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A deformação da reforma na tributação de renda (Poder 360, 10/08/2021)
11 quarta-feira ago 2021
Posted Reforma tributária
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Helder Lara Ferreira Filho*
José Luis Oreiro **
Link da matéria: https://www.poder360.com.br/opiniao/economia/a-deformacao-da-reforma-na-tributacao-de-renda-escrevem-helder-lara-e-jose-luis-oreiro/


Uma reforma tributária ampla passaria pela simplificação (principalmente, mas não somente, no âmbito da tributação indireta) e pela redução de distorções (que afetam a progressividade da estrutura tributária brasileira). Como é de conhecimento comum, o sistema tributário brasileiro é dos mais complexos do mundo, sendo que as empresas gastam muito tempo e recursos humanos para conseguir realizar o pagamento dos impostos, taxas e contribuições em conformidade com a legislação vigente, devido a existência de regras tributárias confusas e ineficientes e que, além do mais, são distintas para cada ente federativo. Mas não iremos tratar dessa questão nesse artigo. O que nos interessa aqui é analisar a questão da progressividade da carga tributária. Isso porque o Brasil, apesar de ter uma carga tributária bruta em níveis similares à média dos países integrantes da OCDE, ao contrário deles, possui uma concentração maior na tributação indireta do que na direta. Isto está francamente ligado às distorções na tributação de renda, por isso a necessidade de uma reforma tributária focada nessa questão. É sobre esse assunto que trataremos neste artigo.
O PL 2337/2021, denominado de “Reforma da Renda”, foi apresentado em junho deste ano, sendo que, apesar de apresentar algumas medidas, conforme comentaremos adiante, parecia caminhar no sentido correto – na redução das distorções na equidade tributária e na direção de maior progressividade. No entanto, em pouco mais de um mês, o projeto vem sendo completamente descaracterizado por pressão de grupos organizados e de setores vários, a tal ponto de que pode levar a uma redução na carga tributária do país (!), num contexto em que o governo geral continuará exibindo sucessivos déficits primários nos próximos anos.
Um primeiro aspecto a ser ressaltado é que, nos últimos 30 anos, os governos dos países desenvolvidos e alguns países em desenvolvimento passaram a reduzir de forma paulatina, notadamente sobre empresas, por intermédio de sucessivas rodadas de redução da alíquota do imposto de renda sobre as empresas. Essa redução foi justificada com base num alegado, e nunca demonstrado, ganho de eficiência na alocação de recursos ao encorajar a acumulação de capital e o investimento produtivo o que, ao final, permitiria um crescimento maior da produtividade do trabalho por intermédio da incorporação do progresso técnico em novas máquinas e equipamentos. Além disso, alegava-se que a redução da alíquota do imposto de renda sobre as empresas de um país aumentaria sua competitividade relativamente aos demais países; sem se atentar para o fato de que, tal processo, terminaria por levar a uma espécie de “guerra fiscal” entre os diversos países, cujo resultado seria um jogo de soma zero, quando não negativo, para os governos desses países. Foi nesse contexto histórico que o Brasil passou a isentar a distribuição de lucros e dividendos distribuídos a partir do governo Fernando Henrique Cardoso. Esse movimento foi também impactado pela competição dos chamados “paraísos fiscais”, os quais colocavam a tributação sobre as empresas a níveis muito baixos, quando não nulos, para atrair pelo menos parte da operação dessas empresas, principalmente o segmento ligado à contabilidade.
Ocorre que a evidência empírica disponível não tem demonstrado a existência de resultados positivos em termos de aceleração do crescimento econômico derivada da redução da carga tributária sobre as empresas. O que as evidências apontam é que a redução dos impostos sobre as empresas está associada ao aumento da desigualdade na distribuição de renda e de riqueza observada nos países desenvolvidos ao longo dos últimos 30 anos. Por fim, diversos países incorreram em perda de arrecadação de impostos, pois muitas empresas transferiram ao menos suas operações financeiras para paraísos fiscais, o que impediu que esses recursos pudessem ser investidos em várias áreas relevantes e prioritárias para o bem-estar das suas populações. Nesse contexto, tem-se observado nos países desenvolvidos, principalmente após advento de Biden nos Estados Unidos, um movimento no sentido de colocar em pauta uma agenda de elevação da tributação sobre as empresas. Dentre as ideias em estado mais avançado de elaboração encontra-se a proposta de impor uma tributação mínima global a qual todas as empresas estariam submetidas, mesmo que seus lucros sejam computados em paraísos fiscais.
