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José Luis Oreiro

~ Economia, Opinião e Atualidades

José Luis Oreiro

Arquivos de Categoria: Taxa real de câmbio

Taxa de Lucro, Acumulação de Capital e Crescimento Econômico: comentários ao artigo do Professor Adalmir Marquetti

23 quarta-feira fev 2022

Posted by jlcoreiro in Acumulação de Capital, Adalmir Marquetti, Eduardo Costa Pinto, Macroeconomia estruturalista do desenvolvimento, novo-desenvolvimentismo, Taxa de Lucro, Taxa real de câmbio, Uncategorized

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A crise da economia brasileira, Adalmir Marquetti, Debate Macroeconômico, Eduardo Costa Pinto, José Luis Oreiro, novo-desenvolvimentismo, Taxa de lucro e acumulação de capital

Uma dos princípios fundamentais da economia política clássica (e marxista) é que o ritmo de acumulação de capital – e, por tabela, o ritmo de crescimento econômico – é determinado pelo nível da taxa de lucro. Isso porque a economia política clássica, ao assumir a validade da Lei de Say, admite que o investimento é determinado pela poupança e esta se origina, fundamentalmente, da fração poupada dos lucros. Dessa forma, a relação entre a taxa de lucro e a taxa de crescimento do estoque de capital pode ser apresentada pela assim denominada “equação de Cambridge” dada por:

g = r/sp (1)

Onde: g é a taxa de crescimento do estoque de capital, r é a taxa de lucro e sp é a fração poupada dos lucros.

A taxa de lucro, por sua vez, é o resultado do produto entre três variáveis, a saber: a produtividade potencial do capital (v=pYp/pkK), o grau de utilização da capacidade produtiva (u= Y/Yp) e a participação dos lucros na renda nacional (m=P/Y).

r = v.u.m (2)

Onde: Yp é o produto potencial, K é o estoque de capital, Y é o nível efetivo de produto, P é a massa de lucros), p é o deflator implícito do PIB, pk é o índice de preços de bens de capital.

Nesse contexto, a técnica de produção, o nível de utilização da capacidade produtiva e a distribuição de renda entre salários e lucros afetam a taxa de lucro e, por conseguinte, o nível de poupança e investimento da economia com reflexos sobre o ritmo de acumulação de capital e de criação de renda e de emprego da economia

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

Recentemente o grupo de pesquisa “macroeconomia estruturalista do desenvolvimento” realizou um webinário sobre o comportamento de curto e longo prazo sobre a taxa de lucro no Brasil (https://www.youtube.com/watch?v=L913Rh-VogM&t=238s). Participaram do debate como expositores os professores Adalmir Marquetti (PUC/RS), Carmem Feijó (UFF) e Eduardo Costa Pinto (IE/UFRJ).

O professor Marquetti apresentou um estudo preliminar denominado “Uma interpretação da economia brasileira a partir da taxa de lucro: 1950-2020” escrito em co-autoria com Eduardo Maldonado Filho, Alessandro Miebach e Henrique Morrone, todos integrantes do programa de pós-graduação em economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

O estudo é inédito no sentido de apresentar o comportamento da taxa de lucro no Brasil no período 1950-2020. Conforme podemos verificar na figura 2 abaixo, retirada de Marquetti el al (2022), a taxa de lucro no Brasil apresenta uma tendência nítida de queda a partir de 1975, quando se encontrava acima de 40% ao ano, se estabilizando depois de 1995 em torno de 20% a.a.

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

Essa redução da taxa de lucro na economia brasileira esteve associada a uma forte redução da taxa de acumulação de capital e da taxa de crescimento do PIB brasileiro no início da década de 1980 como podemos observar na figura abaixo, extraída do artigo de Marquetti el al (2022)

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

A Existência de uma forte correlação entre a taxa de lucro e a taxa de acumulação de capital também pode ser visualizada por intermédio da figura abaixo:

