “seu fogo” no segundo colocado e não no primeiro. Mas ele não fez isso. Ele alimentou o antipetismo e isso foi ruim porque deu mais votos para Bolsonaro. Agora, ele vai dizer que apoia o Lula? Acho difícil e também, a essa altura, não vai fazer muita diferença. Quem é crucial agora é a senadora Simone Tebet. No domingo, ela disse que não iria ficar omissa, ou seja, vai tomar uma posição e, pelo histórico dela na comissão da Covid-19, estou confiante que ela vai apoiar o presidente Lula.

De outro lado, as eleições para o Congresso e o Senado foram um desastre. Os senadores eleitos claramente representam o bolsonarismo e a extrema-direita e não têm compromisso com a democracia. Veem a democracia apenas como um instrumento para a tomada do poder e a implementação, pela força, dos seus valores. Vimos isso no Senado, na Câmara dos Deputados e no caso de alguns governadores.

O ponto mais negativo da eleição foi a transferência de votos do Ciro para Bolsonaro – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Quais as perspectivas de futuro que emergem a partir do resultado das urnas?

José Luis Oreiro – Aposto na vitória do presidente Lula e, no pior cenário, em uma reprodução das eleições de 2014, isto é, 52% a 48%. Não vai ser uma vitória muito expressiva, mas vai ser uma vitória. Isso vai acontecer.

Os senadores eleitos representam o bolsonarismo e a extrema-direita e não têm compromisso com a democracia – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Quais serão os desafios em torno da governabilidade, caso esse cenário se confirme?

José Luis Oreiro – Uma vez o presidente ganhando, tem os partidos do centrão que não são ideológicos e querem estar com o governo. Então, ele vai ter que fazer a política de sempre com o centrão. Isso é um dado.

O lado positivo é que sabemos que o ex-presidente Lula é um político experimentado e sabe negociar. O lado negativo é que talvez não dê para acabar com o orçamento secreto e essas coisas porque praticamente estaria sendo pedido para o pessoal do centrão cometer suicídio e eles não vão querer cometer suicídio. Então, realisticamente esse é o jogo que Lula vai ter que jogar.

O Ministério da Fazenda vai ser ocupado por alguém do mercado financeiro ou alguém que tenha ligação com o mercado financeiro – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Como avalia o aceno entre Henrique Meirelles e o ex-presidente Lula nos últimos dias e a especulação em torno do nome do ex-ministro para ocupar o Ministério da Fazenda, num possível novo governo Lula? O que esse movimento pode indicar sobre os rumos da economia brasileira no próximo ano?

José Luis Oreiro – O Ministério da Fazenda vai ser ocupado por alguém do mercado financeiro ou alguém que tenha ligação com o mercado financeiro. Não precisa ser alguém do mercado financeiro, ou seja, não estou dizendo que vai ser o Meirelles, até porque ele já tem uma certa idade e esse não é um ministério light. Mas já adianto que o presidente deve desmembrar o Ministério da Economia em Ministério da Fazenda, Ministério do Planejamento e Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O ministro da Fazenda vai repetir o que foi feito no primeiro mandato do governo Lula, ou seja, vai ser alguém mais ortodoxo, mas vai ter um contraponto no Ministério do Planejamento. Sobre o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, não sei se ele vai entregar para um político ou se vai colocar algum desenvolvimentista, que seria o ideal para sinalizar de maneira clara que, sem romper com a ortodoxia financeira e a responsabilidade fiscal, o governo está comprometido com o desenvolvimento econômico.

IHU – Quais serão os desafios em termos de retomada da economia, considerando o atual quadro de aumento da pobreza e toda a crítica que a esquerda faz ao mercado financeiro e à financeirização da economia?

José Luis Oreiro – A última coisa que Lula vai precisar no início do ano que vem é de turbulência nos mercados financeiros. Então, ele vai ter que fazer o seguinte malabarismo: tirar o teto de gastos porque com ele é impossível fazer qualquer política econômica, de assistência social e de industrialização no país hoje, mas o teto de gastos tem que ser retirado de uma maneira que se coloque alguma outra regra fiscal que dê credibilidade ao governo de que a relação dívida pública/PIB não vai explodir no médio e longo prazo. Então, vai ter que haver uma conversa muito bem feita com as instituições do mercado financeiro para que não se imploda o governo nos primeiros meses. Esse é o principal desafio. Repito: o teto de gastos tem que sair, mas alguma coisa tem que ser posta no lugar.