Nesse sentido, seguindo a nova tendência mundial, ao menos na direção correta, veio o PL 2337/2021. Em linhas gerais, o PL traria as seguintes modificações principais: (i) sobre o IRPF, ampliação da faixa de isenção e correção das faixas tributadas, possibilidade de atualização do valor do imóvel e a limitação do desconto simplificado; (ii) sobre o IRPJ, redução em 2 anos de 15% para 10%, com adicional de 10% para lucros acima de 20 mil reais por mês; (iii) esse último ponto seria compensado pela tributação de lucros e dividendos distribuídos em 20%, com isenção de até 20 mil reais por mês para microempresas e empresas de pequeno porte; (iv) fim da dedução do juro sobre capital próprio; (v) medidas simplificadoras e que favorecem operações de curto prazo para investimentos financeiros, tal como operações day trade.
O PL possui, em nosso ponto de vista, alguns problemas. Em primeiro lugar, a uma correção excessiva das faixas de tributação limitando o pagamento do IR a um grupo significativamente menor de pessoas, ou seja, se produz uma redução significativa da base de arrecadação. Além disso, busca-se a antecipação de receitas com imóveis, o que pode não ser o ideal (já que, no longo prazo, a arrecadação seria maior sob as regras vigentes anteriormente); e a restrição do desconto simplificado seria saudável (por não mais fazer sentido com a declaração de imposto de renda digitalizada e facilitada). Em segundo lugar, a alíquota de IRPJ poderia até mesmo ser menor do que o proposto pelo PL caso a introdução da tributação de lucros e dividendos pudesse ser progressiva, ou seja, com alíquotas crescentes para faixas maiores de lucros e dividendos distribuídos até o limite de 20%. Essa medida também auxiliaria a reduzir os efeitos da “pejotização” – ou seja, reduzindo o incentivo de se formar uma PJ para conseguir benefícios tributários, uma vez que um trabalhador sob o regime de PJ pagaria algo mais próximo de tributação relativamente a um trabalhador sob o regime de PF. Quanto a eliminação dos juros sobre o capital próprio, trata-se de uma medida correta que vai na mesma direção do que está sendo feito nos países desenvolvidos. O mesmo não pode ser dito com respeito ao item (v) que propõe algumas medidas que em tese seriam simplificadoras (apesar de que a simplificação ser ainda objeto de controvérsia), mas gera um incentivo para a realização de investimentos financeiros com menor prazo de maturidade, estimulando assim o comportamento “curto-prazista” típico dos mercados financeiros no Brasil.
O problema maior, entretanto, é a descaracterização contínua do projeto durante a sua discussão no congresso nacional. Por exemplo, até o momento em que escrevemos este texto, foram retiradas algumas possibilidades adicionais de tributação que tinham sido incluídas; novas isenções na distribuição de lucros e dividendos foram incluídas – como a não incidência a pessoa jurídica domiciliada no Brasil que seja controladora ou que estejam sob controle societário comum; a redução adicional da alíquota de IRPJ, passando a 2,5% ao final de 2 anos, com 10% a mais a partir de 20 mil ao mês; e a retirada da obrigatoriedade de lucro real para alguns segmentos – como imobiliárias, exploração de direitos de voz e imagem, dentre outros. E essas modificações que vão na direção contrária do que foi proposto inicialmente não cessam de surgir a cada semana.