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

Uma primeira questão teórica que se coloca a partir da inspeção da figura acima é qual a relação de causalidade entre taxa de lucro e taxa de acumulação de capital. Marquetti el al (2022) assumem a posição Marxista de que a taxa de lucro é a variável explicativa ao passo que a taxa de acumulação de capital é variável dependente. Dessa forma, a desaceleração do ritmo de acumulação de capital no Brasil no início dos anos 1980 seria decorrência da queda da taxa de lucro, resultado esse consistente com a lei de tendência a queda da taxa de lucro em Marx. Essa relação de causalidade, no entanto, não é uma unanimidade entre os economistas heterodoxos. Para os economistas da escola de Cambridge como Kaldor (1956, 1957), Pasinetti (1961-1962) e Robinson (1962) a relação de causalidade é inversa : a taxa de acumulação de capital – determinada pelo investimento requerido para o crescimento balanceado – determina a taxa de lucro por intermédio de mudanças na distribuição de renda entre salários e lucros (a esse respeito ver Oreiro, 2016, capítulo 3). Aqui nos defrontamos com o primeiro ponto teórico relevante no debate sobre a relação entre a taxa de lucro e a taxa de acumulação de capital, a saber qual a relação de causalidade entre as duas variáveis.

Aceitando a hipótese de Marquetti et all (2020) de que a relação de causalidade é da taxa de lucro para a taxa de acumulação de capital, o próximo passo é determinar os fatores que explicam a queda da taxa de lucro no Brasil no período 1980-1995. Segundo os autores o principal determinante da queda da taxa de lucro no Brasil foi a redução da produtividade do capital, pois a participação dos lucros na renda nacional apresentou um comportamento cíclico em torno de uma tendência constante de longo-prazo de 48,7%, e o grau de utilização da capacidade produtiva apresenta uma queda no período 1980-1995, a qual é quase que inteiramente revertida no período 2000-2010.

A queda da produtividade potencial do capital, por seu turno, foi causada pelo aumento do preço relativo dos bens de capital (p/Pk) e por uma queda da produtividade real do capital (Yp/K) no período 1950-1980. De 1990 tanto o preço relativo dos bens de capital como a produtividade real do capital permanecem relativamente estáveis, o que contribuiu para garantir uma estabilidade da taxa de lucro até 2010.

Esses resultados parecem apontar que a desaceleração do crescimento de longo-prazo da economia brasileira estaria associada a tendência secular de queda da taxa de lucro, a qual é um resultado inexorável do processo de industrialização da economia brasileira no período 1950-1980 o qual é necessariamente capital intensivo, ou seja, atua no sentido de diminuir a produtividade real do capital. Contudo, ainda que se aceite a tese de que o processo de industrialização leve a um aumento inexorável da quantidade de capital tecnicamente necessária para a produção de uma unidade de produto (ou seja, gere uma redução da produtividade real do capital), a ampliação da escala de produção das indústrias produtoras de bens de capital deveria gerar, no longo-prazo, uma redução do preço relativo dos bens de capital devido a existência de retornos crescentes de escala nesse tipo de setor. Dessa forma, seria de se esperar que a redução da produtividade real do capital fosse ao menos parcialmente compensada pela queda do preço relativo dos bens de capital, algo que não ocorreu na economia brasileira. Minha hipótese para explicar esse “puzzle” é a persistência do modelo de industrialização por substituição de importações no Brasil nos anos 1970, época que o mesmo deveria ter sido substituído por um modelo de promoção de exportações segundo a estilização de Kaldor (1967) sobre as etapas do desenvolvimento industrial. A promoção de exportações de manufaturados foi o modelo de desenvolvimento industrial adotado pelos países Asiáticos já em meados da década de 1960, ao passo que os países da América Latina insistiram no modelo de “desarollo hacia dentro”. Está claro que um elemento importante para a adoção de um modelo de promoção de exportações é a manutenção de uma taxa de câmbio competitiva, algo que o Brasil tal como os demais países da América Latina sistematicamente se recusaram a fazer devido ao “populismo cambial”, adotado tanto por governos de direita como de esquerda. Como a indústria de transformação é o locus por excelência dos retornos crescentes de escala a obtenção de mercados externos é condição de vida ou morte para a indústria de qualquer país em desenvolvimento. Infelizmente o Brasil fracassou nesse teste. Talvez em definitivo.

Uma nova inspeção da figura 11 mostra que a taxa de lucro no Brasil apresentou um movimento de queda entre 2011 e 2015, período que coincide com o governo da Presidente Dilma Rouseff. Ao contrário do movimento de longo-prazo da taxa de lucro, largamente explicado pela queda da produtividade potencial do capital, a queda da taxa de lucro no período 2011-2015 foi principalmente causada pela queda da participação dos lucros na renda nacional, a qual passou de 50,7% em 2004 para 41,1% em 2016, uma redução de aproximadamente 10 p.p.

