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José Luis Oreiro

~ Economia, Opinião e Atualidades

José Luis Oreiro

Arquivos de Categoria: Estagnação secular no Brasil

Em defesa de uma agenda democrática de retomada da economia brasileira (Congresso em Foco, 27/10/2020)

02 segunda-feira nov 2020

Posted by jlcoreiro in Crise do Coronavírus, Desequilíbrio Fiscal, Estagnação secular no Brasil, José Luis Oreiro, Senador Rogério Carvalho

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Depósitos remunerados, Política Monetária no Brasil

José Luis Oreiro* e Rogério Carvalho**

A crise sanitária afetou uma economia que sequer havia recuperado os níveis de produção anteriores à recessão 2015/2016. Entre 2017 e 2019, o PIB per capita se manteve praticamente estagnado, com elevada capacidade ociosa da economia. Neste contexto, estímulos fiscais, mediante ampliação de despesas com forte efeito multiplicador, seriam a saída mais eficaz para a retomada do crescimento.

No entanto, foi adotado, desde a gestão Temer, teto de gastos que congela as despesas primárias da União por até vinte anos. Na prática, a regra determina redução das despesas como proporção do PIB até 2036. Com a crise, o setor privado se retrai, impactando a atividade econômica e a arrecadação, ao mesmo tempo em que o investimento público é reduzido em função da política de austeridade, criando um círculo vicioso. Entre 2014 e 2021, os investimentos na proposta orçamentária federal passaram de 1,2% para 0,3% do PIB.

Adicionando-se a esta conjuntura a crise sanitária e seus efeitos sobre a oferta e a demanda, o Brasil terá uma queda do PIB estimada em 5% para 2020. Em setembro, cerca de 40 milhões de pessoas estavam desempregas ou gostariam de trabalhar, mas não procuraram trabalho. A redução do PIB não será maior em função do auxílio emergencial, aprovado pelo Congresso Nacional. A redução/retirada do auxílio sem recuperação da renda do trabalho terá grande impacto sobre o desemprego e a pobreza.

Mesmo assim, o governo acena com o reforço da austeridade, que retirará 8% do PIB em despesas de 2020 para 2021.

A justificativa dos representantes do governo é o patamar da dívida pública. Ora, a ampliação da dívida é um fenômeno mundial, produto da combinação do aumento de gastos para enfrentamento da pandemia e queda da arrecadação em função da crise. Por exemplo, os países da Zona do Euro, em média, fecharão 2020 com dívida bruta superior a 100% do PIB, segundo projeções do FMI. Ainda assim, estão adotando estímulos fiscais e monetários vultosos com vistas à recuperação da economia.

Há alternativas viáveis ao teto de gastos, como a PEC 36/2020, apresentada por mais de 30 senadores, que autoriza, para 2021 e 2022, ampliação de gastos selecionados. A partir de 2023, aproximando o Brasil de regras modernas adotadas em diversos países, a PEC estabelece metas de gastos diferenciadas por área, combinando sustentabilidade fiscal e financiamento de despesas com elevados efeitos multiplicadores e redistributivos.

No caso brasileiro, a dívida é fundamentalmente denominada em moeda local, de forma que não há risco de default. Além disso, a combinação de juros baixos e valorização dos ativos do setor público (especialmente as reservas) suaviza a trajetória da dívida líquida. Em relação à alegação do mainstream da economia que a dívida bruta do governo geral pode alcançar 100% do PIB, vale lembrar que não há um limite a partir do qual a dívida se torna insustentável.

Além disso, mais de 20% da dívida bruta do governo geral se refere às operações compromissadas, títulos do Tesouro que a autoridade monetária utiliza para regular a liquidez da economia, adequando-a à taxa básica de juro. É fundamental aprovar o Projeto de Lei nº 3.877/2020, segundo o qual o Banco Central poderá acolher depósitos voluntários como alternativa às compromissadas.

O PL alinha o Brasil às práticas internacionais, além de corrigir grave distorção na contabilidade da dívida. Ainda que o passivo do setor público não se altere, a redução potencial da dívida bruta do governo geral, segregando política monetária e fiscal, enfraquece o argumento da austeridade, que defende a manutenção do teto de gasto em função do tamanho da dívida.

Além do equívoco do teto de gasto, o governo pretende votar o projeto de autonomia do Banco Central no Senado. É mais uma agenda que atentará contra a retomada da economia. Nos países desenvolvidos, após a crise de 2008, intensificou-se o papel da política monetária tanto por meio da redução das taxas de juros como por políticas não convencionais, como o quantitative easing – QE. Este consiste na criação de moeda por meio da mudança da composição e tamanho do balanço dos bancos centrais, com a compra de títulos públicos e privados de diversas maturidades. O resultado é a ampliação das condições de crédito e liquidez da economia.

Como diversos países em desenvolvimento já se encontram com taxas de juros muito baixas, as políticas de QE serão essenciais para a recuperação “pós-covid”. Neste cenário, a autonomia do Banco Central, perseguindo apenas uma meta de inflação e não a redução do desemprego, dificultará a coordenação entre estímulos fiscais e monetários para a retomada do crescimento.

Um banco central imune à soberania popular não é autônomo, pois corre forte risco de captura pelo mercado. No momento atual, mesmo em meio a pressões por aumento dos prêmios de risco nos títulos públicos, já se pode observar que o Banco Central não vem utilizando os instrumentos conferidos pela Emenda Constitucional nº 106/2020. Ela autoriza a autoridade monetária, durante o estado de calamidade, a adquirir títulos públicos no mercado secundário com vistas a achatar a curva de juros.