Não é por outra razão que sempre é salutar questionar os defensores das assim chamadas “reformas estruturantes”: quais reformas devem ser feitas, com qual teor detalhadamente? Se for na direção contrária à ideal, melhor que não haja reforma alguma, e deixe-se tudo como está. De todo modo, independentemente da aprovação dessa Reforma da Renda, parece que o próximo governo, qualquer que seja, terá de revisitar novamente esse tema em 2023, com maior oneração na tributação de renda para possibilitar alguma desoneração na tributação indireta.
** Helder Lara Ferreira Filho, 32, é auditor federal de finanças e controle da Secretaria do Tesouro Nacional, mestre em economia pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutorando em economia pela Universidade de Brasília (UnB). E-mail: helder.laferf@gmail.com
** Professor Associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), Pesquisador Nível IB do CNPq e Membro Sênior da Post-Keynesian Economics Society (Reino Unido). E-mail: joreiro@unb.br [50 anos]
Oposição quer reforma tributária com taxação de lucros e dividendos (Huffpost Brasil, 05/08/2019)
06 terça-feira ago 2019
Posted Bernard Appy, José Luis Oreiro
inProposta apoiada por Rodrigo Maia unifica tributos de consumo, e governo foca em transações bancárias.
Os partidos de oposição querem ampliar a reforma tributária em tramitação na Câmara dos Deputados, que voltará do recesso nesta semana. Parlamentares de esquerda querem incluir a taxação de lucros e dividendos na proposta.
Com apoio do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) idealizada pelo economista Bernardo Appy foca no consumo. O texto unifica cinco tributos e será discutido em uma comissão especial da Câmara a partir deste mês.
A equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro também deve apresentar uma proposta que prioriza transações financeiras nos próximos dias, além de mudanças no Imposto de Renda. Há ainda um texto em discussão no Senado e sugestões feitas por empresários.
Considerada a mais consensual, a reforma proposta por Appy cria uma um IVA (Imposto sobre Valor Agregado), que seria chamado de IBS (Imposto de Bens e Serviços). Ele substituiria cinco impostos indiretos que incidem sobre o consumo de bens e serviços: IPI, PIS/PASEP e Cofins (todos federais), ICMS (estadual) e ISS (municipal).
O objetivo é simplificar a cobrança e evitar que um mesmo item seja tributado mais de uma vez. O impacto positivo seria reduzir o tempo e o dinheiro que empresários gastam para conseguir pagar as taxas, o que poderia melhorar a competitividade. A longo prazo, a medida poderia melhorar o crescimento econômico do País.
De acordo com estudo do Banco Mundial divulgado em 2017, as empresas brasileiras são as que mais gastam tempo para pagar seus tributos no mundo. São 1.958 horas, em média, por ano, dedicados a essa tarefa, o equivalente a três meses.
Taxação de lucros e dividendos
A oposição não se opõe à ideia de modo geral, mas defende incluir a taxação de lucros e dividendos. De acordo com a legislação atual, o lucro obtido pelas empresas é tributado, mas a distribuição desses valores aos acionistas na forma de dividendos é isenta de taxação.
“Iremos discutir uma proposta que desburocratize e simplifique a legislação tributária e que penalize menos o consumo e mais o capital improdutivo. Ainda não temos uma proposta consolidada, mas teremos isto já no início dos trabalhos da comissão”, afirmou ao HuffPost Brasil o líder do PDT na Câmara, André Figueiredo (CE).
O PDT tem discutido a proposta com o PSB. Outros partidos de oposição, como o PT e o PSol, devem ser procurados após o texto avançar.
Segundo o líder do PSB, Tadeu Alencar (PE), a PEC pode ser aperfeiçoada para reduzir desigualdades sociais. “Precisaria avançar na regressividade do sistema. Há um ambiente favorável ao diálogo”, afirmou à reportagem. Um dos pontos críticos do modelo atual, a regressividade significa que, proporcionalmente, quem ganha menos paga mais. Isso porque o valor do tributo sobre um bem de consumo, como arroz, por exemplo, é igual para ricos e pobres.