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

Até 2010 o efeito negativo da queda da participação dos lucros na renda sobre a taxa de lucro foi compensada pelo aumento do grau de utilização da capacidade produtiva, configurando assim um regime de demanda do tipo wage-led.

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

De 2011 em diante, contudo, a taxa de lucro das empresas não-financeiras começa a apresentar uma nítida tendência de queda conforme estudo elaborado pelo CEMEC em 2015. Em 2014 a taxa de lucro sobre o capital próprio dessas empresas se encontra em torno de 5,5%, patamar inferior a taxa de juros livre de risco, ou seja, a taxa Selic. Nesse contexto, a acumulação de capital é inviável e o resultado não poderia ser outro: um colapso da formação bruta de capital fixo ao longo do segundo, terceiro e quarto trimestre de 2014. Devido a queda da demanda de investimento a economia brasileira entra em recessão já no segundo semestre de 2014.

Fonte: IPEADATA.

O comportamento da taxa de lucro no Brasil no período 2011-2015 mostra claramente os limites do modelo wage-led ou “social-desenvolvimentista”: ainda que o aumento da participação dos salários na renda possa aumentar a demanda agregada e, com ela, o nível de utilização da capacidade produtiva, existem limites econômicos e físicos ao aumento contínuo do grau de utilização da capacidade no longo-prazo (o grau de utilização da capacidade não pode permanecer sistematicamente acima do grau normal de utilização da capacidade produtiva), de forma que, mais cedo ou mais tarde, a taxa de lucro irá cair em função de uma redução da participação dos lucros na renda a não ser que ocorra um aumento concomitante da produtividade potencial do capital, o que requer uma redução do preço relativo dos bens de capital e, portanto, um aumento da escala de produção da indústria de equipamento de capital.

Outra forma de buscar uma recomposição da taxa de lucro é por intermédio da adoção de políticas que aumentem a produtividade real do capital físico. Aqui creio que o investimento em infraestrutura é fundamental. Como é ressaltado pela Teoria Clássica do Desenvolvimento Econômico (Ros, 2013, capítulos 7 e 8) existem externalidades tecnológicas e pecuniárias no investimento em capital físico. Dessa forma, o aumento do investimento público em infraestrutura contribui para aumentar a produtividade do investimento privado e, portanto, a própria taxa de lucro. Nesse contexto, a relação entre taxa de lucro e estoque de capital pode ser positiva, ao invés de negativa, de maneira que a redução da taxa de lucro pode resultar da insuficiência do investimento em infraestrutura.

Segundo o professor Eduardo Pinto, que também participou do webinário, o impeachment da Presidente Dilma Rouseff em 2016 viabilizou uma recuperação parcial da taxa de lucro por intermédio da adoção da “agenda de reformas” como a reforma trabalhista e mudanças regulatórias no setor de petróleo e gás, bem como na fiscalização ambiental as quais permitiram uma recuperação da participação dos lucros na renda conforme podemos observar na figura abaixo.

Observação: Figura reproduzida da Marquetti el al (2022).

Além dos elementos citados pelo Professor Eduardo Pinto eu acrescentaria que a grande recessão de 2014-2016 ao produzir um aumento permanente da taxa de desemprego viabilizou, de um lado, a redução dos salários reais, permitindo assim um aumento das margens de lucro; por outro lado, promoveu um processo de concentração e centralização do capital (leia-se falência de algumas empresas e fusões e aquisições, o que aumentou o poder de monopólio das empresas que sobreviveram a recessão). Esse ultimo ponto foi extensamente apresentado pelo professor Eduardo Pinto em sua apresentação no webinário.