Clique para acessar o IHUOnlineEdicao468.pdf

IHU – Somente a retirada do teto de gastos é suficiente para resolver os problemas relativos ao aumento da fome, da pobreza, da falta de moradia, da desindustrialização que perdura mais de 20 anos?

José Luis Oreiro – Se retirar o teto de gastos e colocar no lugar uma regra fiscal que dê ao governo, no curto prazo, a flexibilidade para aumentar os seus gastos, sem que isso seja visto como algo que vai levar, lá na frente, a uma implosão da dívida pública, nós conseguiremos endereçar essa questão de maneira tranquila. O problema é tirar o teto de gastos, aumentar os gastos com assistência social – que precisam ser aumentados para recompor parte do orçamento que foi zerado no fim do ano pelo ministro Paulo Guedes – e aumentar o investimento público, sem dar ao mercado uma garantia de que a dívida pública não vai explodir. Esse é o ponto.

Não há nenhum problema, tirando meia dúzia de radicais que sempre vão falar contra, de explicar que é preciso aumentar os gastos por conta da situação social do país, que é muito ruim, e também é preciso aumentar o investimento em infraestrutura, porque sem isso o Brasil não volta a crescer, mas estabelecer uma regra que garantirá que, no médio e longo prazo, a relação dívida pública/PIB vai se estabilizar e tenderá a cair.

É esse tipo de discurso que os americanos chamam de “meio-termo” – não é nem o austericídio fiscal nem a “porra-louquice”. Tem que haver um equilíbrio entre essas duas coisas. Isso precisa ser não só bem desenhado, mas bem comunicado e negociado.

Clique para acessar o IHUOnlineEdicao218.pdf

IHU – O que isso significa em termos do que precisa ser diferente ou semelhante num eventual novo governo Lula em relação às políticas que foram adotadas nos outros mandatos do ex-presidente?

José Luis Oreiro – Em primeiro lugar, vai haver uma retomada do investimento público no Brasil. Em segundo, o papel do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES como banco de desenvolvimento vai ser resgatado. Ele foi escanteado pelo governo Temer e quase destruído pelo governo Bolsonaro, mas vai voltar a ser importante. Vamos ter políticas de assistência social que realmente funcionem.

Quando comparamos o Bolsa Família e o Auxílio Brasil, percebemos que o Bolsa Família era mais bem desenhado do que o Auxílio Brasil e tinha contrapartidas, quer dizer, as famílias beneficiadas tinham que manter as crianças na escola, tinham que mostrar atestado de vacinação etc. Não se trata apenas de dar o dinheiro, mas de construir e fazer uma porta de saída para o programa, que consiste em dar aos filhos dessas pessoas pobres as condições para eles entrarem de maneira produtiva no mercado de trabalho. Isso só é possível com educação, vacinação e alimentação adequada. Então, essa sempre foi a ideia do Bolsa Família, um programa barato, eficiente e eficaz que sempre foi elogiado em outros países do mundo.

Bolsonaro obteve um voto fundamentalmente religioso, que expressa a força das igrejas neopentecostais – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Do ponto de vista econômico, o que significa a reeleição do presidente Bolsonaro para o país?

José Luis Oreiro – O projeto do Bolsonaro e do Guedes, porque não consigo dissociar uma pessoa da outra, é o “projeto fazendão”, ou seja, quer transformar o Brasil em uma grande fazenda de soja, de frango, uma mina a céu aberto. O que Guedes disse em uma live, “que temos que privatizar as praias”, é exatamente a lógica do saque do Brasil para os estrangeiros. Essa é a lógica. Guedes não pensa em criar riqueza. Ele quer transferir a riqueza que existe no Brasil para o estrangeiro. É isso que representa, em termos econômicos, a reeleição de Bolsonaro. Portanto, Bolsonaro é a antítese do que ele prega para os seus convertidos. Seus convertidos ficam usando a bandeira do Brasil como se nacionalistas fossem. Pelo contrário, Bolsonaro é o presidente mais antinacionalista da história do Brasil. Ele sente um ódio profundo pelo Brasil, mas as pessoas não percebem isso. Ele tanto odeia o Brasil que bate continência para a bandeira dos EUA. Onde já se viu um presidente do Brasil bater continência para a bandeira de qualquer outro país do mundo? Isso não existe. Isso fere completamente o protocolo da Presidência da República.