Na avaliação do parlamentar, a simplificação proposta por Appy “tem um elevado diferencial competitivo e cidadão” e está na ordem do dia do País. “A reforma é uma oportunidade de gastar energia para construir um modelo bom para empreender, para os entes federativos e para a população”, completou.
A reforma tributária de Bernardo Appy
Idealizada pelo economista, a PEC 45/2019 foi apresentada na Câmara pelo líder do MDB na Casa, Baleia Rossi (SP). O texto aumenta a transparência da cobrança, mas não tem um impacto direto de redução ou aumento da carga tributária para o consumidor, de modo geral, de acordo com Appy. A mudança, contudo, pode ser benéfica a longo prazo para o cidadão comum.
“Hoje o consumidor está pagando pela carga tributária mas também pela ineficiência do sistema atual. O custo burocrático para pagar imposto no Brasil é o mais alto do mundo. [A reforma proposta] Pode ser positiva para o consumidor porque reduz o custo para as empresas e aumenta a competição”, informa ao HuffPost o Centro de Cidadania Fiscal e Tributarista, instituto bancado por sete empresas: Natura, Huawei do Brasil, Souza Cruz, Votorantim, Braskem, Vale e Ambev.
Além da proximidade com o empresariado, Appy também é ambientado no cenário político. Em 2007, quando trabalhava no ministério da Fazenda com Guido Mantega, no governo Lula, chegou a elaborar uma proposta de reforma similar.
Desde a pré-campanha nas últimas eleições, o economista também se reuniu com os aspirantes ao Palácio do Planalto. Dos cinco candidatos presidenciais mais bem colocados nas pesquisas, só Jair Bolsonaro não mencionou a fusão de impostos entre suas propostas.
Um ponto importante na reforma é a mudança de onde se cobra o tributo, que passaria a ser no estado onde o bem ou serviço é vendido e não mais onde é produzido. A medida poderia acabar com a guerra fiscal, espécie de disputa dos estados ao oferecer descontos no ICMS para atrair empresas.
De acordo com a PEC, o tempo de transição para o novo sistema seria de dez anos. A nova alíquota só será conhecida nessa etapa, segundo o economista. Com a mudança, cada estado e município poderá definir o valor de cobrança, de modo que o imposto sobre o macarrão, por exemplo, pode ser mais barato em Pernambuco do que em Alagoas. Porém é improvável que a diferença seja significativa.
Por outro lado, o imposto sobre diferentes produtos em um mesmo estado seria o mesmo, seja um perfume ou um detergente. A exceção à diferenciação de taxas é prevista pela cobrança de valores mais altos para itens específicos, a fim de dissuadir o consumo, como cigarros.
Impostos e desigualdade social
Quanto ao impacto na desigualdade social, a proposta acaba com desoneração da cesta básica, mas cria uma espécie de “bolsa tributo” para famílias de baixa renda cadastradas em programas sociais. Por meio de um cartão, a pessoa seria reembolsada mensalmente.
Apesar de não considerar medidas como taxação de grandes fortunas incompatível com a PEC, Appy considera a medida ineficaz para aumentar a arrecadação. De acordo com ele, pessoas muito ricas acabam encontrando outras formas de não pagarem essas taxas, como optar por operações no exterior.
Na avaliação do pesquisador José Luis Oreiro, do departamento de economia da Universidade de Brasília (UnB), a proposta em discussão na Câmara é a mais bem fundamentada tecnicamente e têm como principal ponto forte a melhoria da competitividade. “Nossa estrutura atual tem imposto em cascata, cobrado mais de uma vez na cadeia produtiva. A reforma aumenta a competitividade do brasileiro no exterior. Hoje a gente acaba exportando imposto”, afirma.
O impacto para redução da regressividade, contudo, é limitado. “Teria de aumentar o peso dos impostos sobre rendimentos e propriedade e diminuir sobre bens e serviços”, aponta o economista.
Críticas à reforma tributária
A resistência à PEC vem de empresas e setores econômicos que têm benefícios fiscais no modelo atual, uma vez que eles seriam extintos com a reforma. Há também uma preocupação quanto à desindustrialização no Norte e Nordeste.