Dito isso, a economia brasileira se encontra numa encruzilhada. Para acelerar o crescimento econômico é necessário recuperar a lucratividade das empresas não-financeiras, principalmente no setor manufatureiro, o qual é mais intensivo em bens de capital. A retomada do projeto neoliberal no Brasil com o documento “ponte para o futuro” e o governo de Michel Temer se propôs a fazer isso por intermédio de uma redução do “custo do trabalho” e dos custos regulatórios. Embora a taxa de lucro tenha, de fato, aumentado, não se observou uma aceleração do ritmo de acumulação de capital, o qual se encontra no nível mais baixo desde 1950. Por outro lado, a taxa de desemprego continua no patamar de dois dígitos e o tecido social brasileiro apresenta sinais nítidos de esgarçamento devido a continuidade da estagnação econômica, agravada a partir de 2021 pela aceleração da inflação. Isso posto o projeto neoliberal no Brasil é politicamente insustentável no médio e longo-prazo, e talvez até mesmo no curto-prazo.

A única saída politica e economicamente possível é um pacto social que forneça as condições políticas necessárias para a implantação de um novo-desenvolvimentismo, entendido aqui como um conjunto de políticas que tem por objetivo acelerar o ritmo de acumulação de capital da economia brasileira ao mesmo tempo em que garante que os frutos do progresso econômico sejam apropriados principalmente pelos trabalhadores e pelas camadas mais pobres da população. Essas políticas envolvem necessariamente o aumento do investimento público, o incentivo a reindustrialização por intermédio da inserção da indústria brasileira nos mercados internacionais de produtos manufaturados e o fortalecimento dos sindicatos como forma de garantir o crescimento sustentável dos salários reais no longo-prazo. A competitividade extra-preço das exportações de manufaturados brasileiras terá que ser estimulada por políticas de inovação, viabilizadas por um aumento significativo dos investimentos públicos e privados em Ciência e Tecnologia; combinadas com um aumento dos gastos com educação principalmente a nível do ensino médio, o qual é historicamente a grande deficiência da educação no Brasil. Também será necessário adotar uma taxa de câmbio competitiva como política de Estado, o que exigirá mudanças na institucionalidade da condução da política monetária e a adoção de controles a entrada e saída de capitais do Brasil. Tais políticas são, claramente, contrárias ao interesse das instituições financeiras brasileiras, as que mais se beneficiaram da reviravolta neoliberal ocorrida em 2016. Cabe ao próximo presidente da República entender a natureza do nó górdio da economia brasileira e exercer suas habilidades políticas para desata-lo.

Referências

KALDOR, N. (1967). Strategic Factors in Economic Development. Ithaca: New York State School of Industrial and Labor Relations, Cornell University.

KALDOR, N. (1957). “A Model of Economic Growth”. Economic Journal, 67.

KALDOR, N. (1956). “Alternative Theories of Distribution”. Review of Economic Studies, 23, pp. 83-100.

Marquetti, A; Maldonado Filho, E; Miebach, A; Morrone, H. (2022). “Uma interpretação da economia brasileira a partir da taxa de lucro: 1950-2022”. Mimeo.

OREIRO, J.L. (2016). Macroeconomia do Desenvolvimento: uma perspectiva Keynesiana. LTC Editora: Rio de Janeiro.

PASINETTI, L. (1961-1962). “The rate of profit and income distribution in relation to the rate of economic growth”. Review of Economic Studies, vol. 29, no.4.

ROBINSON, J. (1962). Essays in the Theory of Economic Growth. Macmillan: Londres.

Ros, J. (2013). Rethinking Economic Development, Growth and Institutions. Oxford Economic Press: Oxford

Artigo Publicado na PSL Quarterly Review

30 quinta-feira abr 2020

Posted by jlcoreiro in Desindustrialização, Estratégias de Desenvolvimento, Taxa real de câmbio

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Câmbio e crescimento, Taxa real de câmbio

Manufacturing, economic growth, and real exchange rate: Empirical evidence in panel data and input-output multipliers

Luciano Ferreira Gabriel, Luiz Carlos De Santana Ribeiro, Frederico Gonzaga Jayme Jr., José Luis Oreiro
Link para o artigo:
https://ojs.uniroma1.it/index.php/PSLQuarterlyReview/article/view/15478

 

Abstract

This paper investigates the effects of manufacturing and of the real exchange rate (RER) on real per capita income growth. We use dynamic panel models and the calculation of output and employment multipliers for a diversified sample of countries from 1990 to 2011. Three important results can be highlighted. First, we provide new evidence that manufacturing is the most important tradable sector for achieving greater real per capita income growth for developing countries. Second, the greater a country’s gap in relation to the technological frontier, the greater the positive effect of an undervalued RER on the real per capita incomegrowth rate. Finally, the manufacturing industry’s output multipliers and employment multipliers in the developing countries are higher than those in in developed ones, in all years analyzed.

