O Partido dos Trabalhadores parece bastante comprometido com o objetivo de afundar de vez o governo da Presidente Dilma Rouseff mediante o aprofundamento do gravíssimo quadro econômico que assola o país desde o final de 2014. Sua mais recente inovação nesse quesito foi a (sic) brilhante ideia de usar uma parte das reservas internacionais para financiar investimento público.
A lógica econômica da proposta seria a seguinte. O Brasil possui mais reservas internacionais do que necessita, pois as mesmas superam em quase US$ 40 bilhões o estoque da dívida externa brasileira. Além disso, o custo de carregamento dessas reservas, dado pela diferença entre as taxas de juros doméstica e internacional é muito alto, próximo a 12% a.a. Como o Brasil possui cerca US$ 370 bilhões de reservas, o custo de carregamento é superior a R$ 160 bilhões a.a., supondo um câmbio de R$3,70. Se as reservas pudessem forem reduzidas em 1/3, o custo de carregamento cairia em R$ 54 bilhões.
Por outro lado, a venda de 1/3 das reservas internacionais geraria uma receita financeira de mais de R$ 450 bilhões, supondo um câmbio de R$ 3,70, receita essa que seria transferida para o Tesouro Nacional. De posse desses recursos, o governo poderia fazer um aumento espetacular no investimento público, o qual tiraria a economia brasileira da recessão em poucos meses. Com efeito, supondo um multiplicador igual a 1.3, o programa de investimentos, se executado em 12 meses, geraria um aumento de quase R$ 590 bilhões no PIB, ou seja, um crescimento de 10% em termos nominais.
O problema com esse raciocínio é que ele se assenta em hipóteses erradas. Em primeiro lugar, o custo de carregamento está mal calculado, pois o mesmo é igual a diferença entre a taxa de juros doméstica e a soma da taxa de juros internacional com a taxa de desvalorização do câmbio. Como em 2015 o câmbio se desvalorizou em 47%, o custo de carregamento foi negativo em 35%, proporcionando ao governo um ganho de R$ 480 bilhões. Uma parte desse gigantesco ganho de capital foi transferido do Banco Central para o Tesouro Nacional no final de 2015, permitindo o pagamento das “pedaladas fiscais” sem emissão de dívida pública. Em segundo lugar, o fato de que o governo é credor líquido em dólar evita a ocorrência de uma crise fiscal por profecias auto-realizáveis, tal como em 2002. Naquela ocasião o governo era devedor em dólar. Quando o mercado antecipou um possível default na dívida pública com a eleição de Lula, a taxa de câmbio se desvalorizou fortemente, produzindo um aumento da dívida bruta de 54,18% do PIB em abril para 63,62% em setembro, um aumento de quase 10 p.p. do PIB em poucos meses.
A venda parcial das reservas internacionais reduziria a posição credora líquida do governo, diminuindo os ganhos obtidos com a desvalorização do câmbio. Dado que o governo opera com déficit primário, a redução dessa receita de senhoriagem levará a dívida bruta a crescer mais rapidamente, aprofundando assim o quadro de crise fiscal, o que pode resultar num ataque especulativo contra o Real, levando a taxa de câmbio a níveis estratosféricos. Seria a pá de cal no caixão do governo da Presidente Dilma.
Algumas dúvidas.
Esse ganho com a desvalorização não é apenas contábil?
E o uso desse lucro contábil[transferência para o tesouro e posteriormente para os bancos] não se deu de forma inflacionária?
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Não. A cada seis meses o Banco Central repassa para o Tesouro o resultado dos ganhos ou perdas de capital com as reservas internacionais. Esse resultado é depositado na conta única do Tesouro Nacional no Banco Central do Brasil. Foi com esses recursos que o Tesouro pode pagar as pedaladas fiscais em 2015 sem ter que recorrer a emissão de dívida. Para que a monetização dos ganhos de capital sobre as reservas internacionais possa ter impacto inflacionário é necessário que os recursos assim criados sejam usados para o financiamento de gasto público. A LRF proibe o uso da receita de senhoriagem para o financiamento de despesa primária. O que o Tesouro pode fazer é usar esses recursos para pagar dívidas.
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