″Estados mais pobres vão ficar tem desvantagem. Por exemplo, São Paulo tem uma estrutura melhor que a Bahia, mercado consumidor maior, mão de obra mais bem treinada. O que a Bahia podia tentar fazer para atrair uma indústria automobilística é usar a alíquota do ICMS. Se você tira esse instrumento, vai ficar mais difícil a concorrência com outros estados. Isso tem que ser compensado com medidas para desenvolvimento regional”, afirmou Oreiro.
Como uma medida compensatória, seria criado um fundo, de acordo com Appy, por meio de uma lei infraconstitucional. Segundo o economista, nesse novo cenário seria possível elaborar incentivos específicos de acordo com cada estado em ações que incluiriam também atividades de turismo.
Há também críticas à viabilidade da proposta. “Quanto vai ser alíquota? Ele deixou tão aberto. Imagina quem for trabalhar com isso… Estou mandando uma mercadoria para São João de Meriti no Rio de Janeiro. Vai ter de saber quanto é a alíquota pro IVA lá. São quase seis mil municípios no Brasil. Se cada um tiver uma alíquota diferente, vira um caos”, apontou João Eloi Olenike, presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
De acordo com Appy, contudo, isso não ocorreria porque a proposta mantém autonomia da União, estados e municípios para fixar alíquotas, mas a alíquota é a mesma para todas as mercadorias e serviços. Ou seja, se o município baixar o valor, tem de valer para tudo.
Na avaliação de Olenike, nenhuma proposta apresentada é suficientemente abrangente. ”A ideia deveria ser diminuir custo tributário tanto para empresas quanto para cidadãos, reduzir as obrigações acessórias, o número de tributos e o valor das alíquotas, diminuindo a carga tributária e aumentando a base de arrecadação. Significa trazer inadimplentes e sonegadores que não estão pagando em virtude da alta carga”, afirmou à reportagem.
Uma forma de aumentar a base de arrecadação seria reduzir a carga em cima das empresas e pessoas físicas. A medida poderia reduzir a pejotização, por exemplo (contratação de uma pessoa jurídica para a prestação de serviços). “O saldo de quem está devendo dá em torno da arrecadação tributária de um ano, quase R$ 2,5 trilhões”, aponta Olenike.
Hoje a carga tributária é cerca de 35% do PIB no Brasil. Nas contas do presidente do IBPT, o montante chegaria a 60% se fossem incluídos valores hoje relativos à inadimplência, sonegação, pirataria e informalidade.
A reforma de Appy também não impacta diretamente na qualidade de serviços públicos. Segundo indicador do IPBT que mede o retorno dos impostos para população, o Brasil ocupa o pior lugar em um ranking com 30 países com base na carga tributária cobrada e no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). “O dinheiro arrecadado não é aplicado em investimentos que melhorem a qualidade de vida da população. Isso não muda porque a reforma é de arrecadação de tributos e não de gastos [públicos], aponta Olenike.
Caso seja aprovada na comissão especial da Câmara, a PEC 45/2019 precisa do voto de 308 deputados, em dois turnos, para seguir para o Senado. Nos próximos meses, parlamentares e a equipe econômica devem buscar uma fusão das diferentes propostas.
Link da matéria: https://www.huffpostbrasil.com/entry/reforma-tributaria-appy_br_5d32110ce4b004b6adafbecc
Para combater a Desigualdade na distribuição de Renda, a solução é a Reforma Tributária, não a Reforma da Previdência
20 segunda-feira maio 2019
Posted Reforma tributária
inJosé Luis Oreiro (UnB) e Luis Carlos García de Magalhães (IPEA-DF)
Um dos mitos que se formou em torno da Reforma da Previdência é que a mesma irá combater os “privilégios” dos servidores públicos, os quais recebem uma aposentadoria muito superior ao teto e ao valor médio das aposentadorias do RGPS. Dessa maneira, a Reforma da Previdência teria um viés “distributivista”, ao atuar sobre as supostas causas da péssima distribuição de renda no Brasil.