JEL codes: F43, L16, R15

Keywords

Manufacturing; real exchange rate; economic growth; input-output multipliers

Sobre a tal da restrição externa ….

06 sexta-feira dez 2019

Posted by jlcoreiro in Desenvolvimento econômico, Taxa real de câmbio

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aprendizes de mainstream, Modelo de Thirwall, Restrição externa

 

Recentemente alguns aprendizes da economia mainstream criticaram meu post sobre o General Restrição Externa (https://jlcoreiro.wordpress.com/2019/11/19/o-general-restricao-externa-se-aquece-para-entrar-em-campo/) argumentando de que eu teria usado um caso particular do modelo de Thirwall, no qual a parte da equação de crescimento com restrição de balanço de pagamentos referente ao impacto da variação da taxa real de câmbio sobre a taxa de crescimento das exportações e das importações é excluída da forma final da “lei de Thirwall”. Em tais condições a taxa de crescimento compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos seria dada apenas pela razão entre as elasticidades renda das exportações e das importações multiplicada pela taxa de crescimento da renda do resto do mundo. Como países primário-exportadores como, por exemplo, o Brasil tem elasticidade renda das exportações baixa e elasticidade renda das importações alta, então a taxa de crescimento compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos seria inferior a taxa de crescimento da renda do resto do mundo. Nesse contexto, a restrição externa seria o grande entrave a aceleração do crescimento da economia brasileira nos próximos anos.

O problema com esse resultado, segundo os aprendizes em consideração, é que como o Brasil tem um regime de câmbio flutuante; então não seria correto desconsiderar o segundo termo da equação de Thirwall. Isso porque no caso em que a soma dos módulos das elasticidades preço das exportações e das importações for superior a um; então uma desvalorização da taxa real de câmbio irá estimular o crescimento das exportações e uma redução do crescimento das importações, produzindo assim um relaxamento da restrição externa. Dessa forma, continuam os aprendizes, meu raciocínio sobre a restrição externa estaria baseado implicitamente na hipótese de que o Brasil possui um regime de câmbio NOMINAL fixo.

Creio que os aprendizes de economista mainstream me proporcionaram uma oportunidade única de lhes dar uma aula, totalmente gratuita, sobre o modelo de Thirwall e sobre o meu próprio pensamento sobre o assunto em questão.

Então vamos aos erros na argumentação dos aprendizes.

1 – A parte que se refere a variação da taxa de câmbio real é suprimida do formato final do modelo de Thirwall porque ela se refere a taxa de variação da taxa real de câmbio, não ao nível da taxa real de câmbio. Ora numa trajetória de crescimento balanceado ou de steady-state (termo que eles supostamente devem entender) não é possível que a taxa de variação da taxa real de câmbio seja diferente de zero, do contrário a taxa real de câmbio irá para infinito ou para zero no longo-prazo. Em qualquer uma das duas situações a economia em questão chegaria de forma assintótica a um estado economicamente inviável. Portanto, se queremos falar de crescimento de longo-prazo (e é sobre isso o que trata o modelo de thirwall) temos que supor que a taxa de variação da taxa real de câmbio é igual a zero, ou seja, que a taxa real de câmbio possui algum valor de equilíbrio de longo-prazo. O Modelo de Thirwall deixa em aberto qual seria o nível de equilíbrio de longo-prazo da taxa real de câmbio. Esse assunto é tratado no livro “Developmental macroeconomics: new developmentalism as a growth strategy” que escrevi com o Bresser e o Nelson Marconi e que foi publicado pela Routledge em 2015. Sugiro a leitura.