Isto é, o aumento das taxas nos títulos longos não resulta de uma relação entre déficit fiscal e juros, mas da inação da autoridade monetária. Com a autonomia, este quadro se agravará, reduzindo a possibilidade de combinação de políticas fiscais e monetárias que busquem o crescimento da economia.

A saída para a crise requer maior aderência das instituições públicas às necessidades da sociedade, e não o insulamento antidemocrático das políticas fiscal (teto) e monetária (autonomia), sujeitando-as às expectativas de mercado. Assim como fez durante a pandemia, é urgente que o Congresso Nacional assuma uma agenda que atenda às expectativas populares, criando as condições para a recuperação econômica, com geração de emprego e renda e financiamento a serviços públicos essenciais. Para tanto, não faltam condições financeiras. Basta vontade política.

*José Luis Oreiro é  professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília.
**Rogério Carvalho é senador da República (PT-SE) e líder do partido no Senado.

Selic não deve cair muito mais, mas pode ficar perto de 2% por muito tempo (CNN Brasil, 06/08/2020)

06 quinta-feira ago 2020

Posted by jlcoreiro in Crise do Coronavírus, Debate macroeconômico, Estagnação secular no Brasil, José Luis Oreiro, política monetária

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Crise do Coronavírus, Debate Macroeconômico, Estagnação secular no Brasil, José Luis Oreiro, Política Monetária no Brasil

Juliana Elias, do CNN Brasil Business, em São Paulo
05 de agosto de 2020 às 21:45 | Atualizado 05 de agosto de 2020 às 22:10

Sem surpresas, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) cortou mais uma vez a taxa Selic na reunião desta quarta-feira (5) e reduziu os juros básicos do país dos 2,25% para 2% ao ano.

O corte, que renova a mínima histórica dos juros brasileiros, era esperado pela grande parte do mercado. A questão, agora, é saber em quanto mais o BC está disposto a baixar a taxa e, principalmente, quando a economia e o emprego estarão fortes o suficiente para que ela possa voltar a subir algum dia.

Para alguns analistas, os recados deixados pelo comitê do BC em seu comunicado sobre a decisão indicam que novos cortes na Selic, se houver, serão pequenos, e que ela não deve voltar para cima dos 2% tão cedo.

“Entendemos que os juros devem ficar nesta faixa pelos próximos 12 a 18 meses, a não ser que as expectativas de inflação voltem a subir”, disse o economista-chefe da gestora Mauá Capital, Alexandre Ázara.

“Não achamos que essas expectativas vão subir, e por isso o mais provável é que o BC só volte a aumentar a Selic no meio do segundo semestre do ano que vem.”

A projeção da Mauá é que o BC volte ainda a fazer um pequeno corte de 0,25 ponto neste ano, encerrando 2020 com a Selic a 1,75%. A principal razão para isso é a inflação, que, puxada pela enorme paralisia que a pandemia levou ao consumo, deve encerrar o ano também muito baixa, por volta de 1,6%, a menor em mais de duas décadas.

No ano que vem, conforme o consumo se recompõe, mesmo que lentamente, e os preços voltem a subir um pouco mais, os juros podem voltar para a casa dos 3,25%, na projeção inicial da Mauá. É, ainda sim, um patamar bastante baixo para os padrões históricos do Brasil.

Em seu comunicado, o Copom apontou que o espaço para novos cortes da Selic, “se houver, deve ser pequeno”. O texto indicou também que o grupo não deve voltar a subir os juros “a menos que as expectativas da inflação (…) estejam suficientemente próximas da meta”.

É justamente isto que Ázara e outros economistas acham difícil de acontecer, dado que a inflação atual está completamente distante do objetivo. A meta é um alvo anual para a inflação estipulado pelo governo para guiar as políticas de estímulo e evitar que os preços saiam de controle.

Para 2021, esta meta é de uma inflação a 3,75%, enquanto tanto as projeções de analistas quanto a do próprio Copom é de que ela fique em 3% no ano que vem. O que o Copom está dizendo é que só vai voltar a subir juros se analistas e investidores voltarem a achar que a inflação pode chegar mais perto dos 3,75%,

Neste ano, já é dado como certo que a variação dos preços ficará abaixo dos 2% e nem mesmo o piso a ser perseguido será cumprido – para 2020, a meta para a inflação é de 4%, com uma banda de tolerância entre 2,5% e 5,5%.

“Os juros devem continuar baixos por um longo, longo tempo”, disse o economista José Luis Oreiro, professor da Universidade e Brasília (UnB).

Mais pessimista que boa parte do mercado, Oreiro não acredita que o Brasil tem fôlego para voltar a crescer mesmo no ano que vem, se não continuar contando com injeções de ajuda como a do auxílio emergencial de R$ 600, que deverá ser encerrado ou reduzido até lá.

A projeção de Oreiro é que o PIB cresça apenas 1% em 2021, mesmo ritmo lento com que a economia já vinha crescendo nos últimos três anos. Entre as alas mais otimistas das bancadas financeiras, há projeções de crescimento de 2% ou mesmo 3% em 2021.

“Se o Brasil voltar a crescer a um ritmo de 1% ao ano no ano que vem, ele só irá recuperar o nível de renda que tinha em 2014 em 2033”, disse “É por isso que os juros poderão ser baixos por muito tempo. Talvez pudessem voltar para perto dos 3% daqui a cinco anos.”