IHU – Do ponto de vista econômico, o que significa outro mandato do ex-presidente Lula?

José Luis Oreiro – A eleição do ex-presidente Lula, em termos políticos, significa a vitória da civilização contra a barbárie. Em termos econômicos, significa uma chance de retomarmos a trajetória de desenvolvimento econômico. Se vamos conseguir ou não, não sei, mas é uma chance porque, com Bolsonaro, tenho certeza que não vamos ter desenvolvimento.

Em termos econômicos, a eleição do ex-presidente Lula significa uma chance de retomarmos a trajetória de desenvolvimento econômico – José Luis Oreiro Tweet

IHU – Em que sentido o senhor vislumbra algo diferente em um novo governo Lula, uma vez que houve uma clara opção pelo agronegócio brasileiro nos governos petistas, setor que enriqueceu muitíssimo, juntamente com as empresas consideradas à época “gigantes nacionais”? O que significa a possibilidade de retomada da trajetória do desenvolvimento econômico daqui para frente? O que seria distintivo do governo Lula em relação a ele próprio no passado e o que é feito hoje no governo Bolsonaro?

José Luis Oreiro – Conversei com [Aloizio] Mercadante umas duas vezes e me pareceu que a equipe econômica do PT tem consciência da necessidade da reindustrialização da economia brasileira e que o vetor da reindustrialização seria pela retomada do investimento público, principalmente, visando também a descarbonização da economia. Então, me parece que eles estão conscientes da necessidade da reindustrialização.

IHU – Concretamente, a reindustrialização seria uma aposta em um Programa de Aceleração do Crescimento – PAC-2 sustentável?

José Luis Oreiro – Não sei se um PAC-2. Talvez seria melhor um Plano de Metas à la Juscelino Kubitschek. Então, acho que a equipe econômica tem essa ideia na cabeça. Agora, se vão conseguir implementar ou implementar de maneira correta, aí é outra história, porque vai depender de costura política.

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Cinco Perguntas para José Luís Oreiro (Revista Indústria Brasileira, 30/09/2022)

30 sexta-feira set 2022

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, desindustrialização, José Luis Oreiro, novo-desenvolvimentismo

Publicado por jlcoreiro | Filed under Debate Macroeconômico, Desenvolvimento econômico, Desindustrialização prematura, Governo Bolsonaro, Governo genocida, Green New-Developmentalism, José Luis Oreiro

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Brasil cresce menos que o mundo no governo Bolsonaro (Folha de São Paulo, 24/09/2022)

26 segunda-feira set 2022

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, desindustrialização, José Luis Oreiro, Semi-estagnação da economia brasileira

País repete desempenho de Dilma e Temer; dados contradizem avaliação do governo de que a economia está decolando

Novas taxas de juros no Brasil e EUA serão anunciadas na quarta-feira (21) [Portal Vermelho, 20/09/2022]

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A crise da economia brasileira, Debate Macroeconômico, Inflação no Brasil, José Luis Oreiro, política monetária

Preço da alimentação não dá trégua e diminuição dos preços dos combustíveis é “redistribuição de renda dos pobres para a classe média”, aponta economista da UNB.

por Murilo da Silva

Publicado 19/09/2022 20:01 | Editado 19/09/2022 20:02

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

A semana será marcada por anúncios sobre as taxas de juros do Brasil e dos Estados Unidos. Na próxima quarta-feira (21), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) brasileiro se reunirá para decidir se coloca fim ao ciclo de alta dos juros, ou se realiza mais um aumento antes de finalizar o ciclo. No mesmo sentido, o Federal Reserve dos EUA decidirá o quanto aumentar para controlar a inflação no país.

No Brasil, a taxa de juros (Selic) está em 13,75% ao ano. Parte do mercado acredita que os juros serão mantidos após divulgação do boletim Focus do BC. De acordo com o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luís Oreiro, é possível que a manutenção aconteça, porém ele acredita em uma elevação de 0,25%, em um último aumento que encerraria o ciclo de elevação.

