Entrevista para a TV do PPS sobre a proposta do imposto sobre grandes fortunas
27 sexta-feira fev 2015
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25 quarta-feira fev 2015
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Ajuste fiscal, Crise do Balanço de Pagamentos, Semi-estagnação da economia brasileira, Sobre-valorização cambial
José Luis Oreiro*
Nas ultimas semanas a nova equipe econômica do governo anunciou os contornos gerais e alguns detalhes do pacote de ajuste fiscal. Para o ano de 2015, a meta é um superávit primário de 1,2% do PIB para o setor público consolidado e 1% para o governo federal. No ano passado o setor público consolidado incorreu num déficit primário de 0,6% do PIB, o que levou o déficit nominal para o patamar de 6,7% do PIB, um dos maiores do mundo. Para que a meta de superávit primário do setor público de 2015 seja cumprida será necessário um esforço fiscal de 1,8% do PIB, o que não chega a ser um esforço draconiano; mas também não é desprezível, ainda mais num contexto em que as previsões para o PIB de 2015 apontam para uma retração de 0,5%. Dessa forma, ainda que o ajuste fiscal pretendido para o ano de 2015 seja efetivamente obtido, o que está longe de ser uma certeza, o déficit nominal deverá cair para pouco mais de 5% do PIB no final do ano.
Para o ano de 2016, a equipe econômica pretende elevar a meta de superávit primário para 2% do PIB. Esse esforço fiscal adicional de 0,8% do PIB em conjunto com o início (oremos) do ciclo de redução da taxa Selic a partir do final de 2015 (oremos de novo) deverão ser suficientes para levar o déficit nominal do setor público consolidado para algo como 3,0 a 3,5% do PIB no final de 2016. Nesse cenário é possível que a dívida bruta como proporção do PIB comece a cair a partir do segundo semestre de 2016, afastando assim a hipótese de default soberano da cabeça dos investidores internacionais e, portanto, eliminando o risco de ocorrência de uma fuga dos investidores estrangeiros do mercado de dívida pública interna, a qual poderia detonar uma crise cambial de grandes proporções. Esse risco não pode ser subestimado haja vista que uma parte não desprezível está nas mãos de investidores estrangeiros e que o déficit em conta corrente fechou o ano de 2014 acima do nível crítico de 4% do PIB, sendo que apenas 70% desse valor foi financiado com investimento externo direto.
O leitor pode perceber pela exposição acima que no cenário relativamente otimista que estou traçando o resultado final terá sido apenas impedir a ocorrência de um desastre de proporções bíblicas. Evitaremos o pior, mas a situação fiscal continuará delicada, pois o déficit nominal ainda será alto, os serviços relativos ao pagamento de juros da dívida pública continuarão sendo uma fração expressiva do PIB (acima de 4%) e, mais importante que tudo isso, a economia brasileira continuará crescendo pouco. Isso porque o ajuste fiscal, embora necessário para evitar um desastre a médio-prazo, não será capaz de induzir os empresários a investir mais, pois não irá atuar no sentido de aumentar a competitividade da indústria de transformação. Esta continuará estagnada, deixando assim de gerar os necessários ganhos de produtividade (dentro e fora da indústria) decorrentes das economias estáticas e dinâmicas de escala.