Não, a economia brasileira não se recuperou da crise de 2014-2016; e talvez nunca se recupere …

01 sábado fev 2020

Posted by jlcoreiro in "nova ordem", Ajuste fiscal, Debate macroeconômico, Desenvolvimento econômico, Estagnação da economia brasileira, Estagnação secular no Brasil, Estratégias de Desenvolvimento, José Luis Oreiro

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Estagnação secular no Brasil, José Luis Oreiro

Entre 1980 e 2014 a economia brasileira cresceu a um ritmo médio de 2,81% a.a, segundo dados do IPEADATA (série PIB – preços de mercado – var. real anual – (% a.a.) – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de Contas Nacionais (IBGE/SCN Anual) – SCN10_PIBG10). A Grande recessão iniciada no segundo semestre de 2014 (a respeito das causas da grande recessão brasileira ver http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142017000100075) produziu uma queda acumulada de 6,70% no período 2014-2016. Formalmente a economia brasileira sai da recessão em 2017, ano que apresentou um crescimento de 1,32% do PIB, valor 53% inferior a tendência de longo-prazo para o período 1980-2014. Em 2018 o crescimento foi de 1,31%, repetindo assim o desempenho de 2017, e ficando novamente abaixo da tendência de longo-prazo.

Esse não é o comportamento esperado para economias que saem de um processo recessivo. A teoria econômica convencional exposta na imensa maioria dos livros texto de macroeconomia vê as recessões como períodos nos quais a economia opera abaixo da sua tendência de longo-prazo. Nesse contexto, as flutuações cíclicas são vistas como movimentos de amplitude e periodicidade variável (flutuações irregulares) em torno de uma tendência de longo-prazo que é independente desse movimento oscilatório. Dessa forma, as recessões tem um efeito apenas temporário sobre o nível de atividade econômica, pois uma vez terminada a recessão a economia deverá crescer, por algum tempo, acima da tendência de longo-prazo de maneira a retornar ao nível que estaria caso a recessão não tivesse ocorrido (Ver figura 1). Isso significa que os efeitos de uma recessão sobreo nível de atividade econômica são inteiramente dissipados no médio-prazo, não restando nenhum vestígio do efeitos da mesma no sistema econômico. 

Figura 1: Tendência de longo-prazo e ciclo econômico.

Fonte: Elaboração própria.

O fato é que no caso brasileiro, mesmo após o fim da grande recessão, a economia se encontra crescendo muito abaixo de sua tendência de longo-prazo, fazendo com que o nível de atividade no final de 2018 fosse quase 20% menor do que o prevalecente caso a economia tivesse retornado – como seria de se esperar – a sua trajetória de longo-prazo, uma vez terminado os efeitos da grande recessão (Ver figura 2). 

Fonte: Elaboração própria com base nos dados de IPEADATA.

O PIB brasileiro a preços de mercado no final de 2018 era de R$ 6,88 Trilhões. Se a economia brasileira tivesse retornado à sua trajetória de longo-prazo no final de 2018, o PIB a preços de mercado seria de R$ 8,6 trilhões de reais, ou seja, um valor R$ 1,72 trilhões mais elevado ! Esse acréscimo no PIB teria gerado um aumento da receita da União, Estados e Municípios de R$ 550 bilhões, valor mais do que suficiente não só para zerar o déficit primário do setor público, como também para gerar um expressivo superávit primário. 

Está claro que dada a magnitude da recessão ocorrida no período 2014-2016 não seria possível recuperar a tendência de longo-prazo num período de apenas dois anos. Considerando uma taxa de crescimento de 4% a.a. a partir de 2017, o PIB só retornaria ao nível da tendência de longo-prazo em 2033. Se a taxa de crescimento pós-crise fosse de 5% a.a. a recuperação ocorreria em 2026.

Embora o crescimento do PIB em 2019 ainda não tenha sido divulgado, as expectativas do mercado situam o mesmo em torno de 1 a 1,2%, valor ligeiramente abaixo do observado no período 2017-2018. Confirmando-se o terceiro ano consecutivo de crescimento abaixo da tendência de longo-prazo, não há como escapar da conclusão de que a grande recessão de 2014 a 2016 produziu uma redução da tendência de crescimento da economia brasileira. A questão relevante é saber qual o motivo. 

Os economistas liberais dirão que a redução da tendência de crescimento de longo-prazo se deveu aos erros da política econômica do PT e a implantação da famigerada “nova matriz macroeconômica”, seja lá o que isso signifique. Outros ainda dirão que é devido ao excesso de intervenção do Estado na economia, esquecendo, contudo, que o período 1980-2014, usado no calculo da tendência de longo-prazo, engloba a década de 1980 – pródiga em intervenção Estatal na economia – e os anos dourados da administração Petista, os dois mandatos do Presidente Lula, os quais certamente puxaram a média para cima.

Para lidar com esse problema da redução da tendência de crescimento, os economistas liberais defendem uma agenda aparentemente inesgotável de reformas: Teto dos gastos, reforma trabalhista, reforma de previdência, nova reforma trabalhista, reforma administrativa, PEC emergencial e etc. O fato é que estamos no quarto ano da “nova era” da gestão liberal (iniciada com o Impeachment da Presidente Dilma Rouseff) e o crescimento econômico continua pífio. A equipe econômica do governo promete acelerar o crescimento em 2020 para incríveis (modo ironia ligado) 2,5% a.a, querendo fazer parecer para a opinião pública de que se trata de um grande feito de engenharia econômica. Não é. Mesmo que esse valor seja obtido em 2020, e sobre isso pairam muitas duvidas no ar, ainda assim será menor do que a média do período 1980-2014 e, portanto, insuficiente para eliminar o “hiato de crescimento” originado a partir de 2014.