2 – No curto e médio prazo, contudo, a taxa real de câmbio pode variar em função de (i) variação da taxa nominal de câmbio e (ii) diferencial entre a inflação doméstica e a internacional. Mas o efeito da variação da taxa real de câmbio sobre a taxa de crescimento das exportações e das importações – e, portanto, sobre o saldo da balança comercial – vai depender da soma dos módulos das elasticidades preço das exportações e das importações. Se a soma das elasticidades for menor do que um, então uma desvalorização da taxa real de câmbio irá reduzir a taxa de crescimento que é compatível com o equilíbrio do balanço de pagamentos, ou seja, a desvalorização cambial ira apertar a restrição externa, ao invés de afrouxa-la. Ora produtos primários tem baixa elasticidade preço de demanda, razão pela qual a assim chamada condição de Marhall-Lerner não é atendida para países primário exportadores. Diga-se de passagem essa foi a razão pela qual Prebish e Furtado sempre acharam que a desvalorização do câmbio não seria um instrumento de política econômica adequada para enfrentar a restrição externa, a qual exigia uma mudança estrutural na economia por intermédio da industrialização. Daqui se segue que a recente desvalorização da taxa nominal de câmbio no Brasil, caso se traduza em desvalorização do câmbio real – o que vai depender do comportamento da taxa de inflação – poderá apertar ao invés de afrouxar a restrição externa da economia brasileira. 

3 – As elasticidades renda das exportações e das importações podem ser afetadas pelo nível (não pela taxa de variação) da taxa real de câmbio. Mas esse é um resultado que pode ocorrer no longo prazo se e quando (i) a taxa real de câmbio permanecer por um período de tempo suficientemente longo num patamar competitivo e estável de forma a mudar as expectativas dos empresários a respeito do valor de longo prazo da taxa de câmbio e (ii) a estrutura produtiva da economia e a pauta de exportações passarem por um processo de mudança estrutural, aumentando a participação da indústria de transformação no valor adicionado e das exportações de manufaturados na pauta de exportações. Como se trata de um processo de mudança estrutural, segue-se que mesmo que a taxa real de câmbio fosse levada instantaneamente para o seu valor de equilíbrio de longo prazo (a taxa de câmbio de equilíbrio industrial, ver Oreiro e Martins, 2019) levará anos até que os resultados esperados apareçam em termos de afrouxamento da restrição externa. Esse ponto está adequadamente tratado no meu post https://jlcoreiro.wordpress.com/2019/08/07/o-novo-desenvolvimentismo-nao-e-apenas-o-cambio-competitivo/.

Em suma, minha argumentação não se baseia em supor um regime de câmbio nominal fixo. Parece que os aprendizes da economia mainstrean mais uma vez usaram o esquema de retórica sobejamente conhecido de construir um espantalho, para então ataca-lo. Coube-lhes o destino do Almirante Edward Vernon derrotado por Blas de Lezo na batalha de Cartagena de Indias. Citando o grande Blas de Lezo “Vinieran com la arrogância de siempre, fueram derrotados com los métodos de siempre”

Referências

Oreiro, J.L; Martins da Silva, K. (2019). A new developmentalist model of strutural change, economic growth and middle-income trap”. Working Paper 1920, Post Keynesian Economics Society.

 

 

Dr. Geninho e o Câmbio

25 sexta-feira jan 2019

Posted by jlcoreiro in Debate macroeconômico, Dr. Geninho, Taxa real de câmbio

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Dr. Geninho passando vergonha, novo-desenvolvimentismo

A vida de Dr. Geninho, “o grande”, tem sido muito monótona desde que o PT foi desalojado do governo federal. Na era de ouro petista, quando a pasta da fazenda era capitaneada por Guido Mantega, tendo Arno Augustin como seu mago da “contabilidade criativa”; Dr. Geninho poderia escrever seus artigos de qualidade duvidosa para a grande imprensa e ainda assim ter assegurado um público cativo de fãs que deliravam com os impropérios (alguns justos, outros nem tanto) desferidos contra a equipe econômica. Foi o auge da popularidade de Dr. Geninho. Em maio de 2016, contudo, com o afastamento e posterior impeachment de Dilma Rouseff, o repertório de assuntos que poderiam render alguns pontinhos fáceis para Dr. Geninho foi ficando cada vez mais restrito; e as visitas e comentários aos seus artigos publicados no seu blog na internet foram diminuindo progressivamente ao longo do tempo. A sua situação atual é de total ostracismo.