Para que seja possível retomar o crescimento da economia brasileira a taxas robustas – entre 3 a 4% a.a – é absolutamente necessário recuperar a competitividade da indústria de transformação. Isso exige duas coisas. Em primeiro lugar, uma expressiva – embora não necessariamente súbita – desvalorização da taxa real de câmbio. Os analistas de mercado e alguns economistas liberais acham que o “mercado” irá resolver o problema da sobrevalorização cambial, pois os efeitos combinados da expectativa de normalização da política monetária norte-americana e do déficit em conta corrente no Brasil deverão pressionar para uma desvalorização da taxa de câmbio. Economistas Keynesianos como eu são céticos quanto a capacidade auto-reguladora do mercado. Embora seja verdade que o cenário internacional irá pressionar o câmbio para cima no médio-prazo, não podemos esquecer que no curto-prazo a permanência de um elevado diferencial entre as taxas de juros interna e externa, em conjunto com o afrouxamento quantitativo do Banco Central Europeu, deverão induzir um fluxo não desprezível de entrada de capitais na economia brasileira, ainda mais se a equipe econômica for bem sucedida em ganhar a confiança do “mercado”. Dessa forma, não há razão para acreditar que o mercado fará, nos próximos meses, a correção requerida no valor da taxa de câmbio. Talvez seja o caso da equipe econômica do governo pensar em reintroduzir, via IOF, os controles a entrada de capitais externos. Isso também ajudaria a obtenção da meta fiscal para 2015.
Em segundo lugar, o governo precisa aumentar significativamente o investimento público em infraestrutura para reduzir os custos das empresas com energia, logística, transporte e etc. Mas como isso pode ser feito no bojo de um ajuste fiscal como o que está sendo proposto pela equipe econômica? A resposta para isso passa, obrigatoriamente, pela redução dos serviços da dívida pública. No acumulado entre janeiro e novembro de 2014 o setor publico comprometeu 5,64% do PIB com o pagamento de juros da dívida pública. É um valor totalmente anômalo face à magnitude da dívida pública brasileira. A Espanha, por exemplo, compromete apenas 3% do PIB com o pagamento de juros, embora tenha uma dívida de 99% do PIB.
Não existem respostas fáceis para a questão da redução dos encargos da dívida pública no Brasil, mas a nova equipe econômica não pode se furtar a dar um tratamento para essa questão.
* Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Pesquisador Nível IB do CNPq. E-mail: jose.oreiro@ie.ufrj.br.
22 domingo fev 2015
POUPANÇA
Na semana passada, tratei do tema da formação da taxa de poupança ao longo do processo de geração da renda, questão equacionada por Keynes nos anos 1930.
O professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro José Luis Oreiro, em post do dia 16 em seu blog, apresenta com maiores detalhes o processo. Remeto meus leitores interessados ao texto de Oreiro (jlcoreiro.wordpress.com).
Aparentemente o professor achou um erro em minha argumentação. Meu entendimento é que nada em minha coluna –a menos de omissões naturais, fruto de limitação de espaço– conflita com o texto de Oreiro.
21 sábado fev 2015
Após confrontar, durante a campanha eleitoral, dados que apontavam para o aprofundamento do quadro de estagnação da economia, o governo Dilma Rousseff deu o braço a torcer. Em meio ao colapso da produção da indústria, à escalada da inflação e à disparada do dólar, que caminha a passos largos para a casa dos R$ 3, caiu a ficha de que, só com palavras, será impossível convencer investidores e empresários a apostarem numa rápida retomada do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).
Muito pelo contrário. As ameaças que se avizinham — entre as quais o risco de apagão, o racionamento de água e a possibilidade de perda do grau de investimento ainda no primeiro semestre de 2015 — impõem ao governo a necessidade de clareza no diagnóstico e pragmatismo nas ações para vencer a crise. Exigem também uma mudança clara de postura da equipe econômica. Se, sob o comando de Guido Mantega, o Ministério da Fazenda era sinônimo de descrédito entre investidores, com o atual titular da pasta, Joaquim Levy, a história é outra. Em vez de previsões econômicas superestimadas, ele não esconde a predileção por análises mais realistas, mesmo que isso signifique trazer más notícias para os brasileiros.
Nas declarações mais recentes, em Nova York, Levy selou a perspectiva de dois anos seguidos de recessão: em 2014 e 2015, uma situação inédita no Brasil. A última vez em que isso ocorreu foi durante a Grande Depressão dos anos 1930, após a grande crise de 1929, quando o estouro das bolsas de valores nos EUA levou o mundo para o atoleiro. Em 1930, a economia brasileira encolheu 2,1%, e, em 1931, declinou 3,3%, conforme dados compilados pela Austin Rating. Nem durante as crises do petróleo, nos anos 1970, ou durante a hiperinflação, nos anos 1980, o país viu a economia retrair-se por dois períodos seguidos.