Na minha visão a redução do potencial de crescimento de longo-prazo é um fenômeno que vem ocorrendo desde meados da década passada – e, portanto, dentro do intervalor temporal das administrações petistas – em função da desindustrialização crescente da economia brasileira; fenômeno esse que foi tardiamente percebido pelas administrações petistas e enfrentado de forma tíbia e inconsistente no primeiro mandato da Presidente Dilma Rouseff (a esse respeito ver https://jlcoreiro.wordpress.com/2013/06/18/desenvolvimentismo-sem-consistencia-valor-economico-18062013/). A crise de 2014-2016 piorou esse quadro pois (i) fez com que as empresas brasileiras suspendessem seus planos de ampliação e modernização da capacidade produtiva, o que aumentou a defasagem tecnológica da indústria brasileira; (ii) propiciou a adoção de uma agenda de consolidação fiscal baseada na contração do investimento público e do crédito do BNDES, amplificando assim os efeitos da queda do investimento privado em 2014 sobre a demanda agregada, com efeitos negativos também no lado da oferta da economia devido aos efeitos de transbordamento positivos do investimento público sobre a rentabilidade das empresas do setor privado.

A redução do potencial de crescimento fica comprovada quando olhamos para a situação do déficit em conta corrente do balanço de pagamentos. Em 2019 o déficit em conta corrente fechou em 2,76% do PIB apesar da economia brasileira estar crescendo a um ritmo pouco maior do que 1% a.a desde 2017. Esses números mostram claramente que uma aceleração significativa do crescimento da economia brasileira – por exemplo, para a sua tendência de longo-prazo de 2,88% – deverá produzir um aumento insustentável no déficit em conta corrente, o qual poderá facilmente passar de 4% do PIB. Nessas condições, a restrição externa (ver https://jlcoreiro.wordpress.com/2019/12/06/sobre-a-tal-da-restricao-externa/)  irá impor um crescimento medíocre para a economia brasileira nos próximos anos.

Se o crescimento da economia brasileira permanecer num patamar medíocre, então nenhum ajuste fiscal será capaz de “arrumar as contas do governo”. O Brasil irá entrar num jogo perde-perde no qual o Ministério da Economia irá lançar propostas atrás de propostas de emenda constitucional com o objetivo de (sic) acabar com os “privilégios do funcionalismo público”; haja vista que se trata do único segmento da sociedade ainda protegido contra o empobrecimento geral do país, resultante dos efeitos de longo-prazo da crise de 2014-2016.  Já que não é possível aumentar a renda dos que trabalham no setor privado – devido a crescente uberização da economia, filha bastarda da desindustrialização – a solução dos economistas liberais é empobrecer os servidores públicos para assim (sic) diminuir a desigualdade na distribuição de renda no Brasil. E assim nosso país caminha a passos largos para sair da “Armadilha da Renda Média” para cair, talvez para sempre, na “Armadilha da Pobreza”.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Macroeconomia da Estagnação – Revista Insight Inteligência, Edição 87

21 terça-feira jan 2020

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José Luis Oreiro, Luiz Fernando de Paula, Macroeconomia da estagnação

 

Luiz Fernando de Paula, Economista

José Luís Oreiro, Economista

Link: https://insightinteligencia.com.br/arquivos/284

A economia brasileira, após um período de crescimento de 3,80% a.a. na média do período 2004/2013, entrou em forte recessão a partir de 2014, com taxa média do PIB real de -1,87% a.a. no período 2014/2016. Além da forte e prolongada recessão – segundo Pires et al (2019), mais profunda que a ocorrida na economia norte-americana após a crise de 2018 e com magnitude semelhante a recessão ocorrida em Portugal, Itália e Espanha –, chama a atenção o ritmo extremamente lento de recuperação econômica: a taxa média de crescimento no período 2017/20191 é de apenas 0,98% a.a. Esta recuperação tem sido atipicamente lenta, na realidade caracterizando uma situação de estagnação econômica, já que Borça et al (2019) mostram que historicamente as recessões brasileiras são breves e pouco profundas, com recuperações relativamente rápidas. Acompanhando a estagnação da economia brasileira, observa-se uma recuperação ainda mais lenta da taxa de desocupação: redução de 13,7% em março de 2017 para apenas 12,3% em maio de 2019.

Após um período conturbado de mudanças na condução da política econômica – desde a implementação da assim chamada “Nova Matriz Macroeconômica” em 2012 até a virada para uma política econômica ortodoxa em 2015, durante o Governo Dilma Rousseff – desde o Governo Temer, a partir de maio de 2016, até o Governo Bolsonaro, a partir de janeiro de 2019, houve uma mudança profunda na condução da política econômica, adotando-se explicitamente uma agenda ortodoxa-liberal. Esta agenda tem direcionado a economia para um novo modelo de desenvolvimento, baseado em reformas liberalizantes (reforma trabalhista, reforma previdenciária, etc.) e na reafirmação das políticas econômicas conduzidas de forma ortodoxa: uma política monetária mais conservadora, uma política fiscal contracionista (implementação do teto de gastos com base no argumento da “contração fiscal expansionista”), e uma política cambial mais flexível.

Neste contexto, o objetivo deste artigo é analisar as razões conjunturais e estruturais do processo de estagnação que se encontra a economia brasileira. Em particular, sustentamos que a economia brasileira está estagnada em função de (i) um conjunto de fatores conjunturais (“overkill” da política econômica, “balance sheet effect”, etc.); (ii) a combinação de um conjunto de fatores endógenos (dependentes da ação do governo, como políticas de austeridade) e exógenos (queda preços de commodities em 2019; guerra comercial EUA/China, recessão na Argentina, etc.).

Uma economia em marcha lenta

Como já assinalamos inicialmente, a economia brasileira, após uma recessão aguda em 2014/2016, teve em um processo de recuperação lenta, podendo na realidade ser caracterizado de uma situação de estagnação, isto é, uma economia com crescimento baixo e estável, ao redor de 1,0% ao ano no período 2017/2019 (o que implica um crescimento praticamente nulo do PIB per-capita), como pode ser visto no Gráfico 1. Decompondo o PIB por setor, tanto o setor de serviços e o setor industrial (este estagnado desde meados de 2008) declinaram a partir do início de 2015, sendo a única exceção o setor agropecuário que continuou a se expandir neste período, puxado pelo desempenho das exportações, sendo a recuperação bastante lenta em todos os outros setores.

