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domingo, 6 de maio de 2012Entrevista | 06:04

Oreiro: mudança da poupança é medida paliativa

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Oreiro: medida é contraditória à redução de juros no longo prazo (Foto: Marcello Casal Jr./ABr)

Em meio a muitos elogios à decisão do governo de alterar a remuneração da caderneta de poupança para permitir a continuidade da queda da taxa básica de juros, o economista José Oreiro, da Universidade de Brasília, surge como uma voz crítica. Em um pequeno artigo em seu blog, sob o título As novas regras da poupança: emenda pode sair pior do que o soneto, ele encarna o garoto inconveniente da história a atacar a roupa do rei.

As mudanças nas regras de correção da caderneta de poupança devem permitir, sim, segundo Oreiro, a redução da taxa básica de juros. Mas por pouco tempo. Logo, o Banco Central será obrigado a retomar a escalada da Selic. Nesta entrevista ao Poder Econômico, o economista, recém filiado ao PPS, explica os motivos. 

Poder Econômico – Qual o erro na forma como foi feita a mudança na correção da poupança?

José Oreiro – A maneira pela qual a equipe econômica pensou a solução é equivalente à forma como pensa a política macroeconômica. Ou seja, nunca pensa ‘o todo’, é só em partes. Isoladamente. O objetivo era reduzir o grau de indexação da dívida pública. Essa indexação é um dos fatores que contribuem para os juros altos no Brasil. Mas aí a solução foi indexar a caderneta de poupança. Criou-se assim com a poupança o mesmo problema que o governo já tem com a correção das Letras Financeiras do Tesouro, as LFTs. A indexação aumenta o efeito riqueza positivo e tira eficácia da política monetária. Ele estimula a demanda e mais grave ainda porque a poupança é o recurso para troca de carro, compra de bens duráveis, consumo puro, e isso obriga a nova elevação de juros.

Poder Econômico – Mas a equipe econômica desconhece isso?

José Oreiro – Não. O governo percebeu isso. Tanto que incluiu na medida provisória um limitador para a nova regra de correção que é o patamar de 8,5% da taxa básica. O fato de isto estar lá já demonstra que o governo acredita em novas elevações dos juros básicos. Minha crítica é que essa medida da poupança vai contra o objetivo do governo.

Poder Econômico – Os juros, então, não vão cair?

José Oreiro – A curto prazo, sim. Mas o fundamental é buscarmos um juros de equilíbrio. Os juros vão continuar caindo agora, mas subirão. Estamos num momento de flexibilidade da política monetária. Os juros estão abaixo, claramente, do ponto de equilíbrio. Mas assim que a economia mundial der uma recuperada e mesmo a economia brasileira se mostrar mais forte, esse processo será revertido rapidamente. É uma medida paliativa. Não garante a continuidade no tempo.

Poder Econômico – Concorda com a afirmação de que o Banco Central trocou a meta de inflação pela meta de juros?

José Oreiro – Não acho isso. O que aconteceu na transição Henrique Meirelles para Alexandre Tombini foi que mudaram as preferências do comando do Banco Central quanto à condução da política monetária e, particularmente, no sistema de metas de inflação. A autoridade monetária tem dois caminhos a seguir: desvio de inflação com respeito à meta ou desvio do produto. Com Meirelles, havia clara preferência pelo primeiro. Com Tombini, optou-se pelo segundo. Mas isso é perfeitamente compatível com o sistema de metas. Existem vários trabalhos acadêmicos que sustentam isso, vou citar um só. Macroeconomics: Imperfections, Institutions, and Policies [de Wendy Carlin e David Soskice, editor Oxford]. Lá tem os modelinhos todos bonitinhos que mostram que isso é perfeitamente compatível com o sistema de metas.

Poder Econômico – O que deveria ser feito, então, para tomarmos o rumo do longo prazo? Corrigir a rota?

José Oreiro – O que mais me preocupa, como disse, é a falta de visão de todo. O governo tem lapsos na direção correta, como neste caso de corrigir a remuneração da poupança. Mas falta visão de conjunto. Falha na forma. Por quê? Na minha opinião, há um triplo comando na economia. Guido Mantega [ministro da Fazenda], Nelson Barbosa [secretário-executivo da Fazenda] e Luciano Coutinho [presidente do BNDES]. Dilma Rousseff tem preferência por Nelson Barbosa, por razões políticas, não o faz ministro. Mas também ouve muito o Coutinho. Falta um líder claro, um comando único e é isso que está gerando essas falhas.

Autor: Jorge Félix