Caso a recessão prolongada se confirme, o aumento do desemprego será praticamente inevitável. A consultoria Rosenberg Associados estima que o percentual de brasileiros sem trabalho subirá dos atuais 4,8% para 6,1% da população economicamente ativa, na hipótese de o PIB encolher 0,5% este ano. Essa é considerada uma projeção ainda otimista, levando em conta cálculos que apontam para tombo superior a 2% da economia em 2015. Nesse cenário, o desemprego subiria para patamares superiores a 7% — o que significaria o fim da bandeira petista do pleno emprego.
E ainda pode piorar. “A nossa situação é tão grave que, além de termos uma queda do PIB e do emprego, o aperto será maior porque a inflação está subindo”, disse o economista José Luís Oreiro, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).“Os trabalhadores vão sofrer duplamente. Alguns vão perder o emprego e, mesmo os que mantiverem o trabalho, vão sofrer uma desaceleração brutal da renda, já que os salários não subirão a ponto de recompor as perdas inflacionárias.”
O aperto no bolso pode ser ainda maior a julgar pela intenção da Fazenda de promover mais elevações de tributos para conseguir cumprir as metas fiscais estipuladas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Diante da dificuldade de economizar 1,2% do PIB para pagar juros da dívida pública (e fazer o chamado superavit primário), Levy vem deixando claro que novas medidas de austeridade já estão no forno.
Para investidores, Levy garantiu que a Fazenda não deve “inventar impostos”, e sim simplificá-los. Mas sinalizou que pode “renovar” tributos, o que abre dúvidas sobre o fim de benefícios ainda em vigor, como o desconto do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para a linha branca (geladeira, máquina de lavar etc.), a desoneração da cesta básica ou, em última instância, a volta da CPMF, o imposto do cheque. Técnicos da Receita Federal garantem que ressuscitar esse último tributo “está completamente fora de cogitação”.
O arrocho fiscal tem motivo claro: evitar que o descalabro nas contas públicas se agrave a tal ponto que o país possa a vir ser considerado um mau pagador dos títulos da dívida pública. Tanto que, ao fim da palestra feita a investidores, em Nova York, Levy reuniu-se a portas fechadas com representantes da agência de classificação de risco Moody’s para tentar convencê-los a não retirar o grau de investimento do país, obtido em 2008, quando o Brasil ainda era sinônimo de pujança e galgava posições no ranking global de crescimento econômico.
A perda da chancela de bom pagador pode detonar um efeito cascata de aversão a risco no país, com investidores partindo em retirada do Brasil. A última vez que o país enfrentou uma fuga recorde de dólares das bolsas e dos títulos emitidos pelo governo foi há 13 anos, quando temores com a possível eleição do então candidato Lula levaram o dólar para R$ 4. “Se acontecer isso agora, o céu é o limite. A moeda norte-americana poderá facilmente ultrapassar os R$ 5, o que desencadeará um movimento de remarcação de preços no comércio, com impacto devastador sobre a renda das famílias”, assinalou Oreiro.
16 segunda-feira fev 2015
Meu colega Samuel Pessoa, a quem tive o prazer de convidar para a mesa de conjuntura do VII Encontro Internacional da Associação Keynesiana Brasileira, realizado em agosto de 2014 na FGV-SP, escreveu um artigo na FSP sobre a relação entre poupança e investimento. Antes de mais nada quero elogiar o esforço sincero de Samuel de entender e dialogar com a heterodoxia brasileira com respeito e civilidade. Atitude essa, diga-se de passagem, cada vez mais rara entre os economistas ortodoxos, notamente os mais jovens, e também entre vários membros da heterodoxia, os quais preferem se isolar cada vez mais em guetos, atacando de forma viruleta e preconceituosa tudo o que não se encaixe, com perfeição, na sua estreita visão de mundo.