Já do ponto de vista dos componentes de gasto do PIB, a maioria dos dispêndios declinaram a partir de 2015, com exceção das exportações, favorecida tanto pela forte desvalorização cambial ocorrida neste ano quanto pelo aumento nos preços das commodities ocorridas em 2016. A reação do consumo das famílias (responsável por mais de 50% do PIB do ponto de vista do gasto) e da formação bruta de capital fixa tem sido muito lenta, mantendo-se esses componentes da demanda praticamente estagnados no período relativo ao 1º trimestre de 2016 e 1º trimestre de 2019. Deste modo, observa-se, pelo lado dos gastos, uma economia em estado de estagnação2.

A forte desaceleração econômica veio acompanhada de um agudo crescimento na taxa de desocupação, que aumentou celeramente de 6,5% em dezembro de 2014 para 13,7% em março de 2017, mantendo-se desde então ao redor 12%, permanecendo neste patamar elevado sem uma tendência de redução mais significativa (Gráfico 2). O aumento na taxa de desocupação atingiu a grande maioria dos setores da economia, mas foi particularmente agudo no setor de construção civil (responsável por 22% do aumento da taxa entre 2014 e 2016), dependente dos programas do governo e atingido pela paralisia no setor causado pela operação Lava-Jato. Observa-se, assim, que a lenta recuperação da economia brasileira, após a recessão, não tem sido acompanhada de um aumento mais significativo do nível de emprego.

Esse movimento no mercado de trabalho tem sido acompanhado por um aumento na concentração de renda desde 2015, em função da manutenção de elevados patamares de desemprego e desalento, como também do aumento da desigualdade entre trabalhadores: segundo Barbosa (2019a), em meados de 2014, os 50% mais pobres se apropriavam de cerca de 5,7% de toda a renda de trabalho, enquanto que no 1º trimestre de 2019 essa proporção caiu para 3,5%, uma queda de quase 40%. Já os 10% mais ricos da população que recebiam cerca de 49% do total de renda de trabalho em meados de 2014 aumentaram para 52% no início de 2019, um aumento de 30% na fração da renda apropriada pelos 10% mais ricos.

Fatores conjunturais

Uma característica da fraca recuperação econômica pós-recessão de 2014/2016 é que a mesma tem sido atipicamente lenta, quando comparada, por exemplo, com as recuperações ocorridas após a recessões de 1981/83 e 1989/92, mesmo considerando que a recessão recente foi bem mais profunda. Deste modo, seria de se esperar uma recuperação cíclica mais robusta, que, como vimos, não aconteceu. Segundo Pires et al (2019), a retomada econômica brasileira é semelhante à dos países da Zona do Euro pós-crise financeira (exceção da Grécia), países que tinham restrições na utilização de instrumentos contra-cíclicos.

Vários fatores contribuíram para tal comportamento.

Em primeiro lugar, e mais importante, o principal problema da economia brasileira tem sido a falta de demanda e não de um eventual problema de oferta. De acordo com Borges (2018) a falta de demanda é decorrência de um “overkill” decorrente de um conservadorismo excessivo da política econômica. A manutenção de uma política monetária contracionista por um período de tempo muito longo, com manutenção de uma taxa Selic acima do juro neutro da economia a partir de meados de 2017, num contexto em que a política fiscal e, sobretudo, financeira (desembolsos do BNDES) também foram contracionistas, contribuiu sobremaneira para a economia ter uma recuperação lenta com tendência à estagnação. De fato, é como se o governo, em meio a recuperação cíclica da economia, puxasse ao mesmo tempo todos os freios da economia.

O Gráfico 3 apresenta média, mediana e desvio-padrão de 9 estimativas independentes do hiato do produto para a economia brasileira (sendo 3 estimativas do IBRE/FGV, duas da LCA, duas da MCM, uma da IFI/Senado e uma do IPEA): como pode ser visto tanto na média quanto na mediana que a economia brasileira estava no 1º trimestre de 2019 operando com cerca de 5,5% abaixo do seu potencial, o que mostra que o excesso de capacidade ociosa pouco se alterou desde o final de 2016 (Pires et al, 2019).

Em segundo lugar, após um longo ciclo de expansão do crédito (2004/2014), em que a relação crédito/PIB cresceu de 23% para 58%, observa-se um “credit crunch” – isto é, um colapso no mercado de crédito – na economia brasileira a partir de 2015, decorrente da combinação de aumento no endividamento dos agentes (famílias e firmas) com um forte choque de juros. Como pode ser visto no Gráfico 4, a taxa de crescimento real do crédito despencou a partir do início de 2015, tanto para o crédito livre quanto para o crédito direcionado, sendo que neste último caso a queda na oferta de crédito do BNDES – que passa por uma radical mudança operacional (em particular no que se refere a devolução de recursos para o Tesouro) – contribuiu sobremaneira para esta redução, que volta a acontecer a partir de 2018, neutralizando a recuperação parcial das modalidades de crédito livre3. A forte redução do balanço do BNDES coloca em dúvida se o segmento privado do sistema financeiro será capaz ofertar crédito (bancário ou via mercado de capitais) na magnitude necessária para um novo ciclo de crescimento.