“Nos últimos dois aumentos, o Banco Central elevou em 0,5%. Acredito que antes de finalizar o ciclo de aperto monetário o Banco Central vai fazer um ajuste residual de 0,25%. Então acredito que a taxa de juros vá aumentar para 14% e a partir daí será sinalizado o encerramento, ou suspensão temporária do ciclo de elevação da Selic”, diz.

Inflação

A inflação é medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA-IBGE) construído em cima de uma cesta representativa do consumo de bens entre famílias que ganham entre um e quarenta salários mínimos.

Leia também: Juros continuam aumentando nos EUA, mas inflação não cai

Segundo o Focus, a projeção para a inflação do ano caiu de 6,40% para 6%.  No entanto, a queda apontada acontece em meio as ações do governo que visam ganhar popularidade com a classe média pela redução do preço dos combustíveis. No entanto, as medidas não auxiliam a questão da subida dos preços dos alimentos. Além disso, houve redução no valor da energia elétrica no período, com a operação tarifária em bandeira verde.

“No ano passado operou-se com bandeira vermelha tipo 2. As condições dos reservatórios, das usinas hidrelétricas estão melhores do que o ano passado. Isso significa que se aciona menos as termoelétricas e por isso estamos em bandeira verde. Quando você junta a redução dos preços de combustíveis e eletricidade, devido à redução do ICMS, com a redução sobre o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), isso explica toda a queda observada na inflação nos últimos dois meses, junho e julho”, aponta Oreiro.

Peso da alimentação X Combustíveis

O economista ainda alerta que a redução apontada pelo IPCA, que tem uma grande amplitude, diz mais sobre as famílias que tem automóveis e, portanto, se beneficiam da redução do preço dos combustíveis, do que para as famílias com renda menor, para quem a cesta básica de alimentos tem maior peso.

“O peso da alimentação para famílias que ganham de um a dois salários mínimos é muito maior do que para famílias que ganham mais de 20 salários mínimos. Assim como o peso dos combustíveis para quem ganha entre um e dois salários mínimos é nenhum, porque essas pessoas não tem carro. Já quem ganha entre 5 e 6 salários mínimos, provavelmente, tem o seu próprio carro, pode ir trabalhar com ele e tem um gasto considerável devido aos combustíveis. Com isso, o efeito da queda do preço dos combustíveis é assimétrico, ele beneficia mais quem ganha mais, ou seja, foi uma medida regressiva do ponto de vista da distribuição de renda”, explica.

Conforme demonstra o professor, os mais pobres não se beneficiam com a queda da inflação puxada pelos combustíveis e pela eletricidade, pois a inflação dos alimentos continua alta, com entressafra, guerra e lockdown.

“Os alimentos continuaram subindo de preço, até porque a gente já está em entressafra e existem os problemas com a guerra da Ucrânia e Rússia e tem os lockdowns na China. Tudo isso continua pressionando os alimentos enquanto os combustíveis, que são mais importantes para a classe média e classe média alta, caíram de preço, isto é, foi uma política de redistribuição de renda dos pobres para a classe média”, crítica o economista as medidas do governo às vésperas da eleição.

Estados Unidos

A economia norte-americana continua em alerta com alta na inflação, de 8,3% em 12 meses (até agosto), o que afeta os preços dos alimentos no Brasil.

Como sinaliza o professor da UNB, os analistas apostam que Federal Reserve pode aumentar em até 1% a taxa de juros. Porém, ele acredita em uma nova elevação de 0,75% na taxa básica de juros norte-americana.

Sobre a influência sobre o Brasil, Oreiro observa que o câmbio nacional continuará pressionado acima de 5 reais por dólar.

“Isso significa que a inflação de alimentos não vai ceder, porque a única maneira de fazer ceder essa inflação seria por intermédio de uma valorização do real frente ao dólar. Coisa que não vai acontecer por conta da política monetária nos EUA e na Europa”, completa.

Link da matéria: https://vermelho.org.br/2022/09/19/novas-taxas-de-juros-no-brasil-e-eua-serao-anunciadas-na-quarta-feira-21/

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