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As importações brasileiras de diesel e petróleo russos estão atingindo níveis recordes, e o governo não pensa em impor sanções a Moscou. Uma reportagem de Brasília

András Szigetvari

18. April 2024, 06:00

Link: https://www.derstandard.at/story/3000000216193/blick-aus-brasilien-der-krieg-in-der-ukraine-der-interessiert-hier-niemanden

Entre o Ocidente e a Rússia, a questão é clara. Desde o ataque à Ucrânia, países ocidentais, que incluem Austrália, Canadá e Japão, além da UE e dos EUA, impuseram uma série de sanções contra a Rússia. A exportação de bens de tecnologia foi proibida, os ativos do Banco Central russo foram congelados e muitos países não compram mais petróleo e gás da Rússia.

No entanto, de Washington a Bruxelas e Tóquio, rapidamente ficou claro que o Ocidente representa apenas uma fração da comunidade internacional. A maioria dos países não viu e não vê razão para evitar a Rússia, a guerra ou não. O papel mais importante e interessante nisso é provavelmente desempenhado pela Índia e pelo Brasil simplesmente por causa de seu tamanho (a China está muito mais próxima da Rússia de qualquer maneira). Ambos os países querem manter boas relações com os EUA e a UE, mas não têm nada a ver com sanções. Os laços estreitos da Índia com a Rússia já foram mencionados aqui.

Nesta semana, visitantes da Áustria puderam conhecer a abordagem do país à guerra na Europa como parte de uma viagem de delegação ao Brasil. O ministro da Economia, Martin Kocher (ÖVP), está atualmente viajando pelo Brasil e pela Argentina e fazendo campanha por relações econômicas mais estreitas com a Áustria. À margem das conversas, intelectuais, economistas e empresários também discutiram a relação com a Rússia.

4600 Por cento mais

Recentemente, isso se tornou muito mais estreito, pelo menos no que diz respeito aos laços econômicos. Rússia e Brasil até agora estão intimamente ligados, especialmente no negócio agrícola: a Rússia exportou fertilizantes para o Brasil, enquanto carne, soja e açúcar foram devolvidos do país sul-americano.

No ano passado, no entanto, as exportações de petróleo e diesel da Rússia para o Brasil subiram no teto. Só o volume de exportações de diesel aumentou 4.600%, o de petróleo 300%. O Brasil ultrapassou a Turquia como o maior importador de diesel da Rússia. 5,3 mil milhões de dólares (cinco mil milhões de euros) fluíram de Brasília para o Kremlin no ano passado, contra apenas 1,1 mil milhões no ano anterior. Assim, o Brasil substituiu parcialmente a UE: na Europa, as importações de diesel da Rússia são proibidas, assim como a importação de petróleo de oleoduto russo.

“Por um lado, o Brasil quer desempenhar o papel de mediador entre as partes beligerantes”, diz José Luís da Costa Oreiro, economista da Universidade de Brasília. “Um intermediário não pode tomar partido, isso é óbvio.” Acima de tudo, porém, o Brasil está preocupado com interesses econômicos tangíveis. Desde que a indústria estatal de fertilizantes foi fechada na década de 1990 como parte de uma onda de liberalização, o Brasil vem importando seus fertilizantes da Rússia. Isso é extremamente importante para o Brasil com sua grande agricultura, com o setor contribuindo com cerca de sete por cento para a produção econômica. Em comparação, na Áustria é de cerca de um por cento.

Agora, o diesel e o óleo estão sendo adicionados, já que a Rússia vende ambos com descontos, o que economiza dinheiro das famílias e empresas brasileiras. Mas isso não leva a nenhuma discussão no país, afinal, esses bilhões estão financiando a guerra de Putin? “Ninguém aqui está interessado na guerra na Ucrânia. É muito longe para as pessoas”, diz Costa Oreiro. O que é muito mais emocional, diz ele, é a guerra na Faixa de Gaza. Posfácio: “A Ucrânia pode se defender, mas o povo de Gaza não”.

O mais importante do ponto de vista do Brasil é que o país ainda está atrasado em relação aos países industrializados. Nas taxas de crescimento atuais, o Brasil não estará ao nível de Portugal daqui a 50 anos. Para ilustrar: a produção econômica per capita do Brasil gira em torno de 17 mil dólares, na Áustria gira em torno de 70 mil – esse cálculo leva em conta o poder de compra diferenciado.

Agir sem dar palestras

Um representante da Comissão Europeia no país sul-americano confirma essa visão: o Brasil se vê como um país em ascensão, que não quer se amarrar a nenhum lado e quer se beneficiar economicamente da Rússia e do Ocidente. Os ensinamentos ocidentais também são de pouca ajuda. A UE está a tentar promover as suas posições trazendo delegações de pequenos países ao Brasil, por exemplo dos Estados Bálticos, para relatar as suas experiências com a ameaça representada pela Rússia.

O quanto de impressão isso deixa permanece questionável. O chefe de Estado do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, convidou o presidente russo, Vladimir Putin, várias vezes ao longo do ano passado, apesar de um mandado de prisão contra Putin do Tribunal Penal Internacional de Haia, do qual o Brasil é membro.

Também é perceptível entre os representantes da indústria que não há medo de contato com a Rússia. Os laços entre Rússia e Brasil se dão principalmente por meio de fóruns no âmbito do grupo BRICS, explica Frederico Lamego, representante de alto escalão da Confederação Brasileira dos Industriais (CNI). Além da Rússia e do Brasil, Índia, China e África do Sul também são membros dessa aliança frouxa, com Irã, Etiópia, Egito e Emirados se juntando em 2024.

Os países do Brics trabalham juntos em grupos temáticos sobre questões econômicas, diz Lamego, há grupos sobre agricultura, aviação, educação e financiamento. Aqui, as empresas trocam ideias diretamente e trabalham em uma cooperação mais intensa. A Rússia lidera atualmente os grupos que lidam com questões econômicas. Lamego diz, no entanto, que a importância da Rússia para o Brasil não deve ser superestimada, e que as relações com a China são muito mais importantes para a indústria, por exemplo. Mas isso fica claro depois de alguns dias no país: também não se deve subestimar o fator russo. (András Szigetvari de Brasília, 18.4.2024)