Mas voltemos ao artigo. Samuel afirma, corretamente diga-se de passagem, que a poupança sempre se ajusta ao investimento, independentemente de operar com capacidade ociosa ou pleno emprego dos fatores de produção. No primeiro caso, o aumento do investimento – financiado com um aumento do crédito bancário, o qual é uma operação puramente contábil, que não envolve o uso de recursos reais do sistema – gera um aumento do nível de emprego e do grau de utilização da capacidade produtiva. Supondo que a propensão marginal a consumir é menor do que a unidade, ou seja, que as pessoas estão dispostas a gastar apenas uma parte do aumento de renda que tenham auferido, então o aumento da renda que foi induzido pelo aumento do investimento irá resultar num aumento exatamente proporcional da poupança. Dessa forma, a poupança terá se ajustado – ao final do processo do multiplicador – ao novo nível do investimento, razão pela qual a primeira nunca poderá ser uma restrição ao ultimo.
Antes de prosseguirmos no argumento é importante ressaltar, contudo, que o mecanismo acima descrito não envolve “almoço grátis” como alguns críticos da teoria keynesiana argumentam constantemente. De fato, para que o processo seja viabilizado é necessário que os bancos estejam dispostos a aumentar as suas linhas de crédito. Mas a criação de crédito tem como contra-partida a criação, na mesma magnitude, de depósitos a vista, os quais são uma obrigação que o banco emite contra si mesmo. Como os bancos não criam reservas bancárias, segue-se que a expansão do crédito necessariamente diminui a liquidez dos seus balanços. Sendo assim, um aumento do investimento só será possível se os bancos estiverem dispostos a reduzir a sua preferencia pela liquidez.
Como esse processo funciona numa economia que opera com pleno-emprego dos recursos? Nesse caso, aponta Samuel, o aumento do investimento viabilizado pelo crédito bancário, deverá levar a um aumento dos preços e a uma redução dos salários reais. Supondo que a propensão a consumir a partir dos lucros é menor do que a propensão a consumir a partir dos salários, segue-se que a redução do salário real deverá resultar num aumento da poupança agregada da economia. Mais uma vez temos que a poupança se ajusta o investimento, de forma que a primeira não é um obstáculo ao aumento do ultimo.
Esse processo, contudo, não seria sustentável na visão de Samuel. Isso porque a elevação de preços que é resultado do aumento do investimento num contexto de pleno-emprego irá levar a economia a um processo de hiper-inflação e desorganizalçao do setor produtivo.
É aqui que a argumentação de Samuel se perde. De fato, o aumento do investimento num contexto de pleno-emprego produz um excesso temporário de demanda no mercado de bens, o qual é inteiramente eliminado pela redistribuição de renda dos salários para os lucros, que termina por originar um aumento da poupança agregada. A aceleração da inflação será, portanto, puramente temporária, ou seja, a taxa de inflação irá se acelerar por alguns meses, voltando ao patamar inicial uma vez cessado o mecanismo de ajuste no mercado de bens. Se os preços e salários forem indexados, a inflação irá aumentar para um patamar mais alto, mas ficará estável uma vez que o mecanismo de ajuste da poupança com relação ao investimento tenha terminado.
O único fator que poderá detonar uma aceleração persistente da taxa de inflaçao é o conflito distributivo entre capital e trabalho. Digamos que os trabalhadores não aceitem a redução dos salários reais que foi induzida pela necessidade de acomodar a poupança ao novo patamar do investimento. Nesse caso eles irão demandar reajustes de salário nominal a um ritmo maior do que a inflação passada. Supondo que o mercado de bens continua em equilíbrio, os empresários irão repassar esses reajustes de salário para os preços, fazendo com que a inflação se acelere. A aceleração da inflação irá frustrar a tentativa dos trabalhadores de recompor seus salários reais, o que levará os sindicatos a exigir aumentos salariais ainda maiores, cuja consequencia será uma nova aceleração da inflação …. Se nada for feito a economia terminará num processo hiper-inflacionário.
