Acredito que a maioria dos meus leitores (ao menos os que não acompanham meu blog para me espionar e ficar tagarelando por ai) sabe que eu sou um severo crítico da política econômica do governo Dilma Rouseff. Sabem também que em 2010 votei em José Serra para Presidente da República, fato esse que praticamente inviabilizou qualquer possibilidade de ingressar na equipe econômica do governo, apesar de ser Keynesiano e Desenvolvimentista. Isso posto me sinto bastante confortável para defender o governo de ataques que são notoriamente injustos, cujo objetivo é apenas criar um clima de terror na população e assim desestabilizar o governo.
Não vou entrar aqui num pormenorizado relato hístórico de como muitos dos que atualmente criticam o governo da Presidente Dilma Rouseff cometeram atrocidades em termos de política econômica durante o governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso ou, mesmo durante o governo Lula, defenderam políticas econômicas contracionistas no meio da crise financeira mundial de 2008, as quais, se implementadas, teriam levado a economia brasileira ao colapso como se observa atualmente na Espanha e na Itália.
Quero aqui apenas refrescar a memória dos “falcões da inflação” que, ano sim e o outro também, ficam vociferando na imprensa escrita e na grande mídia que o Brasil está prestes a entrar numa trajetória de descontrole inflacionário. Como as críticas parecem se concentrar na atual gestão do Banco Central, que por obra e graça da Presidente da República não está mais nas mãos do sistema financeiro, vamos olhar para os dados do IPCA apenas durante o período da gestão de Dilma Rouseff, ops, quer dizer, Tombini, a frente do Banco Central do Brasil.
Vejam o gráfico que pode ser obtido no link: Fonte
Esse gráfico, cujos dados foram extraídos daquela fonte comunista e subversiva chamada IPEADATA, mostram a média móvel do ultimos 12 meses do IPCA mensal anualizado no período compreendido entre janeiro de 2011 e abril de 2013.
O que os dados nos mostram?
(i) a inflação acumulada nos últimos 12 meses estourou o teto da meta de inflação do BC em dois períodos: abril a dezembro de 2011 e março de 2013. No primeiro episódio de estouro da meta, a inflação acumulado nos ultimos 12 meses atingiu um máximo de 7,31% ao ano, após o qual inicioiu uma trajetória de queda, atingindo um ponto de mínimo em junho de 2012 igual a 4,91% ao ano. No episódio mais recente de estouro da meta, o ponto de máximo foi de 6,59% a.a, tendo iniciado após isso uma trajetória de queda, a qual deve se continuar nos próximos meses.
(ii) Se adicionarmos uma tendência linear na série, a mesma apresenta uma clara inclinação negativa indicando, portanto, que apesar dos ciclos de alta e baixa dos índices inflacionários, a tendência de médio prazo da taxa de inflação é de queda, não de elevação.
Daqui se segue que não existe nenhuma razão objetiva pela qual possamos temer um descontrole inflacionário no futuro próximo. Concordo que a taxa de inflação deveria flutuar em torno de um patamar mais baixo, algo como 4% a.a. Para isso o governo precisa introduzir mudanças na política econômica, principalmente na llei de reajuste do salário mínimo, a qual cria uma pressão de custos muito forte sobre o setor de serviços, a qual é responsável por boa parte das pressões inflacionárias existentes na economia brasileira. Embora o quadrop inflacionário seja desconfortável, está muito longe de ser a catástorfe anunciada pelos falcões da inflação, os quais parecem sofrer de uma síndrome de falta crônica de memória.
Joaquim disse:
Os anos 80 na irão voltar, o “organismo econômico” possui “anticorpos” contra essa possibilidade. O ponto é que a média móvel está centrada em 6% e não nos 4,5%. Sem falar que o governo “segura” artificialmente o preço dos combustíveis e tarifas públicas e faz política de desoneração (alimentos, luz, etc) para o controle da inflação. Estamos vivendo um processo inflacionário sim, “espraiado” por toda economia. Quem nega é cego, ou não quer ver…
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Glauco disse:
Professor Oreiro, o senhor citou a reforma do reajuste do salário mínimo como forma do país obter uma inflação anual proxima a 4%. De fato, o preço dos ítens não comercializáveis cresce, em média, a taxas superiores a dos bens comercializáveis desde 2008 (apenas a crise interrompeu este processo). De fato, o preço dos serviços no país cresce num ritmo muito alto. A fórmula de reajuste do salário mínimo parece ser uma boa hipótese explicativa o comportamento do setor de serviços. Entretanto, os preços administrados, boa parte deles indexados à inflação passada, comprometem, em média, um terço do IPCA. Gostaria de saber a opinião do senhor a respeito dos preços administrados para a dinâmica da inflação brasileira.