Gráfico 1 – Distribuição acumulada da renda bruta (RB2) por 0,1% dos contribuintes do 100º centil e alíquota efetiva do IRPF, 2015.
(Em milhões R$ e %)
Fonte: DIRF do ano calendário 2015 agrupadas por centil – Centro de Estudos Tributário-SRF
Obs.: RB2 é a renda tributável bruta mais a renda de titular/sócios de micro e pequena empresa mais lucros e dividendos.
Isso não passa de um mito por diversas razões. Em primeiro lugar, os servidores que ingressaram no serviço público antes de 2013 não estão sujeitos ao teto do RGPS porque pagam uma contribuição de 11% sobre a INTEGRALIDADE DOS SEUS VENCIMENTOS. Assim o servidor que tem um salário superior ao teto do RGPS tem um desconto em folha que é proporcional ao seu salário integral, logo nada mais justo que possuir uma aposentadoria é proporcional ao seu esforço de contribuição, ao invés de estar limitada pelo teto do RGPS. Em segundo lugar, o Governo da Presidente Dilma Rouseff fez em 2013 a reforma da previdência dos servidores públicos, instituindo que TODOS os servidores que ingressarem depois da reforma teriam seus benefícios limitados ao teto do RGPS, podendo contribuir para um fundo estatal de previdência – o FUNPRESP – sobre o valor que exceder o teto do RGPS. Em português bem claro, a reforma da previdência dos servidores públicos JÁ FOI FEITA, igualando os novos servidores com os trabalhadores do setor privado, e instituindo um REGIME DE CAPITALIZAÇÃO de natureza complementar e voluntária para TODOS os servidores ingressados a partir de 2013. Também não é verdade que os servidores públicos possam se aposentar com 54 anos ou menos, como se afirma. A legislação em vigor hoje estabelece uma IDADE MÍNIMA DE 60 ANOS para a aposentadoria de TODOS OS servidores públicos da União.
Mas voltemos a questão da distribuição de renda. O gráfico 1 acima mostra a alíquota efetivamente paga de imposto de renda pelo 0,1% dos contribuintes mais ricos do Brasil. Esse grupo é constituído por um universo de 142.521 pessoas no ano de 2015. Esse grupo controla 14,4% da renda total dos brasileiros, mas contribui com apenas 9% da receita do IRPF (Imposto de Renda de Pessoas Físicas), como podemos observar na Tabela 1 abaixo. A figura 1 mostra a olho nu que a medida que a renda aumenta nesse extrato superior da distribuição de renda, a alíquota efetiva do imposto de renda diminui progressivamente, passando de 11% da renda no limite inferior do grupo, para apenas 3% da renda, no limite superior. Em outras palavras, os hiper-ricos brasileiros pagam apenas 3% da sua renda na forma de IRPF; ao passo que a alíquota média efetiva do IRPF dos servidores públicos varia entre 14 a 19% a depender do número de dependentes e dos gastos com educação e saúde deduzidos do imposto a pagar.
Tabela 1 – Participação dos grupos de renda mais ricos na renda total e tributaria, 2015.
Fonte: Morgan (2017) e DIRF – Centro de Estudos Tributário/SRF.
Obs.: dados de Morgan (2017) se referem a renda da PNAD e IRPF corrigidos pela Renda Contas Nacionais-IBGE
Para reduzir a desigualdade na distribuição de renda é preciso, portanto, uma REFORMA TRIBUTÁRIA que reinstitua a cobrança de Imposto de Renda sobre lucros e dividendos distribuídos, pois como podemos ver no gráfico 2 abaixo, a maior fonte de isenção de pagamento de imposto de renda é precisamente “lucros e dividendos distribuídos”.
Gráfico 2- Rendimentos isentos e não tributáveis, 2015.
(Em milhões R$ )
Fonte: Grandes Números do DIRF 2016 (ano calendário de 2015) – Centro de Estudos Tributário-SRF .