O que pode ser feito para evitar esse resultado catastrófico? Uma alternativa é o governo realizar um aumento da sua propria poupança, ou seja, um ajuste fiscal, para evitar a redução dos salários reais e o aumento na concentração de renda. Deve-se observar que o aumento da poupança do governo não tem por objetivo viabilizar o aumento do investimento – o qual ocorrerá de qualquer forma – mas sim evitar que o custo do ajustamento caia sobre os trabalhadores.
Uma segunda alternativa consiste em forçar os trabalhadores a engulir a redução dos salários reais. Numa ditadura isso pode ser feito pela repressão policial. Em democracias a tarefa fica a cargo do Banco Central, a quem caberá aumentar a taxa de juros até o nível necessário para produzir o aumento da taxa de desemprego que convencerá os sindicatos a ficar queitinhos e aceitar a queda dos salários reais.
Uma terceira alternativa é negociar com os sindicatos uma política de moderação salarial, na qual os sindicatos concordem com a redução dos salários em troca de algum outro benefício. Por exemplo, os sindicatos poderiam aceitar uma redução dos salários reais em troca da garantia de emprego no curto-prazo e recomposição dos salários no médio e longo-prazo. Nesse caso, os Sindicatos poderiam ser importantes parceiros do governo no sentido de assegurar que os investimentos adicionais prometidos pelos empresários sejam efetivamente realizados e deem ensejo ao aumento da produtividade.
Enfim, a poupança nunca é um obstáculo para o aumento do investimento, mas isso não quer dizer que um aumento do investimento possa ser feito, sempre e em todo o lugar, sem algum tipo de ajuste macroeconômico de caráter compensatório. Numa economia que opera com pleno-emprego, um aumento do investimento poder exigir a realização em simultâneo de um ajuste fiscal para evitar o surgimento de um conflito distributivo cujas consequencias se longo-prazo são a emergência do desemprego estrutural ou de um processo hiper-inflacionário.
10 terça-feira fev 2015
Recentemente uma polêmica envolvendo Paulo Gala e Samuel Pessoa pôs em releve a questão dos determinantes do crescimento da produtividade do trabalho. Paulo Gala, em artigo publicado no Valor Econômico, apresentou a tese keynesiano-estruturalista de que a dinâmica da produtividade do trabalho depende da composição setorial da produção. Mais especificamente, o baixo ritmo de crescimento da produtividade do trabalho na economia brasileira seria o resultado de uma transformação estrutural perversa ocorrida nos últimos anos, notadamente durante o governo Dilma Rouseff, no qual ocorreu um aumento significativo da participação do setor de serviços, particularmente o setor de serviços associado ao consumo das famílias, no emprego e no produto interno bruto. Como a produtividade do trabalho tende a crescer menos nesse setor, segue-se que a mudança da composição setorial da produção em direção ao setor de serviços teria levado a uma redução do ritmo de crescimento da produtividade do trabalho na economia como um todo, uma vez que a mesma é apenas a média ponderada entre as taxas de crescimento da produtividade nos diversos setores e o peso do setor menos dinâmico teria aumentado nos últimos anos.
Samuel Pessoa em artigo publicado na Folha de São Paulo contesta essa visão. Para ele a produtividade do trabalho não depende da composição setorial da produção mas das características individuais dos trabalhadores. Isso porque os diferenciais de salário dentro de cada setor de atividade mostrariam de forma inequívoca que existe um “prêmio salarial” para os trabalhadores com mais “capital humano”. Além disso, estudos que comparam a produtividade do trabalho entre setores equivalentes em diversos países (por exemplo, China versus Estados Unidos), mostram a existência de diferenciais de produtividade importantes. Dessa forma, as diferenças observadas na composição setorial da produção não podem explicar as diferenças observadas na produtividade do trabalho. Daqui se segue, portanto, que “a produtividade não é um atributo setorial”.