Em terceiro lugar, e relacionado ao anterior, o elevado endividamento das firmas e das famílias gerou uma “balance sheet recession”, ou seja, uma queda do nível de atividade econômica e da demanda agregada devido ao processo de desalavancagem das firmas e das famílias (Gala, 2018) A economia brasileira – após sofrer o efeito-contágio da crise financeira internacional – retomou o ciclo de expansão do crédito no período pós-2008, agora liderado pelo segmento dos bancos públicos, que resultou num aumento significativo do grau de alavancagem das empresas não-financeiras e do comprometimento de renda das famílias com endividamento bancário. De fato, a elevação da taxa de juros a partir de 2015, em conjunto com a forte desvalorização da taxa nominal de câmbio, levaram as empresas e as famílias a desalavancar seus balanços, contraindo os gastos com investimento e consumo, um processo que tem sido lento e parcialmente revertido.

O endividamento das famílias em relação a renda acumulada nos últimos 12 meses – conforme dados do BCB (2019) – cresceu de 18,5% em janeiro de 2005 para 46,6% em janeiro de 2015, vindo então a cair para 41,7% em setembro de 2017 mas voltando a crescer para 44,0% em maio de 2019. Por outro lado, observa-se que as firmas foram se fragilizando financeiramente de 2007 a 2015, devido ao aumento das despesas financeiras e compromissos financeiros de curto prazo em relação a geração de caixa, vindo a desalavancar apenas parcialmente em 2016 e 2017. Segundo Meyer (2019), a fragilidade financeira das empresas de capital aberto4 reduziu de 1,69 em 2007 para 0,38 em 2015 (o que significa que a geração de caixa só cobre apenas 38% das despesas e compromissos financeiros), vindo a se elevar para 0,85 em 2017. Nesse contexto de uma ainda elevada alavancagem, a política monetária mais expansionista perde parcialmente eficácia e a recuperação do nível de atividade é mais demorada.

Avelocidade do processo de desalavancagem – o qual exige que o setor privado não-financeiro se torne superavitário – depende da disposição e da capacidade do setor público em compensar o aumento do superávit do setor privado por uma redução (ou aumento) do seu próprio superávit (déficit). Contudo, as regras fiscais aprovadas no Governo Temer, ao final de 2016, impedem o uso da política fiscal como instrumento anticíclico.

De fato, a chamada PEC 55 tem como objetivo reduzir a trajetória de crescimento dos gastos públicos no Brasil e equilibrar de forma definitiva as contas públicas, fixando por até 20 anos um limite para as despesas primárias , que passam a ser reajustadas pelos gastos realizados no ano anterior corrigido pela inflação; ao mesmo tempo em que manteve da meta de resultado primário, estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal. Segundo Barbosa (2019b) há dois problemas nessas regras.

Por um lado, a meta do resultado primário gera um comportamento pró-cíclico da política fiscal: se a economia crescer mais rápido do que projetado no orçamento, as receitas tributárias serão também maiores do que projetado, podendo o governo gastar mais, contribuindo para acelerar a economia; se o crescimento econômico estiver abaixo do previsto, o governo é forçado a cortar despesas discricionários para cumprir a meta de resultado primário, resultando uma contração fiscal no momento em que a economia está operando abaixo do esperado. Por outro lado, com a meta de gastos, o resultado do governo se torna a variável de ajuste: se a economia crescer mais rápido do que o esperado, o governo arrecadará mais do que previsto, mas não poderá gastar o excedente, uma vez que sua despesa está limitada pela regra estabelecida; por outro lado, como pela nova regra do teto o gasto total tem crescimento igual a zero em termos reais, se o crescimento dos gastos obrigatórios em termos reais for maior do que zero então o gasto discricionário deverá ser reduzido no mesmo montante para que o gasto primário permaneça constante e não ultrapasse a meta, sendo essa situação particularmente grave em momento em que economia está crescendo pouco e a arrecadação fiscal está baixa.

O resultado desta regra é que dada a dificuldade de atingir a meta do teto do gasto, o governo se vê obrigado a cortar mais e mais gastos discricionários, razão pelo qual o Ministro Paulo Guedes tem defendido a desvinculação das despesas obrigatórias.
Gráfico 5 mostra a decomposição do resultado fiscal estrutural, que corresponde ao resultado primário que seria observado como o PIB em seu nível potencial, o preço do petróleo igual ao valor igual ao valor de equilíbrio de longo prazo e sem receitas e gastos não recorrentes. O indicador mede assim o esforço discricionário e recorrente do setor público para alcançar a solvência de longo prazo, sendo que sua variação retrata em que medida houve deterioração ou melhora fiscal (Ministério da Economia, 2019). Como pode ser observado no referido gráfico, há uma forte deterioração do resultado primário (convencional) a partir de 2014, vindo a atingir um déficit de 2,5% do PIB em 2016, sendo que o fator principal para tal deterioração foi o “componente cíclico”, que responde por 1,9% do PIB em média no período 2015/2018, sendo apenas parcialmente atenuado por receitas não recorrentes (principalmente bônus relativos aos leilões do pré-sal). Deste modo, fica claro que o principal fator responsável pela deterioração fiscal a partir de 2015 foi o efeito da desaceleração econômica sobre a arrecadação fiscal de modo geral. Já o impulso fiscal, medido pela variação do resultado estrutural, mostra uma forte tendência contracionista em 2015 (-1,8%), expansionista em 2016 (0,8%) e relativamente neutro em 2017 (-0,3%) e 2018 (0,2%).

Um dos resultados da deterioração fiscal e da recente amarração institucional –que torna a política fiscal permanentemente contra-cíclica, sendo impedida de ser utilizada como instrumento de estabilização do ciclo econômico – é a queda do investimento público em relação ao PIB, já que é um gasto discricionário, caindo de 4,06% em 2013 para 2,43% em 2018 (conforme dados do Tesouro Nacional), com uma expectativa de uma redução ainda maior em 2019. Como atesta a literatura (IMF, 2014) há uma forte complementaridade entre investimento privado e investimento público, em particular no que se refere aos investimentos em infraestrutura, os quais possuem alta externalidade para outros setores da economia.

