Com impostos excessivos, preços dos produtos brasileiros não cairiam nem com desvalorização de 30% a 40% do dólar
São Paulo — O governo brasileiro vem tentando segurar a desvalorização do dólar para garantir competitividade dos produtos brasileiros. No entanto, o problema vai muito além do câmbio. Mesmo se a moeda americana tivesse sua cotação elevada entre 30% ou 40% da noite para o dia, os produtos importados ainda continuariam mais baratos, diante do volume de impostos cobrados no país. É por isso que muitos brasileiros continuarão a viajar ao exterior e a encher as malas de bugigangas, roupas e eletrônicos. O caso mais emblemático é o da fralda descartável. Aqui, ela sai por R$ 0,90 (US$ 0,48) a unidade, e, nos Estados Unidos, por US$ 0,02 (ou R$ 0,04). Se o dólar saltasse para R$ 2,52, a mesma fralda continuaria mais cara no Brasil: seria vendida por R$ 0,34.
Não é por acaso que as idas ao exterior, sobretudo para fazer compras, só aumentam. De acordo com dados do Banco Central, os gastos dos brasileiros no exterior saltaram 48,35% em fevereiro em relação ao mesmo período do ano passado. O fenômeno ganha força graças ao dólar barato e às diferenças gritantes dos preços praticados no mercado interno e nos Estados Unidos, por exemplo. No Brasil, um dos maiores objetos de desejo dos amantes da tecnologia, o iPhone 4S, da Apple, é cinco vezes mais caro que nos EUA.
Os impostos são um dos principais vilões da diferença de preços. “A carga tributária é muito alta e isso faz com que os produtos aqui fiquem mais caros e a indústria, menos competitiva”, destacou o professor da Faculdade de Economia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Luiz Fernando de Paula. Ele calculou que, desde 2006 até janeiro deste ano, o real se valorizou 27% em relação ao dólar. A seu ver, as medidas que o governo vem adotando ainda são insuficientes para evitar o derretimento da divisa norte-americana frente ao real. “Hoje, com o dólar no patamar acima de R$ 1,80, a indústria ainda não respira aliviada, mas pelo menos não corre risco de morte. Ela está respirando com aparelhos”, observou.
Controle Entre os Brics, o grupo das economias emergentes formado ainda por Rússia, Índia, China e África do Sul, o Brasil é o único país que não adota controle no câmbio e, não à toa, tem as menores taxas de crescimento. “Se o governo não atuar fortemente para valorizar o câmbio, será difícil conseguir atingir a meta de 4,5% de crescimento no PIB (Produto Interno Bruto) este ano”, avaliou Fernando de Paula. A opinião do economista não é isolada. O professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro também faz coro. “O país conseguiria crescer mais e a indústria sobreviver melhor se o câmbio ficasse entre R$ 2,20 e R$ 2,30”, afirmou. “As medidas que o governo vem tomando são tíbias”, avaliou ele.
Para Oreiro, o problema do câmbio é agravado por culpa de carga tributária que atinge os produtos vendidos no Brasil. “O câmbio hoje é o principal problema brasileiro, mas a carga tributária precisa ser aliviada para não comprometer ainda mais a indústria nacional. Lá fora, todos os países estão defendendo suas indústrias no meio dessa crise”, reforçou Oreiro. A necessidade de controle do câmbio também mobiliza nomes de peso, como a do professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Luis Carlos Bresser Pereira, ex-ministro da Fazenda de José Sarney e da Administração Federal de Fernando Henrique Cardoso. “A Austrália acabou de anunciar que irá fazer isso com o minério”, exemplificou.
Distorções Os impostos engolem, no mínimo, 45% dos valor dos produtos que os brasileiros consomem. “A carga tributária é muito penosa e cobrada em cascata, o que encarece muito mais a produção. O governo ainda não fez uma reforma tributária, que é mais do que necessária no momento atual”, afirmou o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro. A seu ver, uma das principais distorções está na tributação na renda e no consumo, o que cria uma confusão sobre o quanto de imposto se paga no país.