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Diego disse:
Sr. Oreiro,
Em primeiro lugar, transcrevo-lhe um trecho de matéria presente na revista Conjuntura Econômica do IBRE, edição de março:
“O ano 2012 terminou com um dado negativo quanto à inflação: o IPCA fechou em 5,84%. Com o crescimento econômico de 0,9% do ano passado, tem-se uma situação aparentemente paradoxal – e muito incômoda -, caracterizada por uma economia com baixa expansão e inflação em patamar elevado.
A conjuntura se revela ainda mais desconfortável quando se recalcula a inflação de 2011 com base nos novos pesos aplicados ao IPCA de 2012. De fato, levando-se em conta a ponderação da mais recente Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), observa-se que a inflação de 2012 praticamente não cedeu, pois o número estimado para 2011 (mantida constante a base de comparação) foi de 5,9%, e não de 6,5%. Em outras palavras, o único consolo que se poderia extrair do resultado de 2012 seria o de a inflação ter recuado ante o ano anterior – o que não se confirma diante de um exercício de comparação mais apropriado.”
…
Como sabemos, houve uma mudança na composição do IPCA de 2011 para 2012. Não existe nada de errado em fazer esse ajuste periodicamente, mas torna-se inadequado fazer comparações diretas entre um ano e o ano imediatamente anterior, em meio a essa troca de metodologia. Levando isso em conta, a matéria revela que, mantendo-se a ponderação constante, não houve recuo na taxa de inflação de 2011 para 2012. A única coisa que recuou foi o crescimento mesmo.
Isso posto, acho que convém repensar sua “linha de tendência”.
Há vários agravantes a se pensar sobre a inflação:
O índice de difusão do IPCA mostrou que a quantidade de produtos com aumento nos preços seguiu aumentando de 2011 a 2012, evidenciando uma inflação mais abrangente e mais resistente. Embora esse indicador tenha melhorado nos últimos 2 meses, o seu “baixo” está nos níveis “altos” da inflação de 2011.
O primeiro quadrimestre deste ano teve inflação acumulada de 2,5%, sendo notavelmente maior que no ano passado, que só passou essa taxa no sétimo mês.
Em fevereiro, a inflação chegou no ponto crítico de esfriar o consumo, derrubando as vendas do varejo.
Em 2011, o governo ainda “se safava” disso tudo porque o país tinha acabado de crescer 7,5%, uma vez que há quem considere que crescimento traz inflação ou vice-versa. Como o crescimento despencou, não se vê mais benefício nenhum como causa ou consequência disso.
Por fim, preste atenção no mais preocupante: a inflação não é mais conversa entre economistas, voltou a ser um assunto comentado por donas de casa e empregadas domésticas. As pessoas estão literalmente comentando sobre os preços nas ruas e nos mercados. Há muito tempo não se via algo assim.
Pois é, a inflação não está pra brincadeira não.
Não tem alarmismo nenhum em acusar isso, a sociedade não tem obrigação nenhuma de tolerar 6% a.a. de inflação, a sociedade tem o dever de exigir que as autoridades do governo controlem esse quadro, pois a meta de inflação é 4,5% e não “menos de 6,5%”.
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jlcoreiro disse:
Diego,
Em nenhum momento eu disse que a situação inflacionária no Brasil era conofortável, pelo contrário afirmei explicitamente que o ideal seria ter uma inflação flutuando em torno de 4% a.a, ao invés de 6% a.a como é a média do período 2011-2013 ( e para obter isso a solução não é simplemente sair aumentando os juros, mas desmontar uma série de mecanismos de indexação de preços, salários incluso, que explicam a dinâmica inflacionária no Brasil.
O objetivo do meu post foi mostrar que embora desconfortável, não estamos a beira do abismo inflacionário que os falcões da inflação querem empurrar goela abaixo da sociedade.
Quanto a linha de tendência, acredito que fazendo o ajuste metodológico teríamos uma tendência horizontal: ISSO NÃO AFETA EM NADA O MEU ARGUMENTO, NÃO ESTAMOS CORRENDO O RISCO DE DESCONTROLE INFLACIONÁRIO.
Se a sociedade estiver descontente com a política inflacionária do governo então poderá deixar isso claro em outubro de 2014 elegendo outra pessoa para o cargo de Presidente da República. Até o presente momento, contudo, a população parece bastante satisfeita com a presidente da república.
O fato da inflação não ser mais apenas conversa de economista está relacionado, a meu juízo, ao fato de que tivemos recentemente uma elevação do preços dos alimentos devido a problemas de safra. As informações que eu tenho sobre a safra deste ano apontam para uma clara reversão desse quadro.
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