Por último, observa-se uma tendência recente de deterioração na economia internacional, como resultado da guerra comercial entre EUA-China, desaceleração econômica na Zona do Euro e na China, crise argentina, etc., com efeitos sobre a economia brasileira tanto nos fluxos de comércio quanto nos fluxos financeiros5. Em particular, há uma deterioração nos termos de troca do país em curso desde o final de 2011, com um repique de meados de 2016 para meados de 2017, sendo a queda recente devida, em parte, a redução nos preços das commodities. Deste modo, não se deve esperar uma compensação da estagnação do mercado interno por um desempenho mais robusto das exportações líquidas do país.

De acordo com Barboza e Campello (2019) existe uma forte correlação positiva entre crescimento do índice CRB de preços de commodities e o PIB brasileiro, de 76% entre junho de 2005 a junho de 2019. Os autores sugerem que a influência dos preços das commodities vai além das exportações brasileiras, uma vez que aumentos nos preços das commodities: (i) atraem fluxos de capital para o país, o que permite ampliar a liquidez e o crédito; (ii) aumentam o preço das ações e o investimento das empresas listadas; (iii) geram uma tendência de apreciação da taxa de câmbio, o que alivia o balanço das empresas endividadas em moeda estrangeira e reduz os preços dos bens de capital importados, com efeitos positivos sobre investimento; sendo os efeitos contrários no caso de uma queda nos preços das commodities, como parece ser o caso da economia brasileira em 2019.

Algumas breves considerações finais sobre a política econômica de Bolsonaro/Guedes

Analisamos neste artigo as razões conjunturais e estruturais, domésticas e externas do processo de estagnação que se encontra atualmente a economia brasileira. Nossa avaliação é que a política ortodoxo-liberal6 – uma espécie de “tatcherismo” tupiniquim – que vem sendo implementada por Bolsonaro/Guedes é equivocada e incapaz de dar sustentação a um novo ciclo crescimento para economia brasileira, sendo mais provável a manutenção de uma economia estagnada, resultando em um comportamento de “stop-and-go” em termos de um baixo crescimento.

Como medida pontual para estimular a demanda de consumo das famílias, dada a fraca e lenta recuperação econômica ao longo de 2019, a equipe econômica anunciou ao final de julho de 2019 a liberação de saques de até R$ 500,00 nas contas ativas e inativas do FGTS e do PIS/PASEP, estimando uma liberação de recursos da ordem de R$ 42 bilhões em 2019 e 2020. Estimativas sobre o impacto de tal medida mostra que a mesma terá um impacto pontual e limitado sobre o PIB, gerando um aumento de 0,2% do PIB em 2019 (Balassiano, 2019).

Logo, a agenda de Bolsonaro/Guedes não enfrenta o problema crucial de economia brasileira, que é uma crônica falta de demanda, que requer uma outra agenda de ajuste fiscal, mais gradualista e de longo prazo, e abrindo espaço para o crescimento dos investimentos públicos. A agenda econômica do governo é uma espécie de reedição do liquidacionismo de Hoover-Melon7 no sentido de que as medidas de estímulo a demanda agregada são vistas pela equipe econômica do governo como contraproducentes, muitas vezes comparadas a “dar cachaça para o alcoólatra parar de tremer“ (Mendes, 2019). Ademais, objetiva a redução do papel do Estado na economia, buscando abrir espaço para o empreendimento privado, como principal estratégia de desenvolvimento. Contudo, a questão central para uma estratégia de desenvolvimento não é mais ou menos

Estado, mas qual Estado é necessário para dar suporte ao mesmo, buscando um equilíbrio entre Estado e mercado. De fato, não há experiência de desenvolvimento desde o século XX que tenha prescindido de um papel ativo do Estado na economia.
Artigo escrito com dados e informações disponíveis em setembro de 2019.

Luiz Fernando de Paula é professor do Instituto de Economia da Universidade de Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ) e do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP/UERJ

lfpaula@iesp.uerj.br

José Luís Oreiro é professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do Centro de Estudos do Novo-Desenvolvimentismo da FGV-SP

joreirocosta@yahoo.com.br

 

NOTAS DE RODAPÉ

1. Considerando uma projeção de crescimento de 0,87% em 2019 conforme Focus de 07/09/2019.

2. Uma economia estagnada é entendida aqui como uma economia que tem se mantém em baixo crescimento por um período prolongado, sem que isso caracterize uma recessão.

3. As operações de crédito com operações livres correspondem aos contratos de financiamentos e empréstimos com taxas de juros livremente pactuadas entre instituições financeiras e mutuários. Nas operações livres, as instituições financeiras têm autonomia sobre a destinação dos recursos captados em mercado. Já as operações de crédito com recursos direcionados são aquelas regulamentadas pelo CMN ou vinculadas a recursos orçamentários, sendo destinadas, basicamente, ao financiamento da produção e do investimento de médio e longo prazos aos setores imobiliário, rural e de infraestrutura.

4. Medida pelo seguinte indicador: geração de caixa (EBITDA) sobre despesas financeiras somado a compromissos financeiros de curto prazo.

5. Segundo o IMF (2019), a taxa de crescimento da economia mundial cai de 3,8% em 2017 para 3,6% em 2018 e (previsão) para 3,2% em 2019, enquanto que o crescimento do volume do comércio internacional cai ainda mais: de 5,5% a.a. em 2017 para 3,7% em 2018 e (estimado) 2,5% em 2019.