PEC da reforma tributária mantém regressividade e peso sobre consumo (Diário de Comércio e Indústria – 25/09/2017)
25 segunda-feira set 2017
Posted Ajuste fiscal, Debate macroeconômico, Mídia, Opinião, Oreiro
inO atual projeto de reforma tributária mantém a oneração maior sobre bens e serviços e não resolve deficiências na cobrança sobre a renda. É o que afirmam especialistas entrevistados pelo DCI.
A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB), que já está no Congresso Nacional, é elogiada pelo potencial de reduzir distorções do regime tributário, mas não alteraria o caráter regressivo do sistema. Ou seja, se a PEC for aprovada, os pobres vão continuar pagando mais impostos, proporcionalmente, do que os ricos.
“Essa PEC tem um lado positivo”, diz Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, “ela tornaria o sistema tributário mais equilibrado, onerando de forma parecida os diferentes setores da economia e regiões do País”. Segundo ele, esse aspecto é “muito favorável” para o ganho de produtividade e para o crescimento econômico.
Entretanto, a proposta não reduz a tributação sobre o consumo e as disparidades na cobrança sobre a renda, fatores que poderiam ser alterados sem mudanças na Constituição. “Não é necessária uma PEC para resolver esse assunto, mas ele também não foi pautado de outra forma”, diz o entrevistado.
Em 2015, a tributação sobre bens e serviços respondeu por 18,8% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. A parcela é superior à registrada em todos os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), cuja cobrança média fica perto dos 10% do PIB.
Professor de economia da Universidade de Brasilia (UnB) , José Luis Oreiro, afirma que o excesso de impostos indiretos sobre o consumo e a produção de bens é prejudicial para os mais pobres. “Ao comprar um litro de leite, por exemplo, uma pessoa que ganha um salário mínimo paga o mesmo tributo que um milionário”, afirma ele.
A respeito da cobrança sobre a renda, ele diz que grande parte dos trabalhadores mais ricos é contratada como pessoa jurídica. “É a chamada pejotização”. Dessa forma, esses indivíduos pagam uma alíquota mais baixa do que a que incide no regime convencional.
A ausência de um tributo sobre lucros e dividendos distribuídos e a cobrança inexpressiva sobre doações e heranças também foram citadas por Oreiro como fatores que distorcem a tributação no País.
Alta da desigualdade
Um estudo recente feito pelo economista Marc Morgan mostra que a renda média da população mais rica, que representa 0,1% das pessoas no Brasil, cresceu 55% entre 2001 e 2015, enquanto que o ganho dos 50% mais pobres avançou 29% no mesmo período.
Ao usar dados da Receita Federal, que antes não eram divulgados, Morgan indica que a desigualdade cresceu mesmo com o avanço de programas sociais, como o Bolsa Família. De acordo com o levantamento, a renda obtida pelos 10% mais ricos chegou a 55% do rendimento total, parcela bastante superior à dos Estados Unidos, da França e da China.
Entre os motivos desse aumento na desigualdade, Morgan cita o desenho do regime tributário brasileiro. Ele menciona, por exemplo, a ausência de um imposto sobre dividendos, extinto na década de 1990. “Isso provavelmente beneficiou os indivíduos mais ricos.”
PEC da reforma
A proposta de Hauly busca reduzir o número de impostos sem elevar a carga tributária, que representa cerca de 35% do Produto Interno Bruto (PIB). Vários tributos, como o ICMS, o ISS e o IPI, seriam substituídos pelo Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS), adotando um desenho semelhante ao que é usado em países europeus. Também seria criado o Imposto Seletivo, que incidiria sobre alguns setores específicos.
Na visão de Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, este segundo imposto pode ter um impacto prejudicial para a economia. “Ele vai incidir sobre insumos importantes, como a gasolina e a eletricidade, e pode criar distorções alocativas”.
Sobre a regressividade do sistema tributário, ele pondera que nem toda medida que torna o regime mais progressivo é positiva. “Às vezes, o investimento público é mais eficiente que a desoneração para reduzir a desigualdade”. Nesse sentido, diz ele, o Bolsa-Família é mais eficaz que o corte de impostos sobre a cesta básica.