Para tentar reverter sua situação de esquecimento, Dr. Geninho, de tempos em tempos, procura inventar alguma polêmica no intuito de conseguir de volta os holofotes que tinha durante a “era de ouro”. Ele não se importa de construir espantalhos, afinal de contas a honestidade intelectual nunca foi o seu forte. O que realmente importa é chamar atenção para si mesmo e para as bobagens e futilidades que escreve, nem que sejam por breves 15 minutos.

Na mais recente de suas tentativas de retorno ao estrelato, Dr. Geninho inventou a hipótese de que para os novo-desenvolvimentistas o efeito da desvalorização do câmbio sobre a produção industrial seria instantâneo; de forma que bastaria que a taxa nominal de câmbio bilateral Dólar-Real atingisse um certo valor mágico para que todos os problemas de competitividade da indústria fossem resolvidos e a mesma voltasse a exibir um comportamento exuberante.

Evidentemente que essa hipótese se trata de um simples espantalho. Em primeiro lugar, a taxa de câmbio que importa não é a taxa nominal de câmbio; mas a taxa real. Em segundo lugar, dado que a pauta de exportações do Brasil é bastante diversificada em termos de destino das exportações, tendo os Estados Unidos deixado de ser o principal parceiro comercial do Brasil, fica evidente que a taxa de câmbio relevante é a taxa de câmbio real efetiva, ao invés da taxa de câmbio real bilateral Dólar-Real. Em terceiro lugar, os efeitos de curto-prazo de uma desvalorização cambial são opostos aos efeitos de médio e longo-prazo. Com efeito, uma desvalorização da taxa de câmbio tem efeitos contracionistas no curto-prazo porque reduz o salário real e aumenta os encargos financeiros das empresas que possuem passivos denominados em moeda estrangeira. Dessa forma, uma desvalorização do câmbio produzirá inicialmente uma redução tanto do consumo como do investimento, fazendo com que a produção industrial se reduza devida a contração da demanda efetiva. Os efeitos benéficos só ocorrem no médio e longo-prazo quando as empresas começam a substituir importações por produção doméstica e aumentam de maneira significativa as suas vendas para o exterior. Esse efeito positivo só irá acontecer, contudo, se a desvalorização do câmbio real for de caráter permanente. O problema é que o Brasil, como outros países ricos em recursos naturais, apresenta uma tendência crônica a sobrevalorização da taxa de câmbio devido a doença holandesa e a abertura da conta de capitais, fazendo com que os episódios de desvalorização da taxa de câmbio sejam de curta duração, sendo rapidamente revertidos. Em quarto lugar, o efeito positivo da desvalorização da taxa de câmbio sobre as exportações e a produção da indústria de transformação é um resultado válido ceteris paribus, ou seja, se todos os demais fatores que afetam as exportações industriais se mantiverem constantes. No caso brasileiro, a produção da indústria de transformação foi fortemente afetada pela greve dos caminhoneiros no final de maio de 2018, o que interrompeu o fluxo normal de produção das fábricas; e pela recessão que se iniciou na Argentina no segundo semestre de 2018 uma vez que esse país é um dos nossos principais mercados de exportação de produtos manufaturados. Dessa forma, parte significativa do péssimo desempenho da indústria de transformação em 2018 pode ser atribuído a um choque de oferta negativo no primeiro semestre; seguido por um choque negativo de demanda no segundo semestre.

Por fim, se Dr. Geninho tivesse se dado ao trabalho de olhar a série de taxa efetiva real de câmbio (INPC-Manufaturados-Exportações) disponível no site IPEADATA, teria verificado que entre janeiro de 2003 e setembro de 2018 a taxa real efetiva de câmbio sofreu uma valorização 28,82%. Face a um choque negativo de competitividade externa dessa magnitude não é de se estranhar que a indústria brasileira esteja andando de lado – quando não em queda livre – desde o início de 2011.

 

P.S : Evidentemente que as posições apresentadas acima refletem o meu entendimento sobre o impacto do câmbio sobre a indústria de transformação. Se outras pessoas tem um entendimento da situação que se aproxima do espantalho descrito por Dr. Geninho então o problema é delas não meu.

 

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Paulo Gala / Economia & Finanças

Graduado em Economia pela FEA-USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi pesquisador visitante nas Universidades de Cambridge UK e Columbia NY. Foi economista chefe, gestor de fundos e CEO em instituições do mercado financeiro em São Paulo. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. Brasil, uma economia que não aprende é seu último livro.

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