A argumentação de Pessoa, no entanto, é pouco convincente. Em primeiro lugar, a existência de diferenciais de salário dentro de um mesmo setor não implica logicamente na inexistência de diferencias de produtividade entre os diversos setores. Aliás, a produtividade do trabalho medida pelo valor adicionado por trabalhador é bastante desigual entre os diversos setores de atividade. Com efeito, conforme podemos visualizar na Figura 1, extraída de Marconi e Rocha (2011), a produtividade do trabalho difere bastante entre os setores de atividade na economia brasileira, a depender do grau de intensidade tecnológica do setor. A produtividade do trabalho na produção de manufaturados de alta e média-alta tecnológica é muito maior do que no setor de commodities agrícolas e extrativas, por exemplo. Isso significa que uma mudança na composição setorial da produção do ultimo setor para o primeiro deverá resultar, ceteris paribus, num aumento da produtividade média da economia.
É provável, contudo, que a produtividade do trabalho no setor de alta e média-alta tecnologia seja maior nos Estados Unidos do que no Brasil. Isso reflete mais a existência de assimetrias tecnológicas entre as empresas desses setores no Brasil e nos Estados Unidos do que a existência de diferenciais significativos no capital humano dos trabalhadores. De fato, me parece difícil aceitar a tese de que a diferença entre a Boeing e a Embraer se deva unicamente, ou principalmente, aos diferencias na formação científica e técnica dos engenheiros e demais trabalhadores dessas duas empresas. O mais provável é que a diferença decorra da existência de um hiato tecnológico entre as duas empresas, o qual, diga-se de passagem, parece estar sendo reduzido ao longo do tempo.
A existência de diferenciais de produtividade entre os mesmos setores de diversas economias não invalida, contudo, a tese de que mudanças na composição setorial da produção podem gerar mudanças significativas da produtividade média da economia. Na verdade a dinâmica da produtividade média do trabalho (na economia com um todo) vai depender da dinâmica do hiato tecnológico – a qual determina a dinâmica da produtividade relativa entre setores similares em países diferentes – e da composição setorial da produção. A produtividade média da economia como um todo pode ficar estagnada num contexto em que as melhorias decorrentes da redução do hiato tecnológico sejam compensadas por uma mudança da composição setorial da produção em direção a setores menos dinâmicos.
Outro ponto que me parece problemático na argumentação de pessoa é o timing da queda do ritmo de crescimento da produtividade. Ao que me parece há um consenso entre os economistas que o ritmo de crescimento da produtividade do trabalho se reduziu nos últimos anos. Se a explicação de Pessoa estivesse correta, então nos últimos anos deveríamos ter observado uma redução do ritmo de acumulação de capital humano no Brasil. Mas aparentemente não é isso que estamos observando. Pelo contrário, uma das explicações dadas para a redução do ritmo de crescimento da PEA é precisamente o aumento do investimento em educação formal por parte dos jovens de 18 a 24 anos.
Em suma, não existem razões para descartar a hipótese de que o crescimento da produtividade depende, entre outros fatores, da composição setorial da produção. Está claro que este não é o único determinante da dinâmica da produtividade do trabalho. O tamanho do hiato tecnológico é também outro fator importante. No modelo desenvolvido por Verspagen (1993), por exemplo, quando o hiato tecnológico é inferior a capacidade absortiva de um determinado país – ou seja, a capacidade institucional e tecnológica das empresas desse país de absorverem os transbordamentos tecnológicos do exterior – então a produtividade do trabalho poderá crescer mais rapidamente no país retardatário do que nos países que operam na fronteira tecnológica. Nesse caso, os países retardatários poderão fazer o catching-up. Se o hiato tecnológico for muito grande, contudo, então as firmas do país não poderão absorver os transbordamentos tecnológicos e, dessa forma, ocorrerá o falling-behind. O investimento em educação é fundamental neste processo pois é uma das variáveis que afetam a capacidade absortiva de um país, mas certamente não é a única. Se assim fosse, Cuba, mundialmente conhecida pela qualidade do seu sistema educacional, seria um país muito mais rico do que é hoje.