6. A política econômica ortodoxo-liberal iniciada por Temer/Meirelles e aprofundada por Bolsonaro/Guedes possui dois aspectos principais: (i) realização de uma forte contração fiscal, principalmente pelo lado dos gastos correntes, baseado na tese da “contração fiscal expansionista”; (i) um conjunto de políticas liberais que visa “destravar” o espirito empresarial das amarras do Estado via desregulamentação do mercado, permitindo que a iniciativa privada comande o processo econômico, inclusive no que se refere aos investimentos. Políticas de demanda tem papel nulo ou marginal nesta estratégia de crescimento, podendo apenas ser adotadas excepcionalmente através de medidas pontuais que não impliquem em custo fiscal.

7. No início da década de 1930, Andrew Mellon, Secretário do Tesouro dos EUA, diante de uma catástrofe econômica sem precedentes, pediu ao Presidente Hoover que se abstivesse de usar o governo para intervir na depressão. Mellon acreditava que recessões econômicas, como as ocorridas em 1873 e 1907, eram uma parte necessária do ciclo de negócios, porque expurgaram a economia.

 

BIBLIOGRAFIA

Balassiano, M. (2019). “Liberação do FGTS: estímulo à economia”. Blog do IBRE, 29/07/2019, https://blogdoibre.fgv.br/posts/liberacao-do-fgts-estimulo-economia

Barbosa, R.J. (2019a). “Estagnação, desalento, informalidade e a distribuição da renda do trabalho no período recente (2012-2019). Mercado de Trabalho – Conjutura e Análise n.67, IPEA, setembro.

Barbosa, N. (2019b). “O problema das três regras fiscais”. Observatório da Economia Contemporânea, Le Monde Diplomatique Brasil, 30 de maio.

Barboza, R. e Campello, D. (2019). “PIB e preços de commodities”. Valor Econômico, 22/08/2019.

BCB – Banco Central do Brasil (2019), https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries, acesso em 05/09/2019.

Borça Jr., G., Barboza, R. e Furtado, M. (2019). “A recuperação do PIB brasileiro em recessões: uma visão comparativa”. Blog do Ibre, disponível em:https://blogdoibre.fgv.br/posts/recuperacao-do-pib-brasileiro-em-recessoes-umavisao-comparativa

Borges, B. (2018). “Novos núcleos, monetary overkill e o choque cambial”. Blog do IBRE, https://blogdoibre.fgv.br/posts/novos-nucleos-monetary-overkill-e-o-choque-cambial

IBGE (2019), https://www.ibge.gov.br/, acesso em 12/09/2019.

Gala, P. (2018). “O Peso das dívidas na recuperação econômica brasileira”. Valor Econômico, 09/08/2019.

IMF – International Monetary Fund (2014). World Economic Outlook: Legacies, Clouds, Uncertainties. Washington, October.

IMF – International Monetary Fund (2019). World Economic Outlook: Still Sluggish Global Growth. Washington, July.

IPEADATA (2019), http://www.ipeadata.gov.br/Default.aspx, acesso em 16/09/2019.

Mendes, M. (2019). “Estímulo de curto prazo é como dar cachaça para alcóolatra parar de tremer”. Folha de S.Paulo, 08//07/2019.

Meyer, T.R. (2019). “Determinantes do investimento privado no Brasil no período recente: uma abordagem pós-keynesiana”. Tese de doutorado. Rio de Janeiro: PPGCE/UERJ, setembro.

Ministério da Fazenda (2019). Boletim Resultado Fiscal Estrutural – 2018. Brasilia: Ministério da Fazenda, abril.

Pires, M., Borges, B. e Borça Jr, G. (2019). “Por que a recuperação tem sido a mais lenta de nossa história? ”. Brazilian Keynesian Review, 5(1): 174-202.

 

 

 

Estagnação secular no Brasil?

10 quinta-feira out 2019

Posted by jlcoreiro in Erros de Paulo Guedes, Estagnação secular no Brasil

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Conservadorismo do BACEN, Erros de Paulo Guedes, Estagnação secular no Brasil

Hoje (09 de outubro) foram divulgados os dados da inflação de setembro. Tivemos uma deflação de 0.04% no mês passado, o que levou o IPCA acumulado em 12 meses a 2,89%, ligeiramente acima do piso do regime de metas de inflação para 2019 que é de 2,75%, mas muito baixo do centro da meta de inflação para 2019 que é 4,25%.

Ao que tudo indica estamos caminhando para o terceiro ano consecutivo no qual a inflação irá ficar ABAIXO do centro da meta inflacionária definida pelo Conselho Monetário Nacional. Ainda mais preocupante é o fato de que a média das 7 medidas de núcleo de inflação do IPCA acumulado em 12 meses (que excluem os itens mais sensíveis a choques de oferta como combustíveis e câmbio) está apenas ligeiramente acima da piso do regime de metas: 2,82% contra 2,75% do piso.

O Brasil está flertando perigosamente com a deflação. A insistência numa política econômica liquidacionista aos moldes do realizado pela dupla Hoover-Mellon nos EUA no início dos anos 1930 (https://jlcoreiro.wordpress.com/2019/06/05/paralelos-entre-hoover-mellon-e-bolsonaro-guedes/) está empurrando o Brasil para uma espiral deflacionária cujo desfecho será uma crise econômica sem precedentes na história da República. Ainda há tempo para mudarmos esse desfecho. O governo Bolsonaro precisa rever seus conceitos econômicos e se aggiornar as boas práticas de política econômica que estão sendo adotadas atualmente na Europa e dos EUA para evitar o pior. E, mais importante, o Banco Central do Brasil precisa abandonar seu conservadorismo irracional e promover um choque de taxa de juros, reduzindo a Selic para 0% em termos reais, o que significa uma Selic nominal de, no máximo, 3% a.a.

Que o bom senso, não uma ideologia ultrapassada desprovida de comprovação científica, possa prevalecer no debate econômico brasileiro. Oremos.

 

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