Referências.
MARCONI, N; ROCHA, M. (2011). “Desindustrialização precoce e sobrevalorização da taxa de câmbio”. Texto para Discussão n.1681, IPEA/DF.
VERSPAGEN, B. (1993). Uneven Growth Between Interdependent Economies. Avebury: Ashgate Publishing Limited.
04 quarta-feira fev 2015
Em pouco tempo, Joaquim Levy adota novas regras para ajustar as contas do governo. Mercado elogia e consumidores vão sentir no orçamento
Fonte: Rosana Hessel
17/01/2015
Brasília – Em apenas duas semanas, o economista Joaquim Levy teve pouco tempo para mostrar seu trabalho à frente do Ministério da Fazenda. No entanto, ele vem tentando imprimir sua marca aos poucos ao mesmo tempo em que evita bater de frente com a presidente Dilma Rousseff,já que seu receituário para colocar o país no eixo joga por terra a política macroeconômica do primeiro mandato da petista. Apesar de negar que esteja preparando um “saco de maldades”, Levy reconheceu esta semana que o aumento dos impostos é inevitável. Nos primeiros quinze dias como minsitro, várias medidas que vão nessa direção ganharam corpo e outras ainda estão por vir, uma vez que o pacote deverá ser bem grande.
A recomposição das alíquota de três tributos que deve ocorrer neste ano equivale a um ano de Bolsa Família, chegando perto de R$ 30 bilhões. Nesse conjunto, estão incluídos o fim do desconto do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de veículos, linha branca e materiais para construção; a volta da Contribuição de Intervenção sobre o Domínio Econômico (Cide) e a possível cobrança do teto do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nas operações de crédito. Para o economista e especialista em contas públicas Felipe Salto, o impacto desses três tributos pode chegar a R$ 37 bilhões em 2015.
Antes mesmo de assumir o cargo, Levy adiantou algumas medidas para aliviar o caixa da União, que fechou 2014 no vermelho. Esse foi o caso da alteração das regras do acesso aos benefícios da Previdência, como seguro-desemprego e pensão por morte, que foram divulgadas no fim do ano passado. A expectativa do governo é economizar R$ 18 bilhões somente neste ano, apesar de especialistas acreditarem que esse número esteja “superestimado”. Vale lembrar que, de janeiro a novembro, o rombo das contas públicas foi de R$ 19,6 bilhões e Levy prometeu economizar 1,2% do PIB, ou seja, cerca de R$ 66 bilhões este ano para o pagamento dos juros da dívida pública.
“As declarações de Levy apontam para um ajuste fiscal gradual, de maneira a não jogar o país em uma recessão profunda. Mas algum impacto recessivo no primeiro semestre vai ser inevitável”, avaliou o economista José Luis Oreiro, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “O Levy ainda não se deu conta de que o ajuste fiscal sem resolver o problema cambial é condenar a economia brasileira a uma ‘paz no cemitério’”, alertou.
A economista Monica Baumgarten de Bolle, diretora da consultoria Galanto/MBB, acredita que Levy terá dificuldades pela frente. “O ajuste não vai ser fácil, nem um pouco. Vamos esperar para ver como Levy consegue arrumar tudo isso. O bom é que ele é um cara que consegue tirar água de pedra”, emendou ela que tem grande admiração pelo novo ministro. “Na falta de uma medida ou duas pelo menos que pudessem conjuntamente gerar boa parte do ajuste que o governo precisa, ele acaba tendo que contar com os pedacinhos para somar o montante necessário”, completou.
Elogios
Entre as medidas adotadas por Levy logo que assumiu e que foi bem recebida pelo mercado por dar um sinal de austeridade fiscal, destaca-se o corte mensal de R$ 1,9 bilhão nas despesas discricionárias (não obrigatórias) dos ministérios. Nesse sentido, nem mesmo a pasta da Educação escapou e passou a ter R$ 600 milhões a menos cada mês para esses gastos. Foi o maior corte entre todos os órgãos. Além disso, a sinalização de que o Tesouro Nacional não vai mais socorrer o setor elétrico agradou os mais críticos. Mas o problema é que o consumidor é que vai ter que arcar com o uso prolongado das térmicas em função da estiagem nos reservatórios. Pelas contas de Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), o reajuste este ano poderá chegar a 40% neste ano, incluindo a inflação do período. Essa fatura é grande e pode chegar a R$ 23 bilhões.
02 segunda-feira fev 2015
Por: Valéria de Oliveira
O economista José Luiz Oreiro, professor da UFRJ propôs, durante palestra à bancada do PPS na Câmara, a instituição do imposto sobre grandes fortunas como forma de efetivar o ajuste fiscal. Seriam enquadrados nesse quesito patrimônio a partir da R$ 10 milhões.
“Fazer reajuste em cima do trabalhador, reduzindo direitos como o seguro-desemprego, como propôs o governo em medida provisória, não é razoável”, disse o economista.
Estavam presentes à palestra os deputados Rubens Bueno (PR), líder da bancada, Hissa Abrahão (AM), Arnaldo Jordy (PA), Eliziane Gama (MA) e Moses Rodriges (CE), além dos membros da assessoria técnica da Liderança do PPS.
Oreiro observou que a desigualdade entre as classes sociais é tamanha que 50% da riqueza do mundo estão nas mãos de apenas 1% da população. No Brasil, o problema é enfrentado apenas com políticas de transferência de renda. “Nunca se toca na questão da tributação dos mais ricos”, assinalou.
O professor destacou que as despesas abusivas do tesouro no período pré-eleitoral foram decisivas na composição do déficit nominal de 6,06% no ano passado e no descontrole total das contas do governo. “Dos gastos do governo na virada de 2013 para 2014, 50% foram das chamadas despesas de custeio e capital; tudo indica que o motivo foi a eleição presidencial”.
Estagflação
Oreiro insistiu que o Brasil vive um quadro grave de estagflação, com inflação e juros altos e crescimento pífio. ”A economia do país passa por enormes desequilíbrios macroeconômicos nos últimos anos, com redução drástica nas taxas de crescimento”. Em 2014, essa taxa não deve passar de 0,20%, ponderou.
As razões da crise econômica do Brasil, explicou o professor, são de caráter interno, mais especificamente estrutural, ao contrário do discurso oficial. “Se não houver melhoras na economia, os avanços conquistados na Constituição de 1988 não se sustentarão”, afirmou.
A grande causa da estagnação da economia brasileira nos últimos quatro anos, sublinhou Oreiro, foi a queda na produção industrial. “A resposta do governo a esse problema foi impulsionar o consumo; assim, as vendas cresceram, mas a produção da indústria não”. O percentual atendido pelas exportações, explicou, dobrou. “Por isso, se continuou vendendo”.
Ao analisar a estagnação na indústria, Oreiro apontou a valorização cambial constante nos governos petistas como a causa do fenômeno, “o que solapou nossa economia”.
O “buraco” nas contas externas que o país exibe, disse Oreiro, nos leva à beira de uma crise na balança de pagamentos. “Hoje dependemos do capital especulativo externo para fechar nossa balança comercial; temos R$ 150 bilhões de dívida interna nas mãos de investidores internacionais”, disse.
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Graduado em Economia pela FEA-USP. Mestre e Doutor em Economia pela Fundação Getúlio Vargas em São Paulo. Foi pesquisador visitante nas Universidades de Cambridge UK e Columbia NY. Foi economista, gestor de fundos e CEO em instituições do mercado financeiro em São Paulo. É professor de economia na FGV-SP desde 2002. Brasil, uma economia que não aprende é seu último livro. Conselheiro da FIESP e Economista-chefe